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ConflitosSomália

Somália enfrenta grave catástrofe humanitária

Mariel Müller
20 de junho de 2022

A guerra na Ucrânia agrava a insegurança alimentar na África Oriental após uma devastadora invasão de gafanhotos, a pandemia da Covid-19, e a seca em curso. Só na Somália, 6 milhões de pessoas estão em situação crítica.

Foto: Mariel Müller/DW

Em janeiro deste ano, Hirsiyow Mohamed e os seus três filhos deixaram a aldeia de Drumo, na Somália. O local é fortemente afetado pela seca.

Mas após 15 dias de caminhada pelo deserto quente, quase sem água e comida, ela chegou com apenas uma criança ao recém-construído acampamento para pessoas deslocadas perto da cidade de Dollow, na região de Gedo, no sul do país.

"Estávamos a caminhar e a caminhar, e o meu filho estava muito sedento e exausto", Mohamed recorda tristemente.

"Ele pediu-me muitas vezes: ‘Mama, água, mama, água', depois começou a ofegar, mas não havia nada, nenhuma gota de água que eu lhe pudesse dar", disse Mohamed à DW.

A sua filha de 8 anos de idade morreu à chegada ao acampamento. Ela tinha tosse e estava fraca devido à viagem.

As crianças são as mais vulneráveis à medida que a seca no Corno de África se agrava.

A ONU projeta que 350.000 dos 1,4 milhões de crianças gravemente subnutridas na Somália poderão morrer à fome se nada for feito.

Milhares de pessoas no Corno de África correm o risco de morrer de fomeFoto: Mariel Müller/DW

Pior seca dos últimos 50 anos

As alterações climáticas e eventos climáticos extremos aumentaram as catástrofes naturais nos últimos 50 anos, de acordo com a Organização Meteorológica Mundial (OMM) e o Gabinete das Nações Unidas para a Redução do Risco de Catástrofes (UNDRR).

Como resultado, a organização internacional de caridade Oxfam avalia que mais de 23 milhões de pessoas sofrem de fome severa na Etiópia, Quénia, Somália e na região autónoma da Somalilândia.

Além disso, existem receios crescentes de que a situação possa piorar, uma vez que as chuvas foram escassas em março e princípios de abril.

Prevêem-se chuvas insuficientes para abril até junho - a estação chuvosa para a maior parte da África Subsaariana. Este ano seria o terceiro ano consecutivo em que as regiões da África Oriental e do Corno de África não receberam chuva suficiente.

Embora as secas sejam comuns nesta região, elas estão a tornar-se mais severas. Além disso, existem provas científicas crescentes de que as alterações climáticas exacerbaram os seus efeitos.

Cientistas dizem que as alterações climáticas exacerbaram a seca na África OrientalFoto: Ed Ram/Getty Images

Crianças subnutridas

Numa clínica perto do campo de Gedo, a DW conheceu mães à espera de tratamento para os seus bebés desnutridos. Uma das mulheres, Rahmo Nur Wardhere, disse que tinha perdido 100 cabras devido à seca.

Ela também deixou a sua aldeia com os seus nove filhos. Sem os seus parentes, eles não sobreviveriam, disse ela à DW enquanto cuidava de dois dos seus filhos desnutridos.

"Não posso pô-lo a descansar, porque ele está doente", disse Nur Wardhere, soando esperançosa porque o inchaço e a febre tinham diminuído.

"Quando perdemos o nosso rebanho, perdemos a cabeça. Costumávamos ordenhar as cabras para as crianças. Quando perdemos isso, ficámos desesperados. Não podemos viver sem o nosso rebanho", acrescentou ela.

A seca expulsou mais de 500.000 pessoas das suas casas este ano, de acordo com o Programa Alimentar Mundial (PAM). Por isso, mais de 6 milhões estão agora a enfrentar uma fome aguda.

"Esta seca tem o rosto de uma criança", disse Victor Chinyama, porta-voz da UNICEF.

"Não é só uma criança que sofre de subnutrição, mas também existem outros riscos, tais como o casamento precoce no caso das raparigas e o recrutamento em grupos armados, no caso dos rapazes".

O PAM apela a uma ajuda urgente para evitar uma catástrofe humanitáriaFoto: Mulugeta Ayene/AP/picture alliance

Apelo urgente à ajuda

Os preços dos alimentos na Somália já estão a disparar porque o gado das pessoas está a morrer, as colheitas estão muito abaixo das médias a longo prazo, e a guerra na Ucrânia está a agravar ainda mais uma situação já de si terrível.

O PAM disse que necessita urgentemente de 192 milhões de dólares (184 milhões de euros) para evitar a fome, que pode se agravar a qualquer momento. Portanto, é uma corrida contra o relógio.

Petroc Wilton, chefe de comunicações do PAM na Somália, disse que o país de quase 17 milhões de pessoas está altamente dependente das importações de cereais da Ucrânia e da Rússia.

"Com o porto de Odesa na Ucrânia agora fechado, o PAM adverte que o conflito pode aumentar ainda mais os preços dos alimentos", disse Wilton à DW.

"Temos de estabelecer prioridades para atingir realmente aqueles que necessitam de salvar vidas imediatamente, mas isso significa que estamos a tirar aos famintos para alimentar os famintos".

Entre 1970 e 2019, a África registou 1.695 catástrofes relacionadas com o clima que ceifaram 731.747 vidas. A ONU disse que as catástrofes também custaram ao continente 5 mil milhões de dólares em perdas económicas.

Somália: A fome num Estado falhado

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