STP: Médicos desafiam ministro a resolver "falhas graves"
Lusa
21 de janeiro de 2022
A Ordem dos Médicos de São Tomé e Príncipe lamentou as reações do ministro da Saúde que escondem uma "incapacidade" de apresentar uma "solução ao problema". Profissionais cobram melhores condições de trabalho no país.
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A Ordem dos Médicos são-tomense solidarizou-se esta sexta-feira (21.01) com as exigências dos sindicatos de saúde "para obtenção de melhores condições de trabalho" e lamentou as reações do ministro da Saúde que escondem uma "incapacidade" de apresentar uma "solução ao problema".
"Lamentamos que as declarações tenham chegado a um ponto que comprometa a busca de soluções num período em que o país e o mundo enfrentam uma tremenda crise provocada pela pandemia da covid-19. Nos distanciamos das responsabilidades e das consequências do caminho desfavorável que possa surgir", lê-se no comunicado da Ordem dos Médicos (OMED), datado de quinta-feira.
Declarações do ministro
Há uma semana, o ministro da Saúde, Edgar Neves, em reação a revindicação dos sindicatos dos profissionais de saúde sobre a falta de medicamentos no país, admitiu que os medicamentos têm sido desviados nos hospitais e fez acusações contra os profissionais de saúde.
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"Temos que colocar o dedo na ferida: Há incompetência e as vezes negligência, e o pior ainda o casamento das duas coisas", disse o ministro, referindo que é preciso "avaliar o ato médico".
A OMED refere que "não irá encobrir atos de incompetência ou negligência" que admite "que possa ocorrer com alguns dos seus associados", mas "não aceita que de forma pública seja conotada de forma generalizada que o que reina nos hospitais é a incompetência" dos "corajosos médicos".
"A Ordem tem pautado por intervenções construtivas dando a sua contribuição para a mudança de modelos de gestão e comportamento no Serviço Nacional de Saúde (SNS), ficando limitado muitas vezes a apresentação de ideias e propostas porque obviamente não tem a responsabilidade executora na maioria das ações que decorrem nos diferentes centros de saúde e que estão sujeitas as normas da função pública", refere o comunicado assinado pelo Bastonário da Ordem dos Médicos, Celso Matos.
A OMED assegura que "a avaliação dos profissionais da saúde é um assunto que a Ordem mostrou a sua acessibilidade para criar pontes de debates que possam criar consenso" defendendo que para que isso venha a acontecer "era preciso a partida, que a indigitação para cargos diretivos fosse por concurso público onde o eleito seja por mérito e competência".
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"Situações e falhas graves"
Segundo a OMED, "há situações e falhas graves" no SNS são-tomense "que se perpetuaram e se tornaram doenças crónicas com os quais, os profissionais de saúde deste país têm vindo a conviver até que chegaram a um ponto de saturação".
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"Dizer que 'as vezes faltam medicamentos', como se tudo estivesse bem na saúde, é de uma atitude negativista irritante. Insinuar que a reivindicação por melhores condições de trabalho se esconde por trás da incompetência e da negligência é um insulto absurdo a vários profissionais que se desgastam em momentos de angústia e impotência nos carentes e desatualizados centros de saúde do país", acusa a ordem.
A OMED admite que as declarações do ministro da Saúde "tendem simplesmente a esconder a incapacidade de apresentar solução ao problema", por isso se predispõe a "colocar a mão na ferida" denunciando uma série de carências do Sistema Nacional de Saúde de São Tomé e Príncipe.
Segundo a OMED, falta quase tudo no Sistema Nacional de Saúde, nomeadamente "fios de sutura no maior hospital do país por quase 3 meses [...], materiais cirúrgicos nas salas de operações[...], consumíveis para garantir a adequada higiene dos serviços [...], "água no único hospital do país [...], meio de diagnóstico simples como a cultura de exsudados".
"Quando médicos não especialistas numa matéria e clínicos gerais têm que assumir patologias que não dominam na profundidade por falta de especialistas, de quem é a incompetência? Quando um especialista tem que assumir urgência, consulta externa, doentes na enfermaria tudo no mesmo dia, durante 24 horas e dias sucessivos porque é único da sua especialidade, de quem é a incompetência?", questionam, numa longa lista de carencias que acresce o "grave problema de esterilização de materiais cirúrgicos no hospital", e a medicação de "doentes consoante o que existe na farmácia e não consoante a real necessidade do paciente".
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Na capital do país, São Tomé, profissionais dos mais diversos setores ralatam as intempéries causadas pela Covid-19, mas falam em esperança num futuro sem pandemia.
Foto: João Carlos/DW
Impacto negativo das restrições
Quem chega às ilhas de São Tomé e Príncipe, plantadas no meio do Oceano Atlântico, depara com um ambiente de quase total abstração sobre a existência da Covid-19. A maior parte da população não usa máscara facial. Mas a pandemia do novo coronavírus obrigou a muitas restrições e teve um forte impacto negativo na vida social e económica deste país da África Central.
Foto: João Carlos/DW
Normalidade em plena pandemia
Apesar dos vários avisos e informações oficiais recomendarem cuidados preventivos e proteção por causa do coronavírus e de suas variantes, muitos são-tomenses levam a sua vida quotidiana com normalidade, praticamente a ignorar que a Covid-19 constitui um problema de saúde pública. No entanto, há quem reconheça que a doença provocou perturbações no quotidiano da população.
Foto: João Carlos/DW
A vida está mais difícil
Taxista, 40 anos de idade, pai de quatro filhos, Euclides Gonçalves é quem sustenta a família. A vida que já não era está fácil ficou ainda mais difícil desde o início da pandemia de Covid-19. "Sentimos muita pressão com esta pandemia", afirma. "O negócio arrefeceu e é mais complicado ganhar dinheiro", diz o taxista, reconhecendo que "vivemos um momento de crise mundial".
Foto: João Carlos/DW
Subsídio do Estado é irrisório
O subsídio de cerca de 60 euros atribuído apenas uma vez pelo Governo são-tomense foi irrisório face à dimensão dos prejuízos que os taxistas sofrem depois do surto da pandemia. "O santomense nunca acreditou que houve Covid-19 em São Tomé e Príncipe", afirma Euclides, explicando a razão pela qual já não exige aos passageiros o uso de máscaras.
Foto: João Carlos/DW
Clientes também têm dificuldades
Fernando Afonso Vila Nova, motoqueiro de 62 anos de idade, também tem limitações para sustentar a família. Ainda com filhos na escola, consegue o sustento com muito sacrifício, já agravado pelo acidente de viação que lhe afetou as pernas e um braço. A crise pandémica agudizou a sua situação e de muitos colegas: "Há pouco movimento porque os clientes também passam por dificuldades".
Foto: João Carlos/DW
Nem barba, nem cabelo e tampouco bigode
A Barbearia Rita é uma das mais antigas da cidade de São Tomé. Edne Sacramento, cabeleireiro há 17 anos e pai de três filhos, testemunha em que medida a Covid-19 prejudicou a sua atividade. "Antes da pandemia, tínhamos muitos clientes", relata. Mas "depois da pandemia, muitos sentiam aquele receio de vir cá ao salão cortar cabelo, apesar de cumprirmos as regras todas".
Foto: João Carlos/DW
Escassez de mercadorias
Maria Helena da Mata, há mais de 30 anos no comércio, diz que é "muito forte" o impacto na sua atividade. O país depende totalmente do exterior: "Houve falta de transporte marítimo, o que provocou escassez de mercadorias". Além disso, a crise afetou a situação das famílias. "As pessoas não têm dinheiro, não têm poder de compra. Isso faz com que o comércio esteja também numa situação caótica".
Foto: João Carlos/DW
Encerramentos e incertezas
Os setores da restauração, viagens e eventos não ficaram ilesos. Elisabete Carvalho avalia a atual conjuntura com algum alívio porque fez investimentos próprios sem recorrer a créditos. Ainda assim, foi obrigada a fechar os serviços e isso acabou por afetar muitas famílias que empregava. "Neste momento, tudo é uma incerteza", refere.
Foto: João Carlos/DW
O peixe de cada dia
Nascido na localidade de Praia Gambôa, arredores de São Tomé, o pescador Cristovão da Trindade confirma que a sua atividade também sofreu com a redução da campanha e limitação à circulação das "palaiês" [vendedeiras de peixe], afetando o rendimento de toda a comunidade. Agora que diminuiu o número de casos de infetados, ele e os demais pescadores tentam recuperar o tempo perdido.
Foto: João Carlos/DW
Acostumar-se ao teletrabalho
O jurista Weiko Bastos diz que a pandemia pesou fundamentalmente na redução da receita e dos honorários. Levou à diminuição da quantidade e qualidade de clientes. Isso, aliado ao confinamento, atingiu igualmente o orçamento da sua família, forçada a fazer contenção de gastos. "Não estávamos preparados para o teletrabalho e não tinha Internet em casa. As dificuldades eram maiores", recorda.
Foto: João Carlos/DW
Estudar em casa
O professor e escritor, Lúcio Amado é um observador crítico da sociedade são-tomense. Considera que a principal preocupação da população é a sobrevivência, o que faz com que se não dê muita atenção à luta contra a Covid-19. No entanto, reconhece, a pandemia teve reflexos perversos no sistema de ensino. As turmas tinham números elevados de alunos que foram forçados a ficar em casa.
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Dançar conforme a música
Tem um disco novo que devia ter sido lançado em 2020, o que não aconteceu devido à Covid-19. "Tive que suspender todos os trabalhos", explica Kalú Mendes, produtor e um dos músicos de referência de São Tomé e Príncipe. '"Também as grandes editoras começaram a ter problemas financeiros", afirma. No entanto, continua a trabalhar e espera ter o disco no mercado em 2022.
Foto: João Carlos/DW
Resistir à turbulência
Outra referência das artes das ilhas, João Carlos Nezó resiste às intempéries no sul de São Tomé: "Aqui o mercado de arte é muito pequeno", dependente de turistas estrangeiros. Com a pandemia, deixou de vender. Ficou em primeiro lugar num concurso da Aliança Francesa, que lhe dava o passaporte para participar numa residência artística. "Não pude ir porque a pandemia durou dois anos", lamenta.
Foto: João Carlos/DW
Quebra brutal no turismo
Ligada a um empreendimento turístico ecológico no sul de São Tomé, Luísa Carvalho lamenta a quebra de turistas. "Todos os dias há cancelamentos de reservas. Antes da pandemia, tínhamos muita procura", garante a gerente. "De julho até então", adianta, "têm estado a aparecer alguns clientes curiosos", que fogem um pouco à situação, por exemplo, na Europa. Ms prevê: "Isto já não será como era antes".
Foto: João Carlos/DW
Resistência à vacinação
No início, havia resistência da maioria dos são-tomenses em aceitar a vacina contra a Covid-19, devido a rumores sobre a Astrazeneca. No entanto, com a campanha iniciada a 15 de março, aumentou a adesão da população, diz Solange Barros, coordenadora do Programa Nacional de Vacinação. "As vacinas são todas eficazes". Mas, dá conta, a adesão à segunda dose ficou muito aquém do esperado.
Foto: João Carlos/DW
À espera da terceira dose
Daniel Costa reconhece que "a pandemia afetou toda a gente". Para este antigo militar das Forças Armadas, as restrições impostas pelo confinamento e fracos salários agravaram o nível de pobreza da população. Sentiu-se algum alívio com as medidas de apoio do Governo aos mais carenciados. Diz que está pronto para tomar a terceira dose de qualquer vacina e aconselha as pessoas a se vacinarem.
Foto: João Carlos/DW
Manter a esperança e o otimismo
Apesar de algum receio, há uma mensagem de esperança entre os são-tomenses. Os nossos entrevistados acreditam que "as coisas poderão melhorar" nos próximos tempos, sobretudo para a atividade turística afetada sobremaneira. Vive-se uma "normalidade aparente", como diz Elisabete Carvalho, mas a expetativa está em 2022, porque, argumenta Weiko Bastos, "a economia não suporta mais confinamentos".