Subsídio de reintegração para governantes gera polémica
Leonel Matias (Maputo)
22 de maio de 2020
A aprovação no parlamento de uma verba destinada à reintegração de governantes que deixam os cargos está a alimentar debates acesos em Moçambique. A sociedade civil insurge-se contra os encargos suplementares.
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A história repete-se: à semelhança do que aconteceu quando os deputados moçambicanos aprovaram subsídios para os representantes do povo que abandonam o parlamento, também a decisão de providenciar as mesmas benesses aos governantes que cessam funções fez estalar a controvérsia em Moçambique. A verba destinada ao chamado subsídio de reintegração está inscrita no Orçamento do Estado para 2020.
Não obstante tratar-se de um um ato lícito, as reações não se fizeram esperar. Para Adriano Nuvunga, coordenador da coligação de organizações da sociedade civil, Fórum de Monitoria do Orçamento, e da ONG Centro de Democracia e Desenvolvimento, a ação dos parlamentares não está correta, para mais tendo em conta o momento de pandemia que o país atravessa e que em que "A população está em casa e não tem o que comer”, disse Nuvunga à DW África.
Um escândalo
"São 600 milhões de meticais, e isso é escandaloso.”, acrescentou Nuvunga, O valor corresponde a mais de oito milhões de euros, o que leva o ativista a considerar que o subsídio é elevado demais e que qualquer verba a aplicar deve ter outras prioridades. "O país passa por um momento difícil de Covid-19, onde o Estado moçambicano não consegue providenciar o básico para a sua população”. Além disso, diz Muvunga, o país encontra-se em situação de subdesenvolvimento e de pobreza, justamente por causa de má governação dos dirigentes que agora vão beneficiar do subsídio .
Tomás Vieira Mário, diretor da Sekelekani, uma organização da sociedade civil que promove a comunicação e o desenvolvimento, considera que o termo reintegração suscita algumas dúvidas quando aplicado a servidores públicos. "Não se pode falar em reintegração de um antigo ministro, de um deputado, porque afinal estavam na sociedade até então”. Inclusive tinham "o papel de dirigir essa sociedade”, disse à DW África.
Custos acrescidos da descentralização
Este representante da sociedade civil diz que o subsídio de reintegração em geral acentua a injustiça económica no país."O deputado tem um fundo de reintegração social para o qual ele não desconta durante o seu mandato. E este é um fundo extra que sai do Estado, enquanto todos os outros cidadãos, que não estão no parlamento, descontam para a sua segurança social”, explicou.
Tomás Vieira Mário defende ainda que a percentagem de 75% do salário que serve de base para o cálculo do subsídio de reintegração é incomportável para a economia do país, em particular numa altura em que aumenta o número de servidores públicos com o processo de descentralização governativa.
"O que se espera é que se clarifiquem os critérios e se contextualize a origem desses fundos. É importante explicar como os servidores recebem um subsídio de reintegração, mas, ao mesmo tempo, podem ocupar cargos públicos acumulando os salários”, disse Vieira Mário.
Falta de legitimidade
Para o diretor da Sekelekani, é importante que o parlamento volte a debater a questão e que informe como se poderá dar o processo de reintegração sem causar prejuízos aos cofres públicos do país. "O parlamento que se mobilize e desencadeie um processo de debate mais amplo, no qual possa ser criado um consenso sobre essa matéria”.
Vieira Mário admite ainda assim que o subsídio de reintegração visa garantir que os servidores públicos saiam com alguma dignidade no fim do mandato. Mas para o coordenador do Fórum de Monitoria do Orçamento, é este subsídio não tem legitimidade. "Nem todas as leis são justas, nem todas as leis conferem direitos legítimos”, concluiu Nuvunga.
De capulanas a máscaras: alfaiatarias de Moçambique inovam em tempos de Covid-19
Em Moçambique, a grande procura levou muitas pessoas a investirem na produção e no comércio de máscaras faciais feitas de capulana.
Foto: DW/R. da Silva
As máscaras de capulana
As pessoas procuram pelas máscaras na tentativa de conter a propagação do coronavírus no país. O uso da máscara é também uma recomendação do Governo e, em alguns casos, obrigatório. As müascaras feitas de capulana estão a ganhar o mercado, conquistar os clientes e render um bom dinheiro.
Foto: DW/R. da Silva
Nova utilidade da capulana
É a capulanas como estas que muitos produtores recorrem para fabricar o seu mais novo produto: máscaras faciais. A capulana passou a ter mais esta utilidade por causa do coronavírus. O preço da capulana continua a ser o mesmo, custando entre o equivalente a 1,20 a pouco mais de 4 euros, dependendo da qualidade.
Foto: DW/R. da Silva
Tradição em capulanas
Na baixa de Maputo, a "Casa Elefante" é uma das mais antigas casas de venda de capulana da capital moçambicana. Vende variados tipos do produto. São muitas as senhoras que se deslocam ao local para a compra deste artigo para a produção das máscaras. As casas de venda de capulana passaram a ter muita afluência para responderem à grande procura pelos artigos por causa do coronavírus.
Foto: DW/R. da Silva
Produção caseira
Esta alfaiataria caseira funciona há cerca de 15 anos, em Maputo. Antes, a proprietária dedicava-se a costurar uniformes escolares. Por causa do coronavírus, passou a investir mais na produção de máscaras. Ela vende aos informais a um preço de 0,20 euros cada unidade.
Foto: DW/R. da Silva
Aproveitar a demanda
A alfaiataria da Luísa e da Fátima dedica-se à produção de vestuário de noivas e não só, mas também à sua consertação. Quando começou a procura pelas máscaras de produção com recurso à capulana, as duas empreendedoras tiveram que redobrar os esforços para produzi-las sem pôr em causa a confecção habitual. O rendimento diário subiu de cerca de 40 euros para 60 euros, dizem.
Foto: DW/R. da Silva
Produção a todo o vapor
Estes alfaiates, no mercado informal de Xiqueleni, costumam dedicar-se ao ajustamento de roupas de segundam mão, compradas no local. Mas devido à intensa procura pelas máscaras, dedicam a maior parte do tempo a produzir estes protetores faciais à base da capulana. Também eles estão a aproveitar a grande demanda pelo acessório.
Foto: DW/R. da Silva
Informais a vender máscaras
Desde que o Governo determinou a obrigatoriedade do uso de máscaras nos transportes e aglomerações, há pouco mais de uma semana, muitos vendedores informais, mulheres e homens, miúdos e graúdos compraram-nas para a posterior revenda. Um dos principais locais para a venda ao consumidor final são os terminais rodoviários.
Foto: DW/R. da Silva
Máscara para garantir a viagem
Os maiores terminais rodoviários, como por exemplo a Praça dos Combatentes, são os locais de aglomerados populacionais e onde muitos cidadãos acorrem para comprar as máscaras caseiras. Quando um passageiro não tem a máscara, sabe que pode encontrar o produto sem ter que percorrer longas distâncias e garantir o embarque nos meios de transporte.
Foto: DW/R. da Silva
Grande procura em Maputo
Neste "Tchova", carrinho de tração humana, há vários artigos. Os clientes estão a apreciar as máscaras, e não só, que o vendedor informal exibe. Os clientes referem que compram as máscaras não só para evitar a propagação do coronavírus, mas também porque os "chapeiros" exigem o uso das mesmas, sob pena de não permitirem a viagemm de quem não tiver o acessório.
Foto: DW/R. da Silva
Bons rendimentos
Os vendedores informais aproveitam a muita procura pelas máscaras caseiras para juntar ao seu habitual negócio. Jorge Lucas, além de vender acessórios de telefones, diz que "há muita procura" pelas máscaras feitas de capulana e que este negócio está a render "qualquer coisa como 20 euros por dia".
Foto: DW/R. da Silva
Quase 20 euros por dia
António Zunguze vende uma máscara pelo valor equivalente a 0,80 euros. Por dia, diz que consegue levar para casa o equivalente a quase 20 euros e explica que a procura é muita nos mercados informais. António compra as máscaras nas alfaiatarias e vai, posteriormente, revendê-las nos terminais de semi-coletivos.
Foto: DW/R. da Silva
Propaganda, "a alma do negócio"
Este jovem montou um megafone para anunciar que, além das sandálias, já tem igualmente máscaras para a venda. Na imagem, as máscaras podem ser vistas no topo da sombrinha e o megafone instalado no muro. O jovem refere que na sua banca não tem havido muita procura, mas acredita que melhores dias virão.
Foto: DW/R. da Silva
Máscaras até nos salões de beleza
Alguns salões de beleza também não perderam a oportunidade e estão a revender as máscaras. Neste salão, já não há clientes devido ao período de restrições para conter a propagação do coronavírus. O salão também investe na venda de máscaras feitas de capulana.