Sudão: Protesto é contra o governo e não contra preço do pão
Benita van Eyssen | AFP | rl
30 de dezembro de 2018
Onda de protestos no Sudão, que teve início a 19 de dezembro, nada tem a ver com o aumento do pão, mas sim com o facto do povo estar cansado deste regime, defendem especialistas e ativistas de direitos humanos.
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Os protestos no Sudão começaram a 19 de dezembro quando as pessoas saíram às ruas na cidade de Atbara, no nordeste do país, acabando por se estender a outras cidades, incluindo a capital Cartum.
Os manifestantes pedem liberdade, paz, justiça e uma mudança de liderança no país. Por sua vez, o governo do presidente Omar al-Bashir tem respondido com recurso a munições e gás lacrimogéneo.
"Na maioria das quase 170 cidades e grandes cidades do Sudão, alguém foi baleado. Em algumas delas, mais de 15 pessoas foram baleadas", diz Khansaa Al Kaarib, ativista de direitos humanos sudanesa. A também advogada acrescenta que tem sido isto que o povo sudanês tem recebido nos últimos 30 anos do Presidente Bashir: morte, morte e mais morte. As pessoas estão, simplesmente, fartas e querem mudanças".
Esta semana, o governo informou, oficialmente, que 19 pessoas haviam morrido na sequência dos confrontos com as autoridades que se têm registado desde o dia 19 de dezembro. Mas ativistas e grupos internacionais de defesa dos direitos humanos discordam e garantem que o número é muito superior. A Amnistia Internacional fala de 37 vítimas mortais.
Entretanto, este sábado (29.12), o secretário-geral das Nações Unidas (ONU), António Guterres, pediu "calma e moderação" no país e também uma investigação às mortes ocorridas durante os protestos.
Já este domingo (30.12), o presidente do Sudão, Omar al-Bashir, exortou a polícia a não usar força excessiva contra os manifestantes. O apelo do presidente surge após um encontro, em Cartum, com as autoridades. "Queremos manter a segurança [no país], mas queremos que a polícia o faça com menos força”, disse.
"Admitimos que temos problemas económicos ... mas eles não podem ser resolvidos com destruições e roubos", afirmou Omar al-Bashir, referindo-se aos prédios e escritórios dominados por manifestantes em várias cidades durante as manifestações. "Não queremos que nosso país siga o caminho de outros países da região", acrescentou.
"Já ninguém está a falar do pão”
Quando se iniciaram os protestos, a imprensa avançou que estes eram motivados por causa do aumento do preço do pão. No entanto, e segundo Magdi El Gizouli, especialista no Sudão, "a onda de protestos nada tem nada a ver” com este aumento. "Os meios de comunicação têm escrito que os protestos foram provocados por causa dos preços do combustível e dos problemas económicos do país. Os manifestantes têm repetido um apelo por liberdade, paz e justiça. Ninguém falou sobre pão desde o primeiro dia ", explica.
Esta não é a primeira vez que o povo do Sudão sai às ruas para exigir uma mudança de regime. "A última vez que isso aconteceu foi há apenas dois anos. Houve desobediência civil em todo o país, onde o povo também exigiu a queda do regime. Em 2013, pessoas saíram - 300 delas foram mortas nas ruas de Cartum. 2011, existiram também protestos contra o regime", lembra a ativista de direitos humanos Al Kaarib.
Definitivamente, é hora de Al-Bashir renunciar, afirma a académica sudanesa El Gizouli. "Na verdade, já há alguns anos. Ele não está fora do governo, é claro, mas acho que o Sudão está além dele. Ele é quase uma relíquia de outra época. As pessoas que nasceram em 1989, quando ele chegou ao poder, já são hoje jovens adultos com famílias próprias", constata.
Os chefes de Estado há mais tempo no poder
São presidentes, príncipes, reis ou sultões, de África, da Ásia ou da Europa. Estes são os dez chefes de Estado há mais tempo no poder.
Foto: Jack Taylor/Getty Images
Do golpe de Estado até hoje - Teodoro Obiang Nguema
Teodoro Obiang Nguema Mbasogo assumiu a Presidência da Guiné Equatorial em 1979, ainda antes de José Eduardo dos Santos. Teodoro Obiang Nguema derrubou o seu tio do poder: Francisco Macías Nguema foi executado em setembro de 1979. A Guiné Equatorial é um dos países mais ricos de África devido às receitas do petróleo e do gás, mas a maioria dos cidadãos não beneficia dessa riqueza.
Foto: DW/R. Graça
O Presidente que adora luxo - Paul Biya
Paul Biya é chefe de Estado dos Camarões desde novembro de 1982. Muitos dos camaroneses que falam inglês sentem-se excluídos pelo francófono Biya. E o Presidente também tem sido alvo de críticas pelas despesas que faz. Durante as férias, terá pago alegadamente 25 mil euros por dia pelo aluguer de uma vivenda. Na foto, está acompanhado da mulher Chantal Biya.
Foto: Reuters
Mudou a Constituição para viabilizar a reeleição - Yoweri Museveni
Yoweri Museveni já foi confirmado seis vezes como Presidente do Uganda. Para poder concorrer às eleições de 2021, Museveni mudou a Constituição e retirou o limite de idade de 75 anos. Venceu o pleito com 58,6% dos votos, reafirmando-se como um dos líderes autoritários mais antigos do mundo. O candidato da oposição, Bobi Wine, alegou fraude generalizada na votação e rejeitou os resultados oficiais.
Foto: Getty Images/AFP/I. Kasamani
"O Leão de Eswatini" - Mswati III
Mswati III é o último governante absolutista de África. Desde 1986, dirige o reino de Eswatini, a antiga Suazilândia. Acredita-se que tem 210 irmãos; o seu pai Sobhuza II teve 70 mulheres. A tradição da poligamia continua no seu reinado: até 2020, Mswati III teve 15 esposas. O seu estilo de vida luxuoso causou protestos no país, mas a polícia costuma reprimir as manifestações no reino.
Foto: Getty Images/AFP/J. Jackson
O sultão acima de tudo - Haji Hassanal Bolkiah
Há quase cinco décadas que o sultão Haji Hassanal Bolkiah é chefe de Estado e Governo e ministro dos Negócios Estrangeiros, do Comércio, das Finanças e da Defesa do Brunei. Há mais de 600 anos que a política do país é dirigida por sultões. Hassanal Bolkiah, de 74 anos, é um dos últimos manarcas absolutos no mundo.
Foto: Imago/Xinhua/J. Wong
Monarca bilionário - Hans-Adam II
Desde 1989, Hans-Adam II (esq.) é chefe de Estado do Liechtenstein, um pequeno principado situado entre a Áustria e a Suiça. Em 2004, nomeou o filho Aloísio (dir.) como seu representante, embora continue a chefiar o país. Hans-Adam II é dono do grupo bancário LGT. Com uma fortuna pessoal estimada em mais de 3 mil milhões de euros é considerado o soberano europeu mais rico.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Nieboer
De pastor a parceiro do Ocidente - Idriss Déby
Idriss Déby (à esq.) foi Presidente do Chade de 1990 a 2021. Filho de pastores, Déby formou-se em França como piloto de combate. Apesar do seu autoritarismo, Déby foi um parceiro do Ocidente na luta contra o extremismo islâmico (na foto com o Presidente francês Macron). Em abril de 2021, um apenas dia após após a confirmação da sua sexta vitória eleitoral, Déby foi morto num combate com rebeldes.
Foto: Eliot Blondet/abaca/picture alliance
Procurado por genocídio - Omar al-Bashir
Omar al-Bashir foi Presidente do Sudão entre 1993 e 2019. Chegou ao poder em 1989 depois de um golpe de Estado sangrento. O Tribunal Penal Internacional (TPI) emitiu em 2009 um mandado de captura contra al-Bashir por alegada implicação em crimes de genocídio e de guerra no Darfur. Em 2019, foi deposto e preso após uma onda de protestos no país.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
O adeus - José Eduardo dos Santos
José Eduardo dos Santos foi, durante 38 anos (de 1979 a 2017), chefe de Estado de Angola. Mas não se recandidatou nas eleições de 2017. Apesar do boom económico durante o seu mandato, grande parte da população continua a viver na pobreza. José Eduardo dos Santos tem sido frequentemente acusado de corrupção e de desvio das receitas da venda do petróleo. A sua família é uma das mais ricas de África.
Foto: picture-alliance/dpa/P.Novais
Fã de si próprio - Robert Mugabe
Robert Mugabe chegou a ser o mais velho chefe de Estado do mundo (com uma idade de 93 anos). O Presidente do Zimbabué esteve quase 30 anos na Presidência. Antes foi o primeiro-ministro. Naquela época, aconteceram vários massacres que vitimaram milhares de pessoas. Também foi criticado por alegada corrupção. Após um levantamento militar, renunciou à Presidência em 2017. Morreu dois anos mais tarde.