Sudão do Sul: Crianças sem escola devido à insegurança
Simon Wudu Waakhe
7 de março de 2017
Apesar do acordo de paz de 2015, há muito ainda por fazer. Milhares de crianças estão há anos sem acesso a educação, devido ao clima de insegurança. Conhecemos a situação em Leer.
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As crianças em Leer, retidas em áreas pantanosas pelos três anos de conflito no Sudão do Sul, não retiram proveito do acordo de paz para o país. Milhares de crianças não vão à escola desde que a violência começou em 2013.
Gatkwoch Jush tem 15 anos e o sonho de ser médico parece estar a desvanecer. "Não há escola por causa da guerra”, nota
Khemish Gok Lam, de 12 anos, veste calções pretos rasgados e t-shirt e conta que deixou de repente a escola, em 2013. Estava na primária quando o conflito começou. A vaguear no centro de registo Thonyor para receber ajuda alimentar, Lam confessa que também sonhava ser médico.
"Não vamos à escola desde que a guerra começou. Não tenho dinheiro para voltar à escola e o meu pai não tem trabalho para me enviar para outro local, porque ele não tem dinheiro.”
Segurança é prioridade
Andrew Ran tem 45 anos e 11 filhos. Viveu toda a vida em Leer com a família. Com o início do conflito escondeu-se na zona pantanosa. Nos últimos três anos nenhum dos filhos frequentou a escola. Ran lamenta que não haja escola naquela zona.
"A área pertence aos rebeldes de Machar. Não há escola”, afirma, acrescentando que "as crianças não têm escola desde 2013”.
Ran olha impotente enquanto fala, sem ideia de como pode educar os filhos. Tal como milhares de pessoas, foi apanhado pelo conflito na região e não tem meios para se mudar com a família para um lugar mais seguro, onde as crianças possam frequentar a escola. Viajar pelas estradas do país pode ser perigoso, nota Ran, porque os rebeldes podem facilmente pará-los.
"Se não há guerra os nossos filhos podem ir à escola. Se a guerra continua o que podemos fazer? Somos apenas o povo desta zona. Não queremos ir a lado nenhum. Ficaremos aqui na nossa terra”, sustenta.
Sem espaço para ajuda
Sudão do Sul: Crianças sem escola devido à insegurança
James Thot trabalha com uma agência na zona e considera que a situação é preocupante. Segundo Thot, as crianças estão traumatizadas com o conflito militar. Às vezes fazem armas para brincar em vez de ir à escola aprender.
"As crianças não vão à escola por causa da insegurança. Também os professores estão espalhados: alguns estão em Nyal, outros na zona norte, porque o custo de vida aqui é difícil e também a segurança aqui não permite às pessoas educar as crianças. Nem há livros. Não há giz”, explica.
Leer é a terra do líder rebelde e antigo vice-Presidente Riek Machar, controlado pelos rebeldes. Desde que o conflito começou que não há serviços governamentais na área. Agências humanitárias começaram apenas recentemente a entregar ajuda às populações.
A UNICEF estima que 1,8 milhões crianças foram forçadas a abandonar a escola depois do início do conflito, em 2013.
Sudão do Sul: caos no país mais jovem do mundo
Por mais de um mês, o ex-vice-presidente Riek Machar luta com seu exército rebelde contra o Governo do Presidente Salva Kiir. Uma guerra que tem tomado contornos étnicos e já custou cerca de 10 mil vidas, segundo a ONU.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Cidade destruída
Por mais de um mês, o ex-vice-presidente Riek Machar luta com seu exército rebelde contra o Governo do Presidente Salva Kiir. Uma guerra que tem tomado contornos étnicos e já custou cerca de 10 mil vidas, segundo a ONU. Muitos lugares foram completamente queimados. Tudo o que os habitantes da cidade de Bentiu ainda têm cabe num saco plástico.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Soldados versus antigos companheiros
O Exército Popular de Libertação do Sudão (sigla em inglês, SPLA) pôde reconquistar cidades importantes dos rebeldes. Os soldados muitas vezes lutaram contra seus antigos camaradas. Em meados de dezembro, uma parte do exército voltou-se contra o Governo do Presidente Salva Kiir para seguir o líder dos rebeldes, o ex-vice-presidente Machar.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
De inimigos a aliados
Para vencer a luta contra os rebeldes, o Governo também se aliou a líderes de controversas milícias – como David Yau Yau, cujo exército lutou durante anos contra o Estado. Até há alguns meses, o Governo queria processar Yau Yau por crimes de guerra. Também crianças lutam no exército dele. Isso se deveria "à natureza dos conflitos no Sudão do Sul," disse Yau Yau.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
O reduto rebelde
Junto com seus aliados, as tropas do Governo querem reconquistar Malakal - a maior cidade nas mãos dos rebeldes. "As tropas de Riek Machar levam os jovens ao equívoco e recrutam meninos de 16 anos de idade", diz Simon Kun Puoch, o governador do estado do Alto Nilo. Ele teme que o conflito faça retroceder em vários anos o desenvolvimento do país.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
A violência como o único meio?
Peter Adwok Nyaba perdeu uma perna na Guerra da Independência. Desde que o Presidente Kiir dissolveu o gabinete, em julho de 2013, o ex-ministro se solidariza com os insurgentes. "No Sudão do Sul, o exército é considerado o único meio para implementar as metas," disse o político Nyaba. "Também o Presidente acredita poder resolver o conflito entre ele e seus colegas apenas por meios militares."
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Solução política para o conflito
"Sabemos que a solução para o conflito não é militar", disse o porta-voz do exército Philip Aguer. O Sudão do Sul está numa crise política que também deveria ser resolvida politicamente. "É triste que alguns políticos tentam dividir o exército e o povo sul-sudanês para alcançar seus objetivos."
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Uma nação dividida
Ambos os lados negociam sem sucesso há várias semanas. Enquanto isso, o conflito tornou-se cada vez mais étnico - também no exército. Akot Arech, um enviado do Presidente, visita um quartel em que 200 soldados de diferentes grupos étnicos assassinaram uns aos outros. "Isso é inconcebível", diz o político visivelmente chocado. "Como vamos reconstruir o nosso país?"
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
Em fuga
Mesmo nos campos de refugiados das Nações Unidas, os vários grupos étnicos são alojados separadamente. Especialmente entre os Dinka, o grupo étnico do Presidente, e os Nuer, ao qual pertence também o líder rebelde Machar, houve repetidos confrontos. Após ataques direcionados na capital Juba, 20.000 Nuer fugiram para o acampamento Tonping da ONU, há semanas irremediavelmente superlotado.
Foto: DW/J.-P.Scholz/A.Kriesch
O medo de novos ataques
Há meses, o professor Isaac Maet vive com sua esposa no acampamento de refugiados. Ele tem medo de novos ataques e pouca esperança de que possa, em breve, voltar a trabalhar como professor. "Se fosse apenas um conflito político, com certeza haveria uma solução", diz Maet. "Mas agora é um conflito étnico que, certamente, não será resolvido tão rapidamente."