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Taxa de vistos do Sudão do Sul é "ameaça" à ajuda externa

Amien Essif | tm
18 de março de 2017

Devastado pela guerra e assolado pela fome, Sudão do Sul eleva a taxa de permissão de trabalho para estrangeiros. Medida afeta grupos de ajuda humanitária internacional e pode resultar num desastre para o país.

Ärzte ohne Grenzen Médecins Sans Frontières MSF
Foto: Anna Surinyach/MSF

Depois que o Sul do Sudão elevou drasticamente, no início do mês, as taxas de emissão de vistos de trabalho para estrangeiros, a Organização das Nações Unidas (ONU) interveio para pedir que os trabalhadores humanitários sejam isentos da cobrança.

O país africano está sendo assolado pela fome e um terço da população depende da ajuda internacional para a alimentação básica. Mediante a cobrança de tais taxas, algumas organizações de ajuda não são capazes de continuar as suas operações.

"Nunca ouvi falar de um aumento tão drástico", disse Elizabeth Deng, pesquisadora da Amnistia Internacional no Sudão do Sul, à DW África. "A taxa é claramente exorbitante, e poderia violar a obrigação do governo de trabalhar com grupos de ajuda".

É um "direito" elevar as taxas?

O Ministério do Trabalho do Sudão do Sul, que propôs o aumento, argumentou que a medida não é incomum. "Qualquer país do mundo tem o direito de impor permissões de trabalho a estrangeiros", disse o porta-voz do Governo, Ateny Wek Ateny, num comunicado. "Se você não pode pagar 10 mil dólares, então você pode contratar pessoas locais em vez disso."

O ministério elevou as taxas de vistos de "trabalhadores ocasionais" de 100 dólares (93 euros) para mil dólares; taxas de visto "blue collar" (para atividades que envolvem força física e habilidades manuais), de 150 para 2 mil dólares; e taxas de visto "profissional", de 300 para 10 mil dólares.

Taxa excecionalmente elevada

Taxas de permissão de trabalho são, certamente, uma medida adotada por todos os países. Mas as taxas em todo o mundo raramente chegam a mil dólares. Na Europa, os vistos de trabalho temporário variam de 60 euros (65 dólares) na Alemanha a 230 euros na Grã-Bretanha. Nos Estados Unidos, uma licença de trabalho temporário vem com uma taxa de 190 dólares, que se assemelha à taxa cobrada na China.

Milhares de sul-sudaneses dependem da ajuda humanitária para se alimentarFoto: REUTERS

Em alguns países africanos onde a ajuda externa constitui uma grande parte da economia, o preço de uma autorização de trabalho pode ser maior. Funcionários de organizações não-governamentais podem pagar pelo menos 1,5 mil dólares por uma autorização de trabalho no Uganda.

O Quênia é um dos destinos mais populares para os trabalhadores humanitários estrangeiros em África, e também é um dos mais caros. Funcionários de ONGs que não são cidadãos quenianos devem adquirir a categoria de permissão de trabalho mais cara, que custa 1,9mil dólares por ano.

Grupos de ajuda sob pressão

O Quénia adotou outras formas de pressão para que os trabalhadores humanitários estrangeiros deixassem o país. Em junho de 2016, a Junta de ONGs do Quênia, um órgão governamental, emitiu um memorando que alegou que havia "uma tendência crescente de expatriados de carreira que criaram o hábito de saltar de uma organização para outra, aproveitando-se dos regulamentos do Quênia". Assim, o Governo declarou que não emitiria licenças de trabalho para ONGs estrangeiras a menos que pudessem provar que o trabalho seria eventualmente transferido para um queniano.

Ishbel McWha-Hermann, professora da Universidade de Edimburgo, na Escócia, que estuda a justiça no setor de ajuda internacional, alertou que não é possível comparar a situação do Quênia ou do Uganda com a do Sudão do Sul.

A pesquisa de McWha-Hermann mostrou que no Uganda, como no Quénia, o grupo de trabalhadores humanitários qualificados está competindo por empregos e salários com trabalhadores estrangeiros e está perdendo. O resultado é um "sistema de duplo salário", no qual os trabalhadores humanitários expatriados ganham, em média, o dobro de seus colegas nativos.

Sudão do Sul assolado pela fome

01:29

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"A longo prazo, prejudica o trabalho de fornecer ajuda ao país", disse ela.

Um caso diferente

O Sudão do Sul está numa situação muito diferente do Quénia. Envolvido em uma guerra civil e numa situação de deterioração da fome, o país do leste africano é mais dependente da ajuda externa do que seu vizinho do sul.

"Colocar pressão sobre ONGs para contratar mais trabalhadores locais não é uma coisa ruim em geral", disse McWha-Hermann. "Mas em uma situação de emergência, você não quer demasiada burocracia para atrapalhar quem precisa desesperadamente dela".

Para Elizabeth Deng, da Amnistia Internacional, a medida mais recente do Sudão do Sul foi motivada por uma série de razões que não estão ocorrem no Quénia. O aumento da taxa, como admitiu o Ministério do Trabalho, destina-se a preencher um défice orçamental à custa das empresas estrangeiras.

Deng observa que o aumento da taxa se aplica ao setor privado também, e, com a recente perda de receitas de petróleo no sul do Sudão, o Governo vê a tributação como uma fonte de receita.

"Ambiente hostil"

Deng também suspeita que o Governo sul-sudanês está "relutante em fazer com que os observadores documentem o que está acontecendo" no país, e impedir o trabalho das ONGs atrasaria o fluxo de informações. O ministro dos Assuntos de Gabinete do Sudão do Sudão, Martin Lomuro, disse recentemente à agência de notícias Associated Press que acreditava que "a maioria das agências [humanitárias] estão aqui para espionar o Governo".

Deng diz que o Sudão do Sul é um "ambiente hostil para os trabalhadores humanitários em geral", com exemplos de soldados do Governo saqueando bens humanitários e prendendo funcionários de ONGs.

"As taxas são parte de um fracasso geral em respeitar os trabalhadores humanitários", disse Deng.

À espera de respostas

O aumento das taxas de licença entrou em vigor este mês, mas as mesmas não devem ser pagas até o final do mês. Várias ONGs recusaram-se a falar com a imprensa, deixando espaço para o Governo voltar atrás em seu plano. A ONU está em negociações com o país para que os trabalhadores humanitários sejam isentos do aumento das taxas e está aguardando uma resposta.

 

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