Tribunal de Cartum condenou ex-Presidente sudanês a dois anos de prisão por um crime de enriquecimento ilícito e lavagem de dinheiro. É a primeira condenação contra o ex-chefe de Estado afastado do poder em abril.
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Um tribunal de Cartum condenou este sábado (14.12) o ex-Presidente sudanês Omar al-Bashir a dois anos de prisão pelos crimes de enriquecimento ilícito e lavagem de dinheiro. O tribunal considerou al-Bashir culpado por posse ilegal de moeda estrangeira depois de as autoridades apreenderem sete milhões de euros em sua casa, dias após a sua saída do poder.
Esta é a primeira condenação contra o antigo ditador, de 75 anos. O juiz Al-Sadeq Abdelrahman informou que a pena prevista para esse crime é de até dez anos, mas o sistema atual não permite a condenação de pessoas de mais de 70 anos. Por esse motivo, o ex-governante ficará confinado num centro de reabilitação durante esses dois anos.
Além disso, o tribunal ordenou o confisco de todos os bens apreendidos na residência de Omar al-Bashir. O ex-Presidente tinha argumentado que o dinheiro fazia parte de um montante de 25 milhões de dólares enviados pelo príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohammad bin Salman, para ajudar o país e que o resto da quantia teria sido gasto em assuntos de interesse público.
Ahmed Ibrahim al-Tahir, um dos advogados de defesa do ex-Presidente sudanês, afirmou em declarações à agência de notícias alemã DPA, no tribunal, que a equipa está a ponderar recorrer da decisão. "O Presidente não recebeu nenhum dinheiro em benefício pessoal e o julgamento decorreu em circunstâncias políticas complicadas", disse o advogado.
"Esta sentença representa uma condenação política e moral do [Presidente] deposto e do seu regime", disse, por sua vez, a Associação dos Profissionais do Sudão, um dos grupos que lideraram o movimento para derrubar Omar al-Bashir. Isto "não é certamente o fim", acrescentou o grupo, em comunicado, frisando que "as listas de acusações sobre os maiores crimes de al-Bashir estão a ser trabalhadas".
O antigo ditador também foi acusado de violar a Constituição, mas o processo relacionado a esse caso ainda não avançou na Justiça sudanesa.
Para já, al-Bashir vai continuar na prisão de Kobar, na capital sudanesa, uma vez que ainda enfrenta outros casos. Os advogados do ex-chefe de Estado confirmaram esta semana que al-Bashir foi chamado a responder a questões sobre o golpe que o levou ao poder, em 1989, e sobre a morte de manifestantes no início de 2019.
Omar al-Bashir é ainda acusado de crimes contra a humanidade no Tribunal Penal Internacional (TPI) pelo conflito em Darfur, que começou em 2003, após a insurgência armada de dois grupos rebeldes e que resultou em 300 mil mortos e 2,5 milhões de deslocados. No entanto, o ex-Presidente ainda não foi acusado por esses crimes no Sudão.
O Governo de transição militar-civil do país não indicou até agora se vai entregar Al-Bashir a Haia.
O povo contra o exército - Cronologia da luta pelo poder no Sudão
A evacuação violenta de um campo de protesto na capital sudanesa, Cartum, exacerbou as tensões entre manifestantes e militares. A luta pelo poder documentada em imagens.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Protesto
Durante semanas, manifestantes sudaneses resistiram diante do Ministério da Defesa. Milhares exigiram um conselho de transição que incluísse civis, para poderem também decidir sobre o futuro do país. No início de junho, os militares atacaram violentamente os manifestantes. Dezenas de pessoas morreram.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Em nome da nação
Um manifestante com a bandeira nacional perto do quartel-general do exército. A bandeira representa a exigência dos manifestantes de civis nos comandos para moldarem o futuro do país juntamente com os militares. A acontecer, este seria um passo importante para a democracia.
Foto: Reuters
Sinais de alarme
Os militares aumentaram massivamente a presença nas ruas, nos dias que antecederam o massacre no início de junho. Muitos manifestantes interpretaram a situação como prova de que o exército não queria abandonar o poder. Mas esta tinha sido a grade esperança de muitos sudaneses após a queda do ditador Omar al-Bashir.
Foto: Getty Images/AFP
Uma era chega ao fim
Omar al-Bashir governou o Sudão desde 1993 até sua queda, em abril de 2019. Os seus críticos foram violentamente reprimidos. Para manter o poder, al-Bashir chegou a dissolver o Parlamento, em 1999. Na mesma altura, concedeu asilo ao líder da Al-Qaeda, Osama bin Laden. Acima de tudo, porém, o seu nome continua associado à guerra sangrenta contra os separatistas na província de Darfur.
Foto: Reuters/M. Nureldin Abdallah
Ditador em tribunal
Ver o ditador em tribunal era um sonho antigo de muitos sudaneses. A 16 de junho, Omar al-Bashir apareceu no processo contra ele instaurado. Para já, é acusado de corrupção e posse ilegal de moeda estrangeira. Depois da sua queda, a polícia encontrou na sua residência sacos de dinheiro no valor de mais de cem milhões de dólares.
Foto: picture-alliance/AP Photo/M. Hjaj
As mulheres querem ser ouvidas
Muitas mulheres participaram nos protestos. As mulheres no Sudão sempre beneficiaram de uma liberdade relativamente significante. Agora, não só reforçam quantitativamente as manifestações, como também lhes dão um rosto diferente. A sua presença expressa o desejo de democracia e igualdade de muitos cidadãos.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Ícone da revolução
A estudante de arquitetura Alaa Salah tornou-se a face da revolução. Quando subiu ao telhado de um carro em abril para falar com os manifestantes, um fotógrafo atento fez esta imagem. Desde então, ela tem sido partilhada inúmeras vezes nas redes sociais. Fotos como estas tornaram-se uma parte importante da revolução, porque convidam os cidadãos a identificarem-se com os protestos.
Foto: Getty Images/AFP
Solidariedade internacional
Graças às plataformas sociais online, a notícia dos protestos no Sudão rapidamente correu o mundo. E logo mereceram apoio internacional, como aqui em Edimburgo, Escócia. Recentemente os ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia também se fizeram ouvir: "A UE apela ao fim imediato de toda a violência contra o povo sudanês", disseram numa declaração oficial.
No entanto, a oposição ao exército no poder não é consensual. Muitos sudaneses apoiam os militares, porque acreditam que só uma governação autoritária pode conduzir o país a um futuro próspero. Os apoiantes dos militares consideram que o General Abdel Fattah Burhan, presidente do Conselho Militar, representado no cartaz, reúne as condições para cumprir a tarefa.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
À espera
Mas a eminência parda General Mohammed Hamdan Daglu, conhecido por Hemeti, é tido como o homem forte do regime de transição. Daglu comandou a tropa que reprimiu os protestos em frente ao quartel-general militar. Durante a guerra do Darfur, liderou as milícias Janjaweed, que combateram brutalmente os rebeldes. Os manifestantes temem que ele possa vir a ser o novo governante do país.
Foto: Reuters/M.N. Abdallah
O Golfo preocupado
Políticos de outros países árabes também olham com nervosismo para o Sudão. Por exemplo, Mohamed bin Zayad al-Nahyan, o Príncipe Herdeiro dos Emirados Árabes Unidos. Tal como a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos temem que o protesto possa ser um exemplo de uma revolução popular bem-sucedida na região, pondo em questão governos autoritários. Ambos os países apoiam os militares sudaneses.
Foto: picture-alliance/AP Photo/Ministry of Presidential Affairs/M. Al Hammadi
Os vizinhos a norte
Também no Cairo se olha com preocupação para Cartum. O Governo do Presidente Abdel-Fattah al-Sisi receia que a Irmandade Muçulmana possa ganhar influência no Sudão - precisamente o grupo contra o qual o Governo egípcio está a agir com todas as suas forças no seu próprio país. Se a Irmandade Muçulmana se estabelecesse no Sudão, poderia, a partir daí, voltar a exercer uma forte influência no Egito.
Foto: picture-alliance/Photoshot/MENA
Protestos sem fim à vista
No Sudão prosseguem os protestos. No dia 14 de junho, Sadiq al-Mahdi, uma das principais figuras da oposição do país durante décadas, exigiu uma investigação da evacuação violenta do campo de protesto. É algo que não pode agradar aos militares. As tensões poderão voltar a agravar-se.