Sudão: Grupos armados e junta militar chegam a acordo
AP | EFE | Reuters
3 de agosto de 2019
Notícia foi avançada pelo enviado da União Africana ao Sudão. O acordo terá sido alcançado na madrugada deste sábado (03.08) e deve ser assinado nas próximas 48 horas. Sudaneses sairam às ruas a festejar.
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O enviado da União Africana ao Sudão afirmou, este sábado (03.08), que a principal coligação da oposição e o conselho militar do Sudão finalizaram um acordo acerca da partilha de poder do país. Segundo Mohammed el-Hassan Lebatt, os dois lados estão "totalmente de acordo" sobre uma declaração constitucional que define a divisão do poder que regerá o período de transição.
Segundo Mohammed el-Hassan Lebatt, representantes dos dois lados vão reunir-se, ainda este sábado, para preparar a cerimónia de assinatura deste acordo. Também o movimento de contestação que pede uma liderança civil no Sudão emitiu uma declaração confirmando que assinará o documento este domingo (04.08).
Festejos nas ruas
À medida que as notícias do acordo surgiram, as pessoas começaram a reunir-se em Nile Street, uma das principais avenidas de Cartum. Ouviram-se buzinas de carros e gritos de celebração. "Vencemos", gritavam algumas pessoas, enquanto outras cantavam o hino nacional.
A principal coligação da oposição, as Forças da Liberdade e Mudança (FFC), congratulou-se com o acordo como um "primeiro passo com mais para seguir" e prometeu completar a jornada para a "liberdade", paz e justiça" no Sudão.
Complemento ao acordo de julho
O acordo agora alcançado complementa o pacto preliminar do passado mês de julho. De acordo com o texto aprovado, notou Ebtisam Sanhory, representante das Forças da Liberdade e Mudança, uma plataforma de partidos políticos e movimentos civis pró-democracia, o Sudão terá um Conselho Soberano, um Conselho de Ministros e um Conselho Legislativo.
Sanhory detalhou ainda que o Conselho de Ministros estará dirigido por um primeiro-ministro nomeado por essa plataforma e referendado pelo Conselho Soberano. O primeiro-ministro nomeará até um máximo de 20 ministros, que deverão ser ratificados pelo Conselho Soberano, que é o principal órgão do Estado e que terá membros militares e civis. Os ministros de Interior e de Defesa, por sua vez, serão escolhidos pelos representantes militares no Conselho Soberano.
Além disso, outro dos pontos em discussão, a composição do Conselho Legislativo, ficou finalmente como pretendiam as Forças da Liberdade e da Mudança, que terão 67% dos representantes, enquanto os 33% restantes estarão em mãos de legendas políticas não vinculadas à plataforma.
"O documento constitucional para o período transitório estabelecerá um sistema de governo parlamentar que é totalmente diferente dos anteriores no Sudão", ressaltou Sanhory.
Civis e militares alcançaram o acordo após dias de tensão pelas mortes de manifestantes em protestos em diferentes partes do país, o que fez com que as Forças da Liberdade e da Mudança adiassem as negociações.
O povo contra o exército - Cronologia da luta pelo poder no Sudão
A evacuação violenta de um campo de protesto na capital sudanesa, Cartum, exacerbou as tensões entre manifestantes e militares. A luta pelo poder documentada em imagens.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Protesto
Durante semanas, manifestantes sudaneses resistiram diante do Ministério da Defesa. Milhares exigiram um conselho de transição que incluísse civis, para poderem também decidir sobre o futuro do país. No início de junho, os militares atacaram violentamente os manifestantes. Dezenas de pessoas morreram.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Em nome da nação
Um manifestante com a bandeira nacional perto do quartel-general do exército. A bandeira representa a exigência dos manifestantes de civis nos comandos para moldarem o futuro do país juntamente com os militares. A acontecer, este seria um passo importante para a democracia.
Foto: Reuters
Sinais de alarme
Os militares aumentaram massivamente a presença nas ruas, nos dias que antecederam o massacre no início de junho. Muitos manifestantes interpretaram a situação como prova de que o exército não queria abandonar o poder. Mas esta tinha sido a grade esperança de muitos sudaneses após a queda do ditador Omar al-Bashir.
Foto: Getty Images/AFP
Uma era chega ao fim
Omar al-Bashir governou o Sudão desde 1993 até sua queda, em abril de 2019. Os seus críticos foram violentamente reprimidos. Para manter o poder, al-Bashir chegou a dissolver o Parlamento, em 1999. Na mesma altura, concedeu asilo ao líder da Al-Qaeda, Osama bin Laden. Acima de tudo, porém, o seu nome continua associado à guerra sangrenta contra os separatistas na província de Darfur.
Foto: Reuters/M. Nureldin Abdallah
Ditador em tribunal
Ver o ditador em tribunal era um sonho antigo de muitos sudaneses. A 16 de junho, Omar al-Bashir apareceu no processo contra ele instaurado. Para já, é acusado de corrupção e posse ilegal de moeda estrangeira. Depois da sua queda, a polícia encontrou na sua residência sacos de dinheiro no valor de mais de cem milhões de dólares.
Foto: picture-alliance/AP Photo/M. Hjaj
As mulheres querem ser ouvidas
Muitas mulheres participaram nos protestos. As mulheres no Sudão sempre beneficiaram de uma liberdade relativamente significante. Agora, não só reforçam quantitativamente as manifestações, como também lhes dão um rosto diferente. A sua presença expressa o desejo de democracia e igualdade de muitos cidadãos.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Ícone da revolução
A estudante de arquitetura Alaa Salah tornou-se a face da revolução. Quando subiu ao telhado de um carro em abril para falar com os manifestantes, um fotógrafo atento fez esta imagem. Desde então, ela tem sido partilhada inúmeras vezes nas redes sociais. Fotos como estas tornaram-se uma parte importante da revolução, porque convidam os cidadãos a identificarem-se com os protestos.
Foto: Getty Images/AFP
Solidariedade internacional
Graças às plataformas sociais online, a notícia dos protestos no Sudão rapidamente correu o mundo. E logo mereceram apoio internacional, como aqui em Edimburgo, Escócia. Recentemente os ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia também se fizeram ouvir: "A UE apela ao fim imediato de toda a violência contra o povo sudanês", disseram numa declaração oficial.
No entanto, a oposição ao exército no poder não é consensual. Muitos sudaneses apoiam os militares, porque acreditam que só uma governação autoritária pode conduzir o país a um futuro próspero. Os apoiantes dos militares consideram que o General Abdel Fattah Burhan, presidente do Conselho Militar, representado no cartaz, reúne as condições para cumprir a tarefa.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
À espera
Mas a eminência parda General Mohammed Hamdan Daglu, conhecido por Hemeti, é tido como o homem forte do regime de transição. Daglu comandou a tropa que reprimiu os protestos em frente ao quartel-general militar. Durante a guerra do Darfur, liderou as milícias Janjaweed, que combateram brutalmente os rebeldes. Os manifestantes temem que ele possa vir a ser o novo governante do país.
Foto: Reuters/M.N. Abdallah
O Golfo preocupado
Políticos de outros países árabes também olham com nervosismo para o Sudão. Por exemplo, Mohamed bin Zayad al-Nahyan, o Príncipe Herdeiro dos Emirados Árabes Unidos. Tal como a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos temem que o protesto possa ser um exemplo de uma revolução popular bem-sucedida na região, pondo em questão governos autoritários. Ambos os países apoiam os militares sudaneses.
Foto: picture-alliance/AP Photo/Ministry of Presidential Affairs/M. Al Hammadi
Os vizinhos a norte
Também no Cairo se olha com preocupação para Cartum. O Governo do Presidente Abdel-Fattah al-Sisi receia que a Irmandade Muçulmana possa ganhar influência no Sudão - precisamente o grupo contra o qual o Governo egípcio está a agir com todas as suas forças no seu próprio país. Se a Irmandade Muçulmana se estabelecesse no Sudão, poderia, a partir daí, voltar a exercer uma forte influência no Egito.
Foto: picture-alliance/Photoshot/MENA
Protestos sem fim à vista
No Sudão prosseguem os protestos. No dia 14 de junho, Sadiq al-Mahdi, uma das principais figuras da oposição do país durante décadas, exigiu uma investigação da evacuação violenta do campo de protesto. É algo que não pode agradar aos militares. As tensões poderão voltar a agravar-se.