Sudão: Forças policiais detidas por morte de manifestantes
Lusa | AFP | nn
2 de agosto de 2019
Os generais do Sudão anunciaram esta sexta-feira a detenção de nove membros das Forças de Reação Rápida (RSF), pela morte de civis durante manifestações no país. Protestos duram há já mais de oito meses.
"Uma investigação foi aberta sobre os acontecimentos de Al-Obeid [centro do país], e sete membros das RSF foram imediatamente demitidos e entregues à justiça civil para julgamento", disse o general Shamseddine Kabbashi, citado pela agência de notícias France-Presse (AFP). O porta-voz do Conselho Militar, que lidera o país desde que o Presidente Omar al-Bashir foi afastado do poder, disse ainda que, na quinta-feira, dois outros membros daquela força policial foram presos, sendo nove no total.
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Protestos continuam
Milhares de estudantes saíram esta semana às ruas em Cartum e outras cidades do Sudão em protesto contra a morte de cinco estudantes, na segunda-feira, no centro do país, segundo as agências internacionais.
Os manifestantes acusam as RSF, dirigidas pelo número dois da Junta Militar que lidera o país, Mohammed Hamdan Daglo, de ter disparado sobre a multidão que protestava contra a falta de pão e combustível na cidade de Obeid.
O chefe do Conselho Militar, no poder, condenou a morte dos cinco estudantes, classificando-a como "um crime inaceitável" que "não pode ficar impune".
Retomar das conversações
A morte dos cinco estudantes, na cidade de Obeid, levou à suspensão das negociações que estavam previstas entre o Conselho Militar e os líderes do movimento de contestação no Sudão.
Mas as conversações entre os dirigentes militares e os líderes do movimento de contestação no Sudão foram retomadas, anunciou na quinta-feira o presidente do comité político do Conselho de Transição Militar. Segundo o militar, citado pela agência Suna, as duas partes estão a discutir um novo texto constitucional.
O país vive envolto num movimento de contestação desde dezembro de 2018, desencadeado pelo triplicar do preço do pão, mas que se transformou em contestação ao regime e levou à destituição, em abril, do Presidente Omar al-Bashir, após 30 anos no poder.
A contestação manteve-se para reclamar um Governo civil e melhores condições de vida para as populações mesmo depois da constituição de um Conselho Militar.
Em 17 de julho, os generais no poder e os líderes do movimento opositor concluíram, após difíceis negociações, um acordo sobre a criação de um Conselho Soberano composto por cinco militares e seis civis responsável por liderar o período de transição até à realização de eleições.
As duas partes retomam as negociações para acordar alguns pontos em suspenso, segundo anunciou, no domingo, o mediador da União Africana para o país, Mohamed al Hacen Lebatt.
Desde dezembro, a repressão da contestação causou 246 mortos, incluindo 127 manifestantes mortos em 03 de junho num acampamento em Cartum, segundo um balanço do comité de médicos divulgado antes das manifestações em Obeid. As autoridades apresentam balanços divergentes e com números de mortos e feridos bastante inferiores.
O povo contra o exército - Cronologia da luta pelo poder no Sudão
A evacuação violenta de um campo de protesto na capital sudanesa, Cartum, exacerbou as tensões entre manifestantes e militares. A luta pelo poder documentada em imagens.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Protesto
Durante semanas, manifestantes sudaneses resistiram diante do Ministério da Defesa. Milhares exigiram um conselho de transição que incluísse civis, para poderem também decidir sobre o futuro do país. No início de junho, os militares atacaram violentamente os manifestantes. Dezenas de pessoas morreram.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Em nome da nação
Um manifestante com a bandeira nacional perto do quartel-general do exército. A bandeira representa a exigência dos manifestantes de civis nos comandos para moldarem o futuro do país juntamente com os militares. A acontecer, este seria um passo importante para a democracia.
Foto: Reuters
Sinais de alarme
Os militares aumentaram massivamente a presença nas ruas, nos dias que antecederam o massacre no início de junho. Muitos manifestantes interpretaram a situação como prova de que o exército não queria abandonar o poder. Mas esta tinha sido a grade esperança de muitos sudaneses após a queda do ditador Omar al-Bashir.
Foto: Getty Images/AFP
Uma era chega ao fim
Omar al-Bashir governou o Sudão desde 1993 até sua queda, em abril de 2019. Os seus críticos foram violentamente reprimidos. Para manter o poder, al-Bashir chegou a dissolver o Parlamento, em 1999. Na mesma altura, concedeu asilo ao líder da Al-Qaeda, Osama bin Laden. Acima de tudo, porém, o seu nome continua associado à guerra sangrenta contra os separatistas na província de Darfur.
Foto: Reuters/M. Nureldin Abdallah
Ditador em tribunal
Ver o ditador em tribunal era um sonho antigo de muitos sudaneses. A 16 de junho, Omar al-Bashir apareceu no processo contra ele instaurado. Para já, é acusado de corrupção e posse ilegal de moeda estrangeira. Depois da sua queda, a polícia encontrou na sua residência sacos de dinheiro no valor de mais de cem milhões de dólares.
Foto: picture-alliance/AP Photo/M. Hjaj
As mulheres querem ser ouvidas
Muitas mulheres participaram nos protestos. As mulheres no Sudão sempre beneficiaram de uma liberdade relativamente significante. Agora, não só reforçam quantitativamente as manifestações, como também lhes dão um rosto diferente. A sua presença expressa o desejo de democracia e igualdade de muitos cidadãos.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Ícone da revolução
A estudante de arquitetura Alaa Salah tornou-se a face da revolução. Quando subiu ao telhado de um carro em abril para falar com os manifestantes, um fotógrafo atento fez esta imagem. Desde então, ela tem sido partilhada inúmeras vezes nas redes sociais. Fotos como estas tornaram-se uma parte importante da revolução, porque convidam os cidadãos a identificarem-se com os protestos.
Foto: Getty Images/AFP
Solidariedade internacional
Graças às plataformas sociais online, a notícia dos protestos no Sudão rapidamente correu o mundo. E logo mereceram apoio internacional, como aqui em Edimburgo, Escócia. Recentemente os ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia também se fizeram ouvir: "A UE apela ao fim imediato de toda a violência contra o povo sudanês", disseram numa declaração oficial.
No entanto, a oposição ao exército no poder não é consensual. Muitos sudaneses apoiam os militares, porque acreditam que só uma governação autoritária pode conduzir o país a um futuro próspero. Os apoiantes dos militares consideram que o General Abdel Fattah Burhan, presidente do Conselho Militar, representado no cartaz, reúne as condições para cumprir a tarefa.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
À espera
Mas a eminência parda General Mohammed Hamdan Daglu, conhecido por Hemeti, é tido como o homem forte do regime de transição. Daglu comandou a tropa que reprimiu os protestos em frente ao quartel-general militar. Durante a guerra do Darfur, liderou as milícias Janjaweed, que combateram brutalmente os rebeldes. Os manifestantes temem que ele possa vir a ser o novo governante do país.
Foto: Reuters/M.N. Abdallah
O Golfo preocupado
Políticos de outros países árabes também olham com nervosismo para o Sudão. Por exemplo, Mohamed bin Zayad al-Nahyan, o Príncipe Herdeiro dos Emirados Árabes Unidos. Tal como a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos temem que o protesto possa ser um exemplo de uma revolução popular bem-sucedida na região, pondo em questão governos autoritários. Ambos os países apoiam os militares sudaneses.
Foto: picture-alliance/AP Photo/Ministry of Presidential Affairs/M. Al Hammadi
Os vizinhos a norte
Também no Cairo se olha com preocupação para Cartum. O Governo do Presidente Abdel-Fattah al-Sisi receia que a Irmandade Muçulmana possa ganhar influência no Sudão - precisamente o grupo contra o qual o Governo egípcio está a agir com todas as suas forças no seu próprio país. Se a Irmandade Muçulmana se estabelecesse no Sudão, poderia, a partir daí, voltar a exercer uma forte influência no Egito.
Foto: picture-alliance/Photoshot/MENA
Protestos sem fim à vista
No Sudão prosseguem os protestos. No dia 14 de junho, Sadiq al-Mahdi, uma das principais figuras da oposição do país durante décadas, exigiu uma investigação da evacuação violenta do campo de protesto. É algo que não pode agradar aos militares. As tensões poderão voltar a agravar-se.