Sudão: por que onda de protestos não abala Omar al-Bashir?
Kersten Knipp
8 de janeiro de 2019
Opositores avaliam que serviços prestados pelo Presidente aos interesses internacionais fazem com que ele se sinta intocável, mesmo diante de manifestações favor da sua saída.
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Dececionante, mas não surpreendente. Assim a oposição classifica a reação dos Estados ocidentais à onda de protestos no Sudão. As manifestações que tiveram início em dezembro, com origem no aumento do preço do pão e do combustível, acabaram por exigir também a renúncia do Presidente Omar al-Bashir, já há três décadas no comando do país.
Mohamed Hassan, do Partido do Congresso Sudanês na oposição, afirma que o posicionamento favorável do Governo sudanês no combate à emigração clandestina e ao terrorismo desvia a atenção internacional de seus atos de repressão.
"Já esperávamos ter pouco apoio para as manifestações, pois a política internacional rege-se por interesses. O Governo sudanês sabe servir esses interesses. Sobretudo no âmbito do combate ocidental à emigração clandestina de África, que Cartum tenta impedir. Além disso o Governo empenha-se na luta contra o terrorismo. Por isso os europeus estão na disposição de tolerar a repressão, a má gestão e a corrupção no Sudão", declarou.
Diferentes interesses em jogo
Além de contar com o silêncio dos Estados ocidentais, o Presidente Omar al-Bashir tem o apoio dos governos da região. Muitos dos soldados que combatem no Iémen na coligação militar liderada pela Arábia Saudita são sudaneses. O Egito está interessado na estabilidade no Sudão, sobretudo para impedir a passagem de armas para a Líbia. Para Mohamed Hassan, há ainda outros interesses vindos do exterior.
"Os Estados Unidos da América decidiram retirar-se da Síria. Por isso, procuram por mercenários que possam substituir as suas tropas. E não há nenhum regime que venda mercenários tão baratos como o Sudão", afirmou.
Também os países membros da União Europeia cooperam lindamente com Bashir, diz o político. Analistas concordam e apontam como objetivo comum o controle de fronteiras, para impedir os rebeldes do Darfur a venderem os seus préstimos como mercenários aos rebeldes líbios, mas também para cortar a grupos terroristas islamitas a possibilidade de movimentação entre o Sahel e o Corno de África. Perante este cenário, o Presidente sabe que nada tem a temer dos protestos dos seus cidadãos. Os serviços que presta aos interesses internacionais são o seu seguro político.
Regime opressorO balanço político do Governo de Omar al-Bashir é sombrio. O Presidente é procurado com mandado de captura pelo Tribunal Penal Internacional (TPI) por genocídio e crimes de guerra. Além disso, Cartum não conseguiu ainda resolver os conflitos com grupos rebeldes no Darfur e nas montanhas Nuba. Organizações dos direitos humanos criticam o Governo pela violação de direitos fundamentais.
Sudão: por que onda de protestos não abala Omar al-Bashir?
Desde meados de dezembro, quando os protestos começaram, mais de 800 pessoas foram detidas. A última manifestação, convocada pela oposição, foi no domingo (06.01.). Os opositores justificaram as ações apontando para o isolamento político e económico do Presidente e para a perda de confiança da população no chefe de Estado.
Os protestos continuaram não obstante a violência até que Bashir anuiu a nomear uma comissão de inquéritos liderada sob tutela do Ministério da Justiça. Informações oficiais do Governo confirmam 19 mortos na sequência dos confrontos. Grupos internacionais de defesa dos direitos humanos falam em mais mortes. Segundo a Amnistia Internacional, seriam pelo menos 37 pessoas.
Os chefes de Estado há mais tempo no poder
São presidentes, príncipes, reis ou sultões, de África, da Ásia ou da Europa. Estes são os dez chefes de Estado há mais tempo no poder.
Foto: Jack Taylor/Getty Images
Do golpe de Estado até hoje - Teodoro Obiang Nguema
Teodoro Obiang Nguema Mbasogo assumiu a Presidência da Guiné Equatorial em 1979, ainda antes de José Eduardo dos Santos. Teodoro Obiang Nguema derrubou o seu tio do poder: Francisco Macías Nguema foi executado em setembro de 1979. A Guiné Equatorial é um dos países mais ricos de África devido às receitas do petróleo e do gás, mas a maioria dos cidadãos não beneficia dessa riqueza.
Foto: DW/R. Graça
O Presidente que adora luxo - Paul Biya
Paul Biya é chefe de Estado dos Camarões desde novembro de 1982. Muitos dos camaroneses que falam inglês sentem-se excluídos pelo francófono Biya. E o Presidente também tem sido alvo de críticas pelas despesas que faz. Durante as férias, terá pago alegadamente 25 mil euros por dia pelo aluguer de uma vivenda. Na foto, está acompanhado da mulher Chantal Biya.
Foto: Reuters
Mudou a Constituição para viabilizar a reeleição - Yoweri Museveni
Yoweri Museveni já foi confirmado seis vezes como Presidente do Uganda. Para poder concorrer às eleições de 2021, Museveni mudou a Constituição e retirou o limite de idade de 75 anos. Venceu o pleito com 58,6% dos votos, reafirmando-se como um dos líderes autoritários mais antigos do mundo. O candidato da oposição, Bobi Wine, alegou fraude generalizada na votação e rejeitou os resultados oficiais.
Foto: Getty Images/AFP/I. Kasamani
"O Leão de Eswatini" - Mswati III
Mswati III é o último governante absolutista de África. Desde 1986, dirige o reino de Eswatini, a antiga Suazilândia. Acredita-se que tem 210 irmãos; o seu pai Sobhuza II teve 70 mulheres. A tradição da poligamia continua no seu reinado: até 2020, Mswati III teve 15 esposas. O seu estilo de vida luxuoso causou protestos no país, mas a polícia costuma reprimir as manifestações no reino.
Foto: Getty Images/AFP/J. Jackson
O sultão acima de tudo - Haji Hassanal Bolkiah
Há quase cinco décadas que o sultão Haji Hassanal Bolkiah é chefe de Estado e Governo e ministro dos Negócios Estrangeiros, do Comércio, das Finanças e da Defesa do Brunei. Há mais de 600 anos que a política do país é dirigida por sultões. Hassanal Bolkiah, de 74 anos, é um dos últimos manarcas absolutos no mundo.
Foto: Imago/Xinhua/J. Wong
Monarca bilionário - Hans-Adam II
Desde 1989, Hans-Adam II (esq.) é chefe de Estado do Liechtenstein, um pequeno principado situado entre a Áustria e a Suiça. Em 2004, nomeou o filho Aloísio (dir.) como seu representante, embora continue a chefiar o país. Hans-Adam II é dono do grupo bancário LGT. Com uma fortuna pessoal estimada em mais de 3 mil milhões de euros é considerado o soberano europeu mais rico.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Nieboer
De pastor a parceiro do Ocidente - Idriss Déby
Idriss Déby (à esq.) foi Presidente do Chade de 1990 a 2021. Filho de pastores, Déby formou-se em França como piloto de combate. Apesar do seu autoritarismo, Déby foi um parceiro do Ocidente na luta contra o extremismo islâmico (na foto com o Presidente francês Macron). Em abril de 2021, um apenas dia após após a confirmação da sua sexta vitória eleitoral, Déby foi morto num combate com rebeldes.
Foto: Eliot Blondet/abaca/picture alliance
Procurado por genocídio - Omar al-Bashir
Omar al-Bashir foi Presidente do Sudão entre 1993 e 2019. Chegou ao poder em 1989 depois de um golpe de Estado sangrento. O Tribunal Penal Internacional (TPI) emitiu em 2009 um mandado de captura contra al-Bashir por alegada implicação em crimes de genocídio e de guerra no Darfur. Em 2019, foi deposto e preso após uma onda de protestos no país.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
O adeus - José Eduardo dos Santos
José Eduardo dos Santos foi, durante 38 anos (de 1979 a 2017), chefe de Estado de Angola. Mas não se recandidatou nas eleições de 2017. Apesar do boom económico durante o seu mandato, grande parte da população continua a viver na pobreza. José Eduardo dos Santos tem sido frequentemente acusado de corrupção e de desvio das receitas da venda do petróleo. A sua família é uma das mais ricas de África.
Foto: picture-alliance/dpa/P.Novais
Fã de si próprio - Robert Mugabe
Robert Mugabe chegou a ser o mais velho chefe de Estado do mundo (com uma idade de 93 anos). O Presidente do Zimbabué esteve quase 30 anos na Presidência. Antes foi o primeiro-ministro. Naquela época, aconteceram vários massacres que vitimaram milhares de pessoas. Também foi criticado por alegada corrupção. Após um levantamento militar, renunciou à Presidência em 2017. Morreu dois anos mais tarde.