Autoridades do Cunene confirmam morte de 50 crianças por desnutrição nos últimos nove meses. Organizações não-governamentais dizem que fome está a matar também noutras províncias do sul do país e pedem medidas urgentes.
Foto de arquivo (2016): População afetada pela seca recebe doações de alimentos no CurocaFoto: DW/A.Vieira
Publicidade
A fome, a seca e a desnutrição assolam as comunidades rurais do sul de Angola desde 2011. E a história repete-se este ano: a época chuvosa começou oficialmente em maio, mas ainda não há chuva no sul.
"A realidade nestas comunidades é extremamente preocupante", diz Domingos Fingo, diretor da Associação Construindo Comunidade (ACC), sediada na província da Huíla.
"As chuvas ainda não começaram a cair, não se consegue vislumbrar a curto prazo melhorias substanciais para a vida das comunidades da região sul de Angola. A tendência é piorar a vida das comunidades", alerta.
E falta quase tudo entre as comunidades rurais de Benguela, Huíla, Cunene e Cuando Cubango, diz o ativista: "Não há água, não há postos médicos, os serviços do registo civil são precários. Há uma série de situações".
Desnutrição mata dezenas de crianças
A seca, a estiagem e a falta de políticas públicas têm provocado danos humanos e animais, dizem as organizações. Na província do Cunene, as autoridades dão conta da morte de mais de 50 crianças vítimas de desnutrição nos últimos nove meses.
Sul de Angola continua a sofrer com a seca e a fome
This browser does not support the audio element.
Domingos Fingo, diretor da Construindo Comunidade, diz que a terra de Mandume não é a única onde menores morrem por desnutrição. Ela também mata na Huíla. "Tudo isso advém da falta de uma agricultura familiar", sublinha.
Recentemente, o vice-Presidente da República, Bornito de Sousa, visitou o Curoca, no Cunene, uma das comunidades assoladas pela seca e fome. José Patrocínio, coordenador da OMUNGA, ONG com sede em Benguela, louva a iniciativa, mas diz que é preciso tomar medidas urgentes: "Uma delas, penso que deve ser uma prioridade do Estado, é a demarcação imediata das áreas comunitárias e das terras comunitárias, bem como o seu respeito e a sua legalização".
Depois de desenvolver atividades nas províncias do Cunene e Cuando Cubango, a OMUNGA constata uma situação cada vez mais preocupante.
O coordenador da ONG diz que, apesar do problema da seca e estiagem resultar do aquecimento global, devia merecer uma especial atenção por parte do Governo no sentido de tomar medidas urgentes que possam acautelar o dilema da fome que assola as populações.
O ativista sublinha que, para além da ação natural, há também determinados projetos agrícolas desenvolvidos por empresários na região que não beneficiam as comunidades locais.
"No Kuroco, algumas comunidades deixaram de ter acesso aos rio por causa do projeto agro industrial. No Cuando Cubango, as populações deixaram de ter os seus meios de sobrevivência: a pesca, a caça, a recolha de frutos", exemplifica.
A Ação para o Desenvolvimento Rural e Ambiente de Angola (ADRA), juntou recentemente em Luanda várias organizações e personalidades para debater as carências destas populações no "XIX Encontro Nacional das Comunidades”. O evento contou com apoio União Europeia, da Ajuda das Igrejas da Noruega (NCA, na sigla em inglês), Pão Para o Mundo (PPM), Grupo África da Suécia (GAS) e do Centro de Estudos Africanos da Universidade Católica de Angola.
Seca em África
Não chove, as colheitas são más, pouco há para comer, há quem consuma ervas para saciar a fome: É a pior seca das últimas décadas. 14 milhões de pessoas estão em perigo. Angola e Moçambique são dois dos países afetados.
Foto: Reuters/T. Negeri
À espera de água
Os jerricans estão vazios, não há água à vista. A Etiópia atravessa a pior seca das últimas três décadas, sem chover durante meses a fio. Segundo as Nações Unidas, mais de dez milhões de pessoas precisam urgentemente de assistência alimentar. Em breve, o número pode duplicar.
Foto: Reuters/T. Negeri
Sem fonte de sustento
Uma grande parte dos etíopes vive da agricultura e da criação de gado. Os animais são, muitas vezes, a fonte de sustento da família. "Vi as últimas gotas de chuva durante o Ramadão", conta um agricultor da região de Afar, no nordeste da Etiópia. O mês de jejum dos muçulmanos terminou em julho. "Desde essa altura, nunca mais choveu. Não há água, não há pasto. O nosso gado morreu".
Foto: Reuters/T. Negeri
Perigo para as crianças
Em 1984, mais de um milhão de pessoas morreu de fome na Etiópia. Pouco mais de três décadas depois, os etíopes voltam a correr perigo, sobretudo as crianças. Segundo o Governo etíope, mais de 400.000 rapazes e raparigas estão gravemente subnutridos e precisam de tratamento médico.
Foto: Reuters/T. Negeri
O El Niño
A colheita também foi magra no Zimbabué. Neste campo perto da capital, Harare, em vez de maçarocas de milho viçosas crescem apenas estes grãos secos. A seca foi agravada pelo El Niño. Noutros locais, o fenómeno meteorológico provocou chuvas fortes e inundações.
Foto: Reuters/P. Bulawayo
No limite
Esta vaca está no limite das suas forças, mal consegue manter-se em pé. Os agricultores de Masvingo, no centro do Zimbabué, tentam movê-la. Em 2015, choveu metade do que havia chovido no ano anterior. Os campos ficaram completamente secos.
Foto: Reuters/P. Bulawayo
Seca em Moçambique
"Lá no nosso bairro já perdi trinta e cinco cabeças", conta um criador de gado do distrito de Moamba, a 80 quilómetros da capital moçambicana, Maputo. Milhares de famílias estão em situação de insegurança alimentar. A seca afeta principalmente o sul do país. O norte e centro têm sido fustigados por chuvas intensas.
Foto: DW/R. da Silva
Ervas para combater a fome
A província do Cunene, no sul de Angola, também tem sido afetada pela seca. À falta de outros alimentos, há populares que comem ervas para saciar a fome: "Muitos morreram, não há comida. Mas, depois, estas ervas causam diarreia", contou um morador do município do Curoca.
Foto: DW/A.Vieira
Rio seco
Seria impossível estar aqui, não fosse a seca. O rio Black Umfolozi, a nordeste da cidade sul-africana de Durban, ficou sem água à superfície. Só cavando os habitantes conseguem obter o líquido vital.
Foto: Reuters/R. Ward
Seca inflaciona os preços
O Malawi também atravessa um período de seca. E isso reflete-se aqui neste mercado perto da capital, Lilongwe. Os preços de produtos básicos como o milho aumentaram bastante, porque a colheita foi má e é necessário importá-los. Muitas vezes, os habitantes mal conseguem pagar os alimentos que precisam para sobreviver.