Falhas na distribuição de alimentos às vítimas do Idai
Arcénio Sebastião (Beira)
16 de maio de 2019
Vereador da cidade da Beira, no centro de Moçambique, denuncia "seleção partidária" na distribuição de alimentos aos afetados pelo ciclone Idai. Programa Mundial de Alimentos e a FRELIMO negam irregularidades.
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O Conselho Autárquico da Beira, a capital da província de Sofala, centro de Moçambique, alega irregularidades no processo de distribuição de alimentos às pessoas afetadas pelo ciclone Idai. A denúncia foi apresentada esta quinta-feira (16.05) pelo vereador institucional José Manuel, da RENAMO (Resistência Nacional Moçambicana), maior partido da oposição, durante uma reunião com os secretários dos bairros daquela urbe.
Os casos terão sido flagrados nos bairros da Munhava e Vaz. Segundo José Manuel, para receber os alimentos, os munícipes são obrigados a apresentar cartões que comprovem que são membros da FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique), o partido no poder.
Denúncia de irregularidades na distribuição de alimentos às vítimas do Idai
Segundo José Manuel, o Programa Mundial de Alimentos (PMA), que lidera o processode distribuição de alimentos, é conivente com a situação. "O PMA está a ser conivente com o Governo da FRELIMO na divisão da comida entre as pessoas no município da Beira", diz.
"Essa comida está a ser usada para fazer política a favor do Governo. Por isso, queremos dizer que o PMA deve deixar de prestar ajuda neste processo aos munícipes da Beira. Há discriminação. A escolha dos munícipes é feita em função da cor partidária", acrescenta.
Residentes reclamam
A DW África ouviu duas residentes que lamentam a situação. "Algumas pessoas estão a receber as ajudas enquanto outras não. Muitas pessoas que constam das listas não estão a receber nada. O ciclone, quando chegou, chegou para todos", afirma Elisa Saize.
Aulina Timbe tem a mesma reclamação. "Quando chegam as listas, os nossos nomes não são chamados e aparecem outros nomes. Não sabemos onde foram inscritas essas pessoas, porque nós que fomos inscritos aqui nunca somos chamados. As pessoas que recebem os alimentos vêm de outras zonas como Manga, Vaz, Inhamuzua e Cerâmica", afirma.
Maurício Burtet, oficial de planificação do PMA, diz que o fornecimento dos alimentos está conforme as listas com os nomes fornecidos pelo Governo através do Instituto Nacional da Ação Social (INAS).
"A assistência do PMA não leva nenhum requisito partidário ou político. Nós fazemos a identificação dos beneficiários com base na coordenação com órgãos do Governo e as distribuições são feitas com base na identificação dos beneficiários, que podem apresentar uma carteira de identidade ou algum cartão de eleitor, porém sem nenhum vínculo partidário", explicou.
Por seu turno, a FRELIMO refuta as acusações alegando que são uma provocação. "A FRELIMO não tem nenhuma ligação com esse problema da distribuição dos alimentos. O que podemos dizer é que talvez se trata de uma provocação, porque nunca saímos à rua para fazer a distribuição de comida", afirmou à DW África Fernando Razão, primeiro secretário distrital do partido.
Desde a passagem do ciclone Idai, mais de vinte mil habitantes são assistidos com produtos alimentares de primeira necessidade na Beira.
No interior do hospital de campanha de Macurungo na Beira
As estruturas do centro de saúde que é referência no atendimento de cerca de 35 mil pessoas na região foram severamente danificadas com a passagem do ciclone Idai. Hospital de campanha já atendeu dois mil pacientes.
Foto: DW/F. Forner
A rotina
O hospital de campanha nos arredores do centro de saúde Macurungo, na Beira, está a funcionar desde 24 de março. "Montamos um centro médico avançado com uma tenda para cirurgia e consultas, além de mais duas tendas para avaliação pós-parto das mães", descreve a médica infectologista Telma Susana Vieira Azevedo, que liderou por dois meses a equipa da Cruz Vermelha em Macurungo.
Foto: DW/F. Forner
Um passeio pelas tendas em Macurungo
Um enfermeiro da equipa da Cruz Vermelha caminha pelas tendas de lona do hospital de campanha gerido em parceria com a ONG Médicos do Mundo. Já foram realizadas mais de duas mil consultas, além de uma média de sete partos diários. Este hospital é referência no atendimento de 35 mil pessoas na região, onde as condições habitacionais ficaram muito debilitadas após a passagem do ciclone Idai.
Foto: DW/F. Forner
No interior do hospital destruído
A noite de 14 de março na Beira foi marcada pelos fortes ventos que arrancaram telhas, chapas e coberturas das casas e edifícios públicos. O hospital de Macurungo sofreu sérios danos estruturais. Mesmo assim, algumas áreas do edifício continuam a ser utilizadas. “Nosso objetivo é conseguir reconstruir o centro de saúde e só depois deixar a Beira”, diz a médica Telma Susana Vieira Azevedo.
Foto: DW/F. Forner
Balanço pós-Idai
Segundo dados do fundo de redução de desastres do Banco Mundial (GFDRR), Moçambique ocupa a terceira posição no ranking de países africanos mais expostos a múltiplos riscos associados às mudanças climáticas, como ciclones periódicos, secas, inundações e epidemias. Esta foto mostra o coração do hospital de campanha montado em um dos bairros que mais carecem de atenção à saúde.
Foto: DW/F. Forner
Os grandes desafios de Beira
Esta é uma foto aérea do hospital de campanha em Macurungo na Beira. Além da reestruturação de hospitais, as cidades afetadas pelo ciclone Idai também encaram os desafios de reconstrução de moradias, escolas e das infraestruturas urbanas. A ONU estima que o país necessite de pelo menos 200 milhões de dólares de ajuda internacional nestes três primeiros meses pós-ciclone.
Foto: DW/F. Forner
O estoque de medicamentos
Além de servirem como consultórios e locais de operação, algumas tendas do hospital de campanha foram construídas para armazenar equipamentos, medicamentos e demais suprimentos médicos. Nesta foto, o médico Luís Canelas opera um dos computadores que realiza exames de ultrassonografia. O hospital de campanha também realiza exames laboratoriais, como exames de sangue e testes de malária.
Foto: DW/F. Forner
Apoio à população
Em momento de descanso, o enfermeiro da Cruz Vermelha de Cabo Verde Mariano Delgado brinca com uma das pacientes no pátio externo. Estima-se que cerca de 400 mil crianças foram afetadas. "Precisamos fazer um trabalho mais ativo de equipas móveis para ir às populações deslocadas", diz Michel Le Pechoux, representante adjunto do UNICEF em Moçambique.
Foto: DW/F. Forner
Pulverização contra a malária
Homens uniformizados com luvas e protetores fazem a pulverização contra a malária em casas nas ruas de Búzi, a 150 km ao sul da Beira. Os casos de malária aumentaram e um mutirão tenta conter a proliferação do mosquito transmissor.
Foto: DW/F. Forner
Cadastro de pacientes
Esta é a tenda de triagem onde os pacientes são recebidos para a marcação de consultas. "Recebemos pacientes com doenças crónicas, hipertensão, doenças cardiovasculares e parasitárias, bem como pacientes que sofrem de desnutrição e portadores do VIH/SIDA", explica a infectologista da Cruz Vermelha portuguesa Telma Susana Vieira Azevedo.
Foto: DW/F. Forner
À espera de consultas
As salas de espera no centro de saúde Macurungo ficam diariamente superlotadas com pacientes que sofrem das mais variadas doenças. O cólera está sob controle, mas os casos de malária estão a ser acima do habitual. "As chuvas fazem com que haja poças d’água que são óptimas para a proliferação dos mosquitos havendo mais vetores para transmitir a doença", diz a infectologista Telma Susana Azevedo.
Foto: DW/F. Forner
Atendimento
Esta é uma das tendas do hospital de campanha Macurungo destinada às consultas médicas e atendimento aos pacientes. Nesta foto, o doutor Miguel e o enfermeiro de Cabo Verde Mariano Delgado dividem o espaço realizando atendimentos e curativos.
Foto: DW/F. Forner
Nos bastidores
Num momento de descanso após o almoço, estes três profissionais de saúde aproveitam a pausa no início da tarde antes de continuar com os atendimentos. Esta sala com macas também serve de refeitório e sala de reuniões. As equipas de médicos, enfermeiros e pessoal de apoio técnico trabalham diariamente sem cessar e se revezam a cada três semanas.