Em Cabo Verde, a semana ficou marcada pelas audições de ex-governantes e gestores da transportadora aérea do país na Comissão Parlamentar de Inquérito que averigua os atos de gestão da TACV entre 1975 e 2017.
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As personalidades ouvidas pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) foram praticamente unânimes: a TACV nunca gozou de boa saúde financeira. A Transportadora Aérea de Cabo Verde tem sido abalada por uma forte de tesouraria, com um passivo acumulado de mais de 100 milhões de euros. No passado mês de Julho, a TACV pôs fim às suas operações domésticas, passando tudo para a Binter Cabo Verde. Em agosto, o grupo Icelandair, da Islândia, assumiu a gestão do negócio internacional da companhia cabo-verdiana.
Os deputados cabo-verdianos querem saber o que passou com a companhia para chegar a este estado. Para isso, criaram a CPI e estão a ouvir ex-governantes e antigos gestores da empresa.
"Cabo Verde não tem recursos para construir um hub aéreo”
Para o antigo primeiro-ministro Gualberto do Rosário, a transferência do serviço de handling para a ASA (a empresa de Aeroportos e Segurança Aérea) foi um duro golpe para a TACV: "A decisão foi muito negativa, porque se a empresa prestava antes o serviço de handling e era uma das principais fontes de receita da companhia, que equilibrava as suas contas, com a transferência deixou de ter esses proveitos e passou a pagá-los”.
Gualberto do Rosário revelou que em 2001, quando deixou o Governo, estava tudo preparado para a privatização da TACV. "Infelizmente, perdemos a oportunidade no final dos anos 2000”.
"A partir daí, percebe-se que há uma mudança de opção, sobretudo porque não se compreendeu que não se constrói um hub aéreo sem a companhia de bandeira, não se constrói um hub aéreo sem uma associação umbilical entre a companhia de bandeira e o aeroporto que vai servir de plataforma e não se constrói um hub aéreo sem conhecimento, sem know how, sem experiência e sem recursos.”, explicou o ex-chefe do Governo.
"Cabo Verde não tem nem conhecimento nem know how, nem experiência nem recursos para construir um hub aéreo”, enfatizou.
A ideia é rejeitada pelo antigo ministro dos Transportes, Manuel Inocêncio Sousa, para quem a privatização não aconteceu, não por falta de vontade, mas devido à situação financeira da empresa. "Houve dificuldades em conseguir fazer a privatização. Houve sempre vontade de privatizar a TACV, que só não foi à falência porque é uma companhia pública”.
Manuel Inocêncio Sousa afirmou que a TACV nunca gozou de boa saúde financeira, "acumulando ao longo dos anos resultados negativos”.
"A situação não era boa, prova disso é que nós não conseguimos interessar parceiros para a privatização da empresa”, explicou.
Uma empresa sem solidez
A ideia foi reforçada esta sexta-feira (02.02) por Sara Lopes, que substituiu Manuel Inocêncio Sousa na pasta dos Transportes: "Uma forma justa, correta e honesta de analisar e retratar a TACV é que ela nunca foi uma empresa sólida e, sobretudo, a partir do momento em que iniciou o processo de internacionalização, passando a ser uma companhia global, nunca teve solidez”.
Rui Santos, coordenador do Gabinete de Privatização entre 2005 e 2009, avançou que, nesse período, entre os concorrentes que se apresentaram para gerir a TACV estiveram a alemã Lufthansa e empresas ligadas à British Airways. "Isso aconteceu há dez anos, mas lembro-me que pelo menos a Lufthansa Consulting estava incluída no lote de concorrentes. Essas empresas, se calhar, pensando que só o seu nome bastaria para ganhar o concurso, não apresentaram as melhores propostas”.
O antigo presidente da TACV João Pereira Silva disse que dirigentes da Binter lhe haviam garantido que não entrariam em Cabo Verde numa situação em que houvesse uma empresa cabo-verdiana do Estado em regime de concorrência.
Na semana passada, o vice-primeiro-ministro Olavo Correia anunciou que a avaliação financeira da Transportadora Aérea de Cabo Verde com vista à sua privatização deverá estar concluída até o próximo mês de junho.
Dessalinização de água com tecnologia europeia em Cabo Verde
Em Cabo Verde, as reservas naturais de água são escassas e a estação chuvosa dura apenas três meses por ano. Governo aposta na dessalinização da água do mar para abastecer a população. Mais de 55% da produção perde-se.
Foto: DW/C. Teixeira
Água fresca para os cabo-verdianos
Em Cabo Verde, a dessalinização garante água fresca para cerca de 80% da população. O país aposta no sistema de osmose inversa para produzir água doce. A Electra, Empresa Pública de Electricidade e Água, é responsável pela produção e distribuição da água dessalinizada nas ilhas de São Vicente, Sal e na Cidade da Praia. Na foto, visão parcial da central dessalinizadora da Electra na capital.
Foto: DW/C. V. Teixeira
Dessalinização por osmose inversa
O processo de dessalinização por osmose inversa é uma moderna tecnologia de purificação da água que consiste em diversas etapas de filtragem. Logo após a captação, a água do mar passa pelos filtros de areia, que têm por finalidade eliminar impurezas e resíduos sólidos maiores. Na foto, os dois grandes cilindros são os filtros de areia de uma das unidades de dessalinização na Cidade da Praia.
Foto: DW/C. V. Teixeira
Várias etapas de filtragem
Depois, a água é novamente filtrada, desta vez por micro filtros. Os dois cilindros azuis que se podem ver na foto possuem uma alta eficiência na remoção de resíduos sólidos minúsculos - como moléculas e partículas. Essas duas pré-filtragens preparam a água para passar pelo processo de osmose inversa.
Foto: DW/C. V. Teixeira
Sob alta pressão
O aparelho azul (na foto) é uma bomba de alta pressão. Aplica uma forte pressão na água do mar, que é distribuída pelos cilindros brancos. No interior, encontram-se membranas semipermeáveis por onde a água é forçada a passar. Neste processo de filtragem, consegue-se a retenção de sais dissolvidos. Obtém-se a água doce e a salmoura - solução com alta concentração de sal - que é devolvida ao mar.
Foto: DW/C. V. Teixeira
Volume do abastecimento
Na Cidade da Praia, funcionam duas unidades dessalinizadoras da Electra, com capacidade para produzir 15.000m3 de água doce por dia. Pelo menos 60% da população da capital recebe a água dessalinizada da Electra. Na foto, uma visão parcial da unidade mais moderna de Santiago, em funcionamento desde 2013. A Electra é reponsável pelo abastecimento de água de mais de metade da população do país.
Foto: DW/C. V. Teixeira
Controlo de qualidade
A água doce produzida é analisada num laboratório onde é feito o controlo de qualidade. De acordo com a Electra, a transferência da água para consumo só é autorizada se apresentar as condições estabelecidas nos protocolos da Organização Mundial da Saúde (OMS). Na foto, a engenheira bioquímica Elisângela Moniz mostra as placas utilizadas para a contagem de coliformes totais e fecais.
Foto: DW/C. V. Teixeira
Moderna tecnologia europeia
Cabo Verde utiliza tecnologias europeias, espanhola e austríaca, para a dessalinização da água do mar. Na foto, o reservatório de água da empresa austríaca Uniha, que tem capacidade para armazenar 1.500 m3 de água. A água dessalinizada não fica parada aqui: é constantemente bombeada para os reservatórios de distribuição existentes ao longo da Cidade da Praia.
Foto: DW/C. V. Teixeira
Grandes perdas
Esses equipamentos são responsáveis por bombear a água para os tanques de distribuição da Cidade da Praia. No entanto, cerca de 55% de toda a produção é perdida durante este processo. As perdas são causadas por fugas de água em tubulações e reservatórios antigos para onde a água é enviada antes de chegar ao consumidor.
Foto: DW/C. V. Teixeira
Desafios e esforços para produzir água
O engenheiro António Pedro Pina, diretor de Planeamento e Controlo da Electra, diz que os maiores desafios da empresa são "garantir a continuidade na produção, estabilidade na distribuição e combater as perdas que, neste momento, estão em cifras proibitivas". Pina defende, no entanto, que "tem sido feito um esforço enorme para garantir a continuidade da distribuição da água" em Cabo Verde.
Foto: DW/C.V. Teixeira
Recurso natural abundante
Terminado o processo de dessalinização, a água com alta concentração de sal, denominada salmoura, é devolvida ao mar. Composto por 10 ilhas, o arquipélago cabo-verdiano encontra-se cercado por uma fonte inesgotável para a produção de água potável. Os cabo-verdianos têm assim o recurso natural abundante para garantir à população o abastecimento de água dessalinizada e limpa, constantemente.
Foto: DW/C. V. Teixeira
Preço da água ainda é alto
A água dessalinizada pela Electra em Santiago abastece os moradores da Cidade da Praia. Na foto, moradores do bairro Castelão, na capital cabo-verdiana, compram água no chafariz público - um dos poucos que ainda restam no país. Cada bidão de cerca de 30 litros de água custa 20 escudos cabo-verdianos (cerca de 0,20 euros). O valor é considerado alto por muitos cabo-verdianos.