Realizaram-se domingo as primeiras cerimónias fúnebres das vítimas do naufrágio de um ferry sobrelotado no lago Vitória. Autoridades tanzanianas atualizaram balanço da tragédia para 224 mortos e 41 sobreviventes.
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Até ao momento, 172 vítimas mortais da tragédia já foram identificadas por familiares. "Sepultámos muitas pessoas da nossa aldeia. Este ferry matou o nosso povo", lamenta Adla Bakari, que perdeu o seu filho no naufrágio. "Se lhes dizemos para não sobrelotarem o ferry, eles não nos ouvem, tal como na quinta-feira, não nos ouviram. Pedimos ao Governo que tome conta de nós", apela.
O primeiro-ministro, Kassim Majaliwa, conduziu este domingo (23.09) os funerais na ilha de Ukara, onde o navio MV Nyerere deveria ter atracado. "O país foi atingido por uma grande tragédia. Temos de nos manter unidos neste período difícil e perceber que os nossos concidadãos perderam pais, irmãos, irmãs, filhos e amigos nesta tragédia. Temos de os consolar, em vez de lhes darmos palavras negativas", apelou.
Buscas continuam
As buscas continuam no local do naufrágio, depois de no sábado (22.09) um engenheiro ter sido resgatado com vida na sala das máquinas da embarcação.
O Presidente da Tanzânia, John Magufuli, declarou quatro dias de luto nacional e ordenou a prisão dos responsáveis pela tragédia, incluindo o capitão do navio, que teria deixado o leme nas mãos de um funcionário sem experiência. O chefe do Governo anunciou que já foram feitas várias detenções.
Tanzânia chora vítimas mortais do naufrágio
Segundo testemunhas, a embarcação transportava mais de 300 passageiros, apesar de a sua capacidade máxima ser para 100 pessoas e 25 toneladas de carga. Já o Ministério dos Transportes fala em 256 passageiros a bordo. O primeiro-ministro afirma que as primeiras investigações apontam para a sobrelotação como uma das causas do acidente.
O MV Nyerere naufragou a cerca de 50 metros do local onde iria atracar, quando as pessoas se precipitaram para a proa do barco para saírem mais depressa da embarcação.
Um dos sobreviventes fala também em excesso de carga. "O ferry deu uma guinada muito acentuada, havia também camiões carregados com mercadorias a bordo, escorregaram, sacos de milho caíram sobre as pessoas e de repente o barco virou", conta.
Zona de naufrágios
A embarcação MV Nyerere pertence à Agência de Serviços Eletrónicos e Eletromecânicos da Tanzânia e naufragou enquanto fazia a ligação entre a península de Ukerewe e a ilha de Ukora, na zona sul do lago Vitória, o maior do continente africano.
No lago Vitória - um importante ponto de atração turística rodeado pelos territórios da Tanzânia e do Quénia - registam-se vários naufrágios todos os anos, sobretudo devido a fortes tempestades e falta de condições de segurança.
Segundo um comunicado da Presidência da Tanzânia, a investigação está agora nas mãos das autoridades de defesa e segurança. O primeiro-ministro já adiantou que será criada uma comissão de inquérito alargada sobre a tragédia.
Lago Tanganica: um grande lago em perigo
Um grupo ambientalista alemão elegeu o Lago Tanganica como "o lago em perigo de 2017". Faz parte dos Grandes Lagos e é partilhado pela Tanzânia, República Democrático da Congo, Burundi e Zâmbia.
Foto: NASA
Lago Tanganica
A Global Nature Fund, uma ONG com sede na Alemanha, nomeou o Lago Tanganica, localizado na África Central, como o "Lago Ameaçado de 2017". Em conjunto com parceiros locais, esta organização pretende alertar para a necessidade da adoção de medidas que levem à preservação deste lago, partilhado por quarto países africanos, nomeadamente, República Democrática do Congo, Tanzânia, Zâmbia e Burundi.
Foto: picture alliance/dpa/C. Frentzen
Poluição – uma das muitas ameaças
Poluição, sobre-exploração e sedimentação são alguns dos problemas que ameaçam a diversidade de espécies neste vasto lago africano. Resíduos industriais e domésticos, provenientes das cidades e aldeias localizadas no litoral, são descarregados nesta água. Também os "ferry" e os pescadores, que utilizam óleo para os geradores e para as luzes de pesca noturna, poluem o lago.
O Lago Tanganica possui 1.470 metros de profundidade, o que faz dele o segundo lago mais profundo do mundo. É também o segundo maior lago de água doce em volume. Só aqui estão aglomerados quase 17% dos recursos de água doce não congelada existentes no planeta. Milhões de pessoas dependem do lago para o seu sustento.
Foto: SeaWiFS Project
Crescimento da população aumenta pressão
O crescimento da população no Burundi, na República Democrática do Congo, na Tanzânia e na Zâmbia tem aumentado a pressão sobre os recursos do Lago Tanganica. Um milhão de pessoas vive na bacia deste reservatório e depende da pesca: cerca de cem mil são pescadores. Quanto maior a população, mais bocas são necessárias alimentar.
Foto: Getty Images/AFP/J. Cendon
Famoso pela biodiversidade
Crocodilos do Nilo, garoupas gigantes, medusas de água doce e enguias são apenas alguns dos exemplos da biodiversidade do Lago Tanganica. No total, possui mais de 1.500 espécies de plantas e animais, das quais 40% não podem ser encontradas em qualquer outra parte da Terra.
Foto: picture-alliance/dpa/G. Fischer
Pesca excessiva
Os recursos naturais do Lago Tanganica estão a ser explorados em demasia. A pesca excessiva no lago levou a uma dramática redução nas capturas. Entre 1995 e 2011, o número de pescadores quadruplicou, enquanto o número total de peixes diminuiu cerca de um quarto. A quantidade de peixe capturada, por ano, por cada pescador individualmente desceu 81% no mesmo período de tempo.
Foto: Brent Stirton/Getty Images for WWF-Canon
Os desafios ambientais
Pius Yanda, professor especialista em alteracões climáticas da Universidade de Dar Es Salaam, na Tanzânia, entende que é importante que se discuta sobre como se deve responder às ameaças à integridade ecológica do lago. "Se as pessoas participarem ativamente no processo de discussão sobre as ameaças ambientais que o lago enfrenta será melhor", afirma.
Foto: Imago
Alterações climáticas
Em 2016, um estudo da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, mostrou que a escassez de pescado no lago não se deve apenas à pesca excessiva, mas também às alterações climáticas. O aumento da temperatura da água, registado desde 1800, está a contribuir também para o declínio das algas, o principal alimento dos peixes.