As autoridades tanzanianas ameçam proibir as igrejas que interferirem na política depois que um pastor acusou o Governo de transformar o país num Estado de partido único.
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Na Tanzânia, o papel das igrejas está a ser questionado pelo Governo. Tudo começou com um sermão de Natal na maior cidade do país, Dar es Salaam. Zachary Kakobe, fundador de uma igreja alternativa, acusou o Governo de cingir o país à regra do partido único, ao restringir o espaço democrático da oposição.
A resposta do Governo não demorou: organizações religiosas que "misturam religião e política" podem ser privadas de registo. E, embora a liberdade de religião esteja consagrada na Constituição, as igrejas e comunidades religiosas só podem funcionar com a permissão do Ministério do Interior. Esse é o aviso do secretário de Estado, Projest Rwegasira.
De acordo com Rwegasira, "é difícil diferenciar entre o que é a política e o que é ser crítico em relação ao Governo". Ele alerta que "quando se começa a utilizar o púlpito para discutir as políticas governamentais, está a misturar-se a política com a religião, o que está fora dos seus deveres".
"Os seus deveres são pregar e ensinar a Bíblia e não interferir nos assuntos políticos. Quando saem do âmbito dos assuntos religiosos, estão a violar as condições de registo das suas instituições", afirma o secretário de Estado.
Tanzânia: Igrejas ameaçadas pelo Governo
Repressão
Apesar de o Presidente tanzaniano, John Magufuli, ser elogiado pela luta contra a corrupção e desperdício de recursos públicos, a oposição reclama que o clima político piorou desde a sua última vitória eleitoral, em 2015. Por exemplo, em junho de 2017, a polícia proibiu todos os protestos e manifestações políticas até nova ordem.
Rebekka Rumpel, do instituto britânico Chatham House, diz que "sempre que o Presidente se sentiu ameaçado nos seus dois anos no cargo, teve uma resposta bastante dura, como a detenção de um rapper que falou negativamente sobre ele nas letras das suas músicas, a acusação de pessoas que o insultaram no WhatsApp ou o encerramento de vários meios de comunicação".
Na base da atuação de John Magufuli estará o medo de o seu partido, o Partido da Revolução, perder o domínio eleitoral, já que nas últimas décadas a influência do movimento diminuiu. Dos esmagadores 80% nas eleições presidenciais de 2005, o partido de Magufuli passou para os 63% em 2010 e para os 58% em 2015.
Rebekka Rumpel explica que esta tendência clara mostra que estão a perder o apoio do povo. "A resposta a isso foi tentar intimidar o Chadema, um partido da oposição, e também atacar os membros da sociedade civil que questionam essa restrição à liberdade – por isso, repito, o que está a acontecer não é um incidente isolado", afirma a analista.
Quando as igrejas não são criticadas
Para o bispo Benson Bagonza, da Igreja Evangélica Luterana da Tanzânia, a política e a religião não são temas fáceis de separar. "Penso que temos políticos ingénuos, que realmente não entendem a demarcação entre política e religião. São coisas que não podem ser facilmente separadas".
O bispo também questiona o facto de a religião, muitas vezes, não ser criticada quando exerce funções que as autoridades deveriam assumir. "Quando as igrejas constroem hospitais, escolas, fornecem água, tratam pacientes, não lhes dizem que se estão a intrometer com a política. Mas quando questionam por que não há remédios nos hospitais, são acusados de intrometer-se com a política", pondera o religioso.
Paraíso natural da Tanzânia em perigo
Selous, na Tanzânia, é a maior reserva natural de África e é Património Mundial da UNESCO há 35 anos, mas está em perigo. O Governo planeia extrair urânio e construir uma barragem. Os ambientalistas fazem soar o alarme.
Foto: WWF Deutschland/Astrid Dill
Natureza pura
A "Reserva de Caça de Selous" é uma das maiores reservas naturais do mundo e a maior em África. São 50.000 quilómetros quadrados de estepe e savana que abrangem várias regiões do sudeste da Tanzânia. A diversidade de animais que aqui vivem é tão grande quanto a reserva em si: hipopótamos, elefantes, girafas, búfalos, leões, crocodilos, chitas, antílopes e mais de 400 espécies de aves.
Foto: WWF Deutschland/Astrid Dill
Passado colonial
A reserva foi criada em 1896 pelo poder colonial alemão. Depois de a administração ser transferida para o Reino Unido, a reserva foi aumentada e batizada de "Selous", em memória de Frederick Selous, um oficial britânico e caçador, que morreu durante a I Guerra Mundial e foi enterrado no parque. Em 1982, a UNESCO declarou a reserva como Património Mundial devido à sua fauna e flora únicas.
Foto: Imago/BE&W
Património em perigo
Mas a UNESCO e várias organizações ambientalistas estão preocupadas. Há três anos que a reserva está na "lista vermelha" dos Patrimónios Mundiais ameaçados, apesar dos protestos do Governo tanzaniano.
Foto: WWF Deutschland/Astrid Dill
Barragem no meio da reserva
O rio Rufiji é um órgão vital da reserva de Selous. O rio serpenteia ao longo de 600 quilómetros e desagua a sul de Dar es Salaam no Oceano Índico. Futuramente, o rio deverá ser usado para produzir energia elétrica, um bem precioso na Tanzânia. O Presidente John Magufuli anunciou recentemente a construção "tão depressa quanto possível" de uma barragem planeada há décadas.
Foto: WWF Deutschland/Michael Poliza
Área enorme submersa
"Seria um duro golpe contra a Natureza", critica a organização ambientalista WWF. De acordo com o projeto, a barragem deverá ter 130 metros de altura e 700 metros de largura. Centenas de quilómetros de quadrados da reserva ficarão debaixo de água numa área superior à das cidades de Bissau, Luanda e Maputo em conjunto.
Foto: WWF Deutschland/Greg Armfield
"Industrialização da Natureza"
A barragem trará inevitavelmente consigo a construção de estradas, áreas industriais e zonas habitacionais para os trabalhadores - no meio da reserva. A WWF teme uma "destruição da natureza intocada e de um dos habitats mais importantes para muitas espécies ameaçadas". A barragem também será motivo de preocupação para o Governo alemão.
Foto: WWF Deutschland/Michael Poliza
18 milhões de euros da Alemanha
Um dia antes do anúncio de Magufuli sobre a construção da barragem no meio da reserva de Selous, o Governo da Tanzânia e o embaixador alemão no país assinaram um "Programa para a Conservação e Desenvolvimento de Selous". O objetivo: Proteger a reserva e mantê-la como Património Mundial da UNESCO. A Alemanha disponibilizou 18 milhões de euros para o projeto.
Foto: Getty Images/MCT/A. Anderson
Extração de urânio no sul
Alvos de críticas são também as concessões da Governo tanzaniano para pesquisar as reservas de petróleo e gás, além de uma mina de urânio na zona sul de Selous. O material radioativo deverá ser separado da rocha a montante do rio Rufiji. Já começaram as primeiras perfurações. A WWF alerta que água contaminada poderá penetrar no solo e misturar-se nos lençóis de água subterrâneos.
Foto: imago/CHROMORANGE
Caça furtiva sob controlo?
O Governo tanzaniano não quer saber das críticas. Aponta, em vez disso, para os sucessos na luta contra a caça furtiva. De facto, a população de elefantes cresceu em Selous. Em tempos, já foram mais de 100 mil, mas, entre 1982 e 2014, o número baixou cerca de 90%.
A caça comercial é autorizada em Selous e é uma fonte de receitas para a reserva e muitos dos 1,2 milhões de habitantes que, tal como estas crianças, vivem na área protegida. Ainda assim, esta reserva atrai bastante menos turistas do que o Parque Nacional de Serengeti, apesar de ser três vezes maior.