Templos fechados em Angola: IURD reza em quintais ou online
Borralho Ndomba
24 de abril de 2023
Desde o fecho dos templos da IURD em Angola, em 2019, alguns fiéis transformaram os seus quintais em espaços de oração. Outros acompanham as missas em direto nas redes sociais. A reabertura só depende das autoridades.
Foto: Borralho Ndomba/DW
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Em vários pontos país, salões de festas e quintais de fiéis são espaços alternativos para os cultos dos membros da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) que apoiam a liderança do bispo angolano Alberto Segunda.
Os templos da IURD que continuam abertos são os que terão sido tomados à força pelos dissidentes liderados pelo outro bispo angolano, Valente Bezerra, que cortou laços com a direção de Edir Macedo.
"Tem sido constrangedor"
A DW esteve recentemente na casa de oração do Maculusso, onde os fiéis aguardam com expectativa o regresso aos templos. A fiel Celina Ventura diz que a situação é difícil, mas o povo da IURD resistiu.
"O importante para nós é buscar Deus. Mesmo que digam que hoje vamos orar de baixo de uma árvore, vamos porque o nosso objetivo é justamente esse", sublinha. Celina Ventura confessa que "tem sido constrangedor ter que orar em salões de festas e às vezes em quintais que muitas vezes não têm condições."
Os fiéis que antes se congregavam na Catedral do Maculusso, em Luanda, a sede da IURD em Angola, assistem agora às pregações neste salão de festas que alberga cerca de 300 pessoas. Por não ter a dimensão da catedral com a capacidade de 1500 lugares, a direção é forçada a realizar seis cultos a cada domingo.
Em salões de festas ou quintais, a IURD continua a organizar cultos em espaços alternativos Foto: Borralho Ndomba/DW
O obreiro Hélder Jorge está satisfeito com o fim do conflito na Igreja Universal do Reino de Deus. O diácono apela às autoridades para que se proceda à restituição dos templos aos fiéis e "que se cumpra a decisão judicial".
"Aqui no Maculusso, por exemplo, é um lugar extremamente apertado para a quantidade de pessoas que temos. Temos de ter três a quatro cultos no mesmo dia para suportar a demanda e noutros lugares está a se cultuar em quintais sem teto, ao sol. Isso é extremamente constrangedor", lamenta.
Reabertura para breve?
Mas o que falta para a reabertura dos templos? Em entrevista à DW, o líder espiritual da IURD em Angola, Alberto Segunda, respondeu que está para breve, embora dependa de questões administrativas do Governo.
"Deve haver um pronunciamento administrativo já que é um caso mediático, todo o mundo sabe do caso IURD, então, não se trata só de abrir os templos. Trata-se também de um pronunciamento de quem de direito a respeito da conclusão deste processo", argumenta o bispo.
"Não somos nós que devemos abrir os templos, mas sim os próprios oficiais de justiça que devem fazer a execução da sentença", insiste Alberto Segunda, acrescentando que o processo é irreversível porque a sentença é de caráter obrigatório.
Bispo Alberto Segunda: "Deve haver um pronunciamento administrativo"Foto: Borralho Ndomba/DW
Fase de reconciliação
A igreja está em fase de reconciliação entre os membros desavindos no âmbito do conflito. Na casa de oração da IURD no Maculusso, a DW constatou o regresso de alguns membros que apoiaram a causa dos reformistas.
"Às vezes as pessoas pensam que ainda há conflito, que ainda há desavença, isso já é um caso ultrapassado. A IURD é uma só, não terá duas. O que vai acontecer é que, uma vez a igreja reabrir, todos os nossos fiéis estarão juntos", diz o bispo.
Desde a publicação do acórdão do tribunal, as autoridades e a liderança de Alberto Segunda, que não é reconhecida pelo Instituto Nacional de Assuntos Religiosos (INAR), estão cada vez mais próximos.
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Fim da "fogueira santa" e da vasectomia
O líder espiritual anunciou também o fim da "fogueira santa", uma ação vista por críticos como uma forma de arrecadar dinheiro.
A vasectomia também não terá espaço na Igreja Universal em Angola. "A questão da vasectomia também não é doutrina. Nunca fez parte da doutrina da Igreja Universal, por isso nem todos os pastores são vasectomisados", lembra o bispo.
Por outro lado, a ligação litúrgica com a IURD Brasil vai continuar, esclarece Alberto Segunda: "As pessoas não devem querer que eu mude a minha forma de orar, a minha forma de ler a Bíblia e a minha forma de interpretar a palavra de Deus."
A DW procurou ouvir, sem sucesso, o Instituto para os Assuntos Religiosos (INAR).
A DW contactou ainda a assessoria de comunicação do bispo Valente Bezerra Luís, que lidera os reformistas da IURD, na tentativa de obter uma entrevista em vídeo ou um posicionamento acerca do tema, mas a mesma declarou que o bispo não estava disponível para tal. A assessoria, porém, enviou uma nota enfatizando que a IURD em Angola é dirigida pelo bispo Bezerra.
No texto, a assessoria argumenta que, aquando do processo-crime que decorreu na 4ª Secção dos Crimes Comuns da Comarca de Luanda, tal órgão judicial não se pronunciou quanto à direção da igreja porque isto não foi tratado naquela instância. "A Sala dos Crimes Comuns não tem competência para dirimir um conflito de natureza religiosa".
Também escreve que a legalização de uma igreja é de competência do INAR. Segundo a nota, "em declaração de idoneidade, de 27 de maio de 2022", o INAR teria declarado "que o representante legal da Igreja Universal do Reino de Deus é o bispo Valente Bezerra Luís".
Notícia atualizada às 11h05 de 27.04.2023.
Angola: 16 polémicas que marcaram a governação de João Lourenço
Com o fim do mandato de cinco anos à espreita, passamos em revista algumas das polémicas que têm marcado a governação do Presidente João Lourenço, da corrupção ao desemprego, com centenas de exonerações pelo caminho.
Foto: picture-alliance/dpa/AP Images/J.-F. Badias
"Operação Caranguejo"
Nesta operação, a justiça apreendeu milhões de dólares, euros e kwanzas na posse de oficiais da Casa de Segurança do PR, suspeitos de peculato, retenção de moeda e associação criminosa. Mais de 10 oficiais, incluindo o ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente, Pedro Sebastião, foram exonerados. Pedro Lussaty, chefe das finanças da banda musical da Presidência, foi detido.
Foto: DW/B. Ndomba
Viagem polémica ao Dubai
Viagem privada de João Lourenço, em março de 2021, ao Dubai suscitou polémica. As opiniões dividiram-se, mas a visita foi vista por alguns cidadãos em Angola como oportunidade de JLo acertar as contas com o seu antecessor, José Eduardo dos Santos, e uma possível negociação com a empresária Isabel dos Santos. No início do mandato, Lourenço acusou o antecessor de deixar os cofres do Estado vazios.
Foto: Imaginechina/Tuchong/imago images
Investigação Pangea-Risk
Um relatório da consultora Pangea-Risk associa João Lourenço, a mulher, Ana Dias Lourenço, e um círculo próximo a alegadas práticas de fraude, corrupção e peculato, em violação de leis e regulamentos dos EUA. Menciona subornos que teriam sido pagos pela Odebrecht a empresas ligadas ao Presidente de Angola. A construtora brasileira desmentiu o relatório e negou alegados pagamentos indevidos.
Caso Edeltrudes Costa
Segundo uma reportagem da TVI, o "braço direito" e chefe de gabinete de João Lourenço terá sido favorecido pelo Governo em contratos públicos com a sua empresa de consultoria EMFC. O negócio de prestação de serviços terá valido a Edeltrudes Costa vários milhões de euros. A seguir à denúncia, manifestantes saíram à rua pedindo a sua demissão. PGR estaria ainda a "apurar dados para investigar".
Foto: Xinhua/Imago Images
Filha na administração da BODIVA
Cristina Dias Lourenço, filha de João Lourenço, foi indigitada em 2020 pela ministra das Finanças para o cargo público de administradora executiva da Bolsa de Dívida e Valores de Angola (BODIVA). A nomeação foi criticada pela sociedade civil, havendo quem falasse em nepotismo e tráfico de influência que manchavam, assim, os princípios da boa governação e transparência propagados pelo Governo.
Foto: picture-alliance/W. Ying
Nomeação de Manuel da Silva "Manico"
Manuel da Silva Pereira "Manico" foi empossado como presidente da Comissão Nacional Eleitoral em fevereiro de 2020, entre muitos protestos da oposição e da sociedade civil que o acusam de "falta de idoneidade moral e legal" ao cargo e falam num concurso pouco transparente. A tomada de posse foi aprovada apenas pelo MPLA, sem os partidos da oposição. O jurista estaria arrolado em caos de corrupção.
Foto: DW
Caso Manuel Vicente | "Operação Fizz"
Conhecido como "Operação Fizz", assenta na acusação de que o ex-vice-Presidente, Manuel Vicente, corrompeu o ex-procurador português Orlando Figueira com o pagamento de 760 mil euros para que arquivasse dois inquéritos em que estava a ser investigado. Acusado dos crimes de corrupção ativa e branqueamento de capitais, tem estado protegido pela imunidade dada a antigos governantes por cinco anos.
Foto: Getty Images
Caso IURD Angola
O conflito interno na IURD Angola começa quando um grupo de dissidentes angolanos decide afastar-se da direção brasileira da igreja com alegações de crimes como evasão de divisas e racismo. Na justiça angolana tramitam vários processos judiciais e missionários brasileiros foram deportados do país. Em maio de 2021, a direção da IURD anunciou nova liderança apenas composta por cidadãos angolanos.
Foto: DW/J.Beck
Lixo em Luanda
O problema do lixo na capital angolana não é novo e parece não ter fim à vista. No período das chuvas, a situação agrava-se colocando em "guerra aberta" moradores descontentes e a governadora Joana Lina, acusada de má gestão. João Lourenço criou uma comissão multissectorial para apoiar o Governo de Luanda a resolver os problemas inerentes à acumulação, recolha e tratamento do lixo.
Foto: Manuel Luamba/DW
Cafunfo e o silêncio do Presidente
Um "massacre" na vila de Cafunfo, na Lunda Norte, chocou o país, a 30 de janeiro de 2021. Violentos confrontos entre a polícia e manifestantes resultaram em dezenas de feridos e mortes. Com a região debaixo de fogo, o incidente mereceu atenção internacional enquanto João Lourenço se remetia ao silêncio - que não passou despercebido. O PR falou pela primeira vez sobre o caso a 2 de março.
Foto: Borralho Ndomba/DW
Protestos e repressão policial
Um pouco por todas as províncias, os protestos têm pintado as ruas do país com cartazes e palavras de ordem. Muitos ficaram marcados por forte repressão das forças de segurança e terminaram em detenções, feridos e até mortes como foi o caso do jovem Inocêncio de Matos, que perdeu a vida na sequência de ferimentos graves durante protestos na capital em novembro de 2020, ou do médico Sílvio Dala.
Foto: DW/Borralho Ndomba
Desculpas públicas pelo 27 de Maio
Volvidas mais de quatro décadas do massacre de 27 de Maio de 1977, Luanda quebrou o silêncio. João Lourenço reconheceu que a resposta do Estado ao que considerou ser uma tentativa de golpe foi desproporcional e vitimou inclusive inocentes. Pediu desculpas públicas às vítimas e aos familiares e encorajou outros atores que participaram nos conflitos políticos a terem o mesmo procedimento.
Foto: Borralho Ndomba/DW
Adiamento das autárquicas
Na primeira reunião do Conselho da República depois das eleições de 2017, João Lourenço levou a proposta aos conselheiros: realizar as primeiras eleições autárquicas do país em 2020. Mas tal não aconteceu e não existe, até então, previsão de uma data. Os motivos alegados vão desde a Covid-19 à falta de conclusão do Pacote Legislativo Autárquico. Analistas falam em falta de vontade política.
Foto: António Domingos/DW
Desemprego
A criação de 500 mil postos de trabalho foi uma das promessas eleitorais de JLo em 2017 e os angolanos não se esquecem disso. Apesar da aprovação, em abril de 2019, do Plano de Ação para Promoção da Empregabilidade, com um fundo de 58 milhões de euros, os números do desemprego no país geram descontentamento no povo que sai às ruas para exigir mais oportunidades e melhores condições de vida.
Foto: DW/M. Luamba
Envolvimento no caso "Dívidas Ocultas"
O Presidente viu o seu nome associado ao escândalo das "Dívidas Ocultas" de Moçambique pela EXX Africa. A consultora denunciou a alegada ligação entre a empresa Privinvest e o Governo de Angola quando João Lourenço era ministro da Defesa. O Ministério da Defesa de Angola terá feito um contrato de 495 milhões de euros para comprar barcos e capacidade de construção marítima à Privinvest.
Foto: Privinvest
"Exonerador implacável"
Na sua "cruzada contra a corrupção", João Lourenço ficou conhecido como o "exonerador implacável". Logo no primeiro de cinco anos de mandato, 2017, afastou governantes, chefias militares, gestores de empresas públicas e antigas figuras associadas ao anterior regime de José Eduardo dos Santos. Isabel dos Santos e José Filomeno dos Santos, filhos do antigo Presidente, foram dois dos muitos visados.