Tensão na Ucrânia: "Pouca gente acredita na invasão russa"
16 de fevereiro de 2022Discursando na Casa Branca, o Presidente dos EUA, Joe Biden, disse na última madrugada que ainda há "margem para a diplomacia para impedir a escalada" militar russa na Ucrânia, acrescentando que a Casa Branca apresentou "ideias concretas" para estabelecer "um ambiente seguro" na Europa.
Biden avisou que uma invasão da Ucrânia continua a ser uma forte possibilidade. O chefe de Estado referiu ainda que o Ministério da Defesa russo disse que algumas unidades militares estavam a abandonar as fronteiras com a Ucrânia, mas sem "provas consistentes".
"O Ministério da Defesa russo relatou que algumas unidades militares estão a abandonar algumas das suas posições na Ucrânia. Isso será um bom sinal. Ainda não o verificamos de forma consistente, ainda não houve essa prova consistente. A nossa embaixada [norte-americana] indica que ainda se mantêm em posições ameaçadoras", alertou.
Contactado telefonicamente pela DW, a partir de Kiev, capital da Ucrânia, Demar dos Santos diz que nas ruas as pessoas não acreditam num eventual ataque russo. O guineense, que tirou o mestrado em Economia na Ucrânia, onde vive há dez anos, diz que não há reforço de segurança nas ruas da capital e a vida pública continua a decorrer com normalidade.
DW África: Como descreve o ambiente em Kiev ?
Demar dos Santos (DS): Pelo que eu tenho reparado aqui na Ucrânia, muito pouca gente acredita que haverá uma intervenção da Rússia. Estamos tranquilos, a vida continua normal, as pessoas trabalham normalmente é não há nenhum movimento de pânico, pelos menos aqui em Kiev.
DW África: E como descreve o sentimento das pessoas nas ruas da capital ucraniana?
DS: Nota-se que as pessoas estão apreensivas. Todo mundo fala da situação nas conversas em lugares públicos. O que é normal quando acontecem ameaças do género.
DW África: As autoridades ucranianas reforçaram medidas de segurança nas ruas de Kiev?
DS: Por agora ainda não. Pelo menos as autoridades ucranianas disseram que não há motivo de alarme, não há motivos que justifiquem o reforço de segurança nas ruas e não há nenhuma situação de alarmismo em Kiev. Acho que é o que tem acontecido em todo o território nacional.
DW África: E como é que vocês estrangeiros acompanham o desenrolar da situação?
DS: Há realmente algum medo. Conheço até uma guineense, que está a estudar aqui em Kiev, mas teve de comprar um bilhete e viajou anteontem para Portugal. Ela disse que vai ficar lá algum tempo até situação ficar mais clara e calma. É o caso único que conheço. De resto, todas as pessoas que eu conheço dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) que estão aqui, ninguém viajou. Estamos a viver a vida normal.
DW África: O que acha desta tensão gerada pelas ameaças de um possível ataque da Rússia contra a Ucrânia?
DS: Acho que parece mais uma chantagem da Rússia para forçar a Ucrânia a resolver a questão do Acordos de Minsk, que assinaram em 2015, permitindo o cessar-fogo. Ainda há um desentendimento entre a Ucrânia e a Rússia sobre o cumprimento dos acordos. Acho que a tensão não tem nada a ver com o interesse da Ucrânia em integrar a União Europeia (UE) ou a NATO, porque mesmo a NATO, bem como a UE já disseram que a Ucrânia precisa de implementar várias reformas para fazer partes destas organizações. Mas para além disso, há muitos países que são membros da NATO, que têm fronteiras com a Rússia, mas não são pressionados pela Rússia como está a fazer com a Ucrânia. Então, não faz sentido essa pressão toda sobre para impedir a Ucrânia de ser membro da NATO ou da UE.
DW África: Mas os ucranianos estão a apoiar os posicionamentos das autoridades do país?
DS: Segundo a última pesquisa feita, mais de 70% dos ucranianos querem viver num país da União Europeia e fazer parte da NATO. Por isso, o Presidente Volodymyr Zelenskyj tem apoio da população. E, pelo que tenho assistido, os ucranianos estão dispostos a defender o seu país em caso de qualquer ataque. Mas é bom esclarecer mais uma vez que aqui, muito pouca gente acredita num eventual ataque da Rússia.