Terrorismo gera crise na produção de caju em Cabo Delgado
Delfim Anacleto
8 de julho de 2021
O terrorismo está a afetar a produção, o processamento e a exportação da cultura do caju em Cabo Delgado, no norte de Moçambique. Produtores apontam roubos nos cajuais como outro grande entrave à produção da castanha.
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A província de Cabo Delgado é a segunda maior produtora de castanha de caju em Moçambique. Mas o abandono de alguns produtores nos distritos do norte devido ao terrorismo pode prejudicar esta posição, uma vez que já está a ter um impacto negativo na produção, processamento e exportação da cultura.
"Processávamos cerca de três mil toneladas e a maior quantidade da castanha de caju vinha do norte de Cabo Delgado, dos distritos de Mueda, Nangade. Agora, por causa dos homens armados, fica difícil comprar castanha naquela zona. Já não recebemos castanhas daqueles distritos”, contou à DW África Francisco Bihale. representante da Korosho, uma empresa que exporta castanha para a Ásia e para a Europa.
O governo da província reconheceu os efeitos adversos do terrorismo em Cabo Delgado na balança nacional da produção da castanha de caju, que durante a campanha 2020/2021 foi de 145 mil toneladas.
Agarra que é ladrão
"Da castanha total comercializada na campanha passada, a província de Cabo Delgado, a segunda maior produtora do país, contribuiu com cerca de 23 mil toneladas, quantidades que, se não fosse o impacto adverso do terrorismo, que dispersou muitos produtores e retraiu os potenciais compradores, acreditamos que teria sido superada”, disse o secretário de Estado em Cabo Delgado, António Supeia.
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O roubo de castanha nos cajuais é outra grande preocupação dos produtores em Cabo Delgado. Estevão António é um dos produtores que exigem que sejam tomadas medidas duras contra os ladrões para desencorajar a prática.
"Veem, sobem e abanam os cajueiros durante a noite. Outros veem de dia e, quando se apercebem que os donos não estão, apanham a castanha”, disse António, acrescentando que agarrar o ladrão também serve de pouco, porque praticamente não são punidos pela lei.
Combate às pragas
Recentemente, arrancou uma campanha de tratamento químico dos cajueiros para eliminar pragas que comprometem a rentabilidade desta cultura. Deverão ser pulverizados cerca de oito milhões de cajueiros, de um total de 20 milhões de plantas existentes no país.
Nos próximos anos, o Governo moçambicano vai deixar de subsidiar a pulverização, por considerar a atividade economicamente insustentável. Mas já tem uma solução: envolver o setor privado no negócio e cortar do seu orçamento esta rubrica, explica o secretário de Estado em Cabo Delgado. "Apelamos aos produtores e distribuidores destes produtos para que se preparem para o efeito”, disse Supeia.
Sumos, bolachas e até "bifes" para diversificar rendimento do caju
O caju é a principal fonte de rendimento dos produtores guineenses. A fim de estimular a economia, os produtores de Ingoré uniram-se na cooperativa Buwondena, onde produzem sumo, bolachas e até "bife" de caju.
Foto: Gilberto Fontes
O fruto da economia
Sendo um dos símbolos da Guiné-Bissau, o caju é a principal fonte de receita dos camponeses. A castanha de caju representa cerca de 90% das exportações do país. Este ano, foram exportadas 200 toneladas de castanha de caju, um encaixe de mais de 250 mil euros. A Índia é o principal comprador. O caju poderá trazer ainda mais riqueza ao país, se houver maior aposta no processamento local do produto.
Foto: Gilberto Fontes
Aposta no processamento
Em Ingoré, no norte da Guiné-Bissau, produtores de caju uniram-se na cooperativa Buwondena - juntamos, em dialeto local balanta - para apostar no processamento do caju. Antes, aproveitava-se apenas a castanha, desperdiçando o chamado pedúnculo, que representa cerca de 80% do fruto. Na cooperativa produzem-se agora vários produtos derivados do caju.
Foto: Gilberto Fontes
“Bife” de caju
Depois de devidamente preparado, o pedúnculo, que é a parte mais fibrosa do caju, pode ser cozinhado com cebola, alho e vários temperos. O resultado final é o chamado “bife” de caju.
A partir das fibras, produz-se também chá, mel, geleia, bolacha, entre outros. Ao desenvolverem novos produtos, os produtores diversificam a dieta e aumentam os seus rendimentos.
Foto: Gilberto Fontes
Néctar de caju
Depois de prensadas as fibras do caju, obtém-se um suco que é filtrado várias vezes, a fim de se produzir néctar e sumo. Com 50% desse suco e 50% de água com açúcar diluído, obtem-se o néctar de caju. Este ano, a cooperativa Buwondena produziu quase 400 litros desta bebida.
Foto: Gilberto Fontes
Sumo de caju
O sumo resulta da pasteurização do suco que foi filtrado do fruto, sem qualquer adicionante. Cada garrafa destas de 33cl de sumo de caju custa quase 0.40€. Ou seja, um litro de sumo pode render até 1.20€. O que é bem mais rentável que vinho de caju, produzido vulgarmente na Guiné-Bissau, que custa apenas 0.15€ o litro. Em 2016, foram produzidos na cooperativa quase 600 litros de sumo de caju.
Foto: Gilberto Fontes
Mel de caju
Clode N'dafa é um dos principais especialistas de transformação de fruta da cooperativa. Sabe de cor todas as receitas da cooperativa e só ele faz alguns produtos, como o mel. Mas devido à falta de recipientes, este produziu-se pouco mel de caju. Desde que se começou a dedicar ao processamento de fruta, Clode N'dafa conseguiu aumentar os seus rendimentos e melhorar a vida da sua família.
Foto: Gilberto Fontes
Castanha de caju
Este continua a ser o produto mais vendido pela cooperativa. O processamento passa por várias etapas: seleção das melhores castanhas, que depois vão a cozer, passam à secagem, ao corte e vão à estufa. As castanhas partidas são aproveitadas para a produção de bolacha de caju. Este ano, a cooperativa conseguiu fixar preço da castanha de caju em 1€ o quilo, protegendo os rendimentos dos produtores.
Foto: Gilberto Fontes
Potencial para aumentar produção
A maior parte dos produtos são vendidos localmente, mas alguns são comercializados também em Bissau e exportados para o Senegal. A produção decorre sobretudo entre os meses de março e junho, período da campanha do caju. No pico de produção, chegam a trabalhar cerca de 60 pessoas. Se a cooperativa conseguisse uma arca frigorífica para armazenar o caju, continuaria a produção depois da campanha.
Foto: Gilberto Fontes
Aposta no empreendedorismo
A cooperativa Buwondena aposta na formação a nível de empreendedorismo, para que os produtores possam aumentar o potencial do seu negócio. A cooperativa pretende criar uma caixa de poupança e crédito. O objetivo é que, através de juros, os produtores possam rentabilizar as suas poupanças e apostar noutros negócios.
Foto: Gilberto Fontes
É urgente reordenar as plantações
A plantação de cajueiros é outra das preocupações da cooperativa: uma plantação organizada, com ventilação é fundamental para aumentar a rentabilidade.
Devido ao peso do sector do caju na economia da Guiné-Bissau, todos os anos são destruídos entre 30 e 80 mil hectares de floresta para a plantação de cajueiros. Especialistas defendem uma reordenação urgente das plantações.