Tribunal condena réus acusados de desvio de dinheiro
Leonel Matias (Maputo)
20 de outubro de 2020
Tribunal Judicial da Cidade de Maputo condenou dois réus a penas de 10 e 11 anos de prisão pelo desvio do equivalente a 1,8 milhões de euros da conta única do tesouro público. Defesa pretende recorrer.
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A sexta secção do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo condenou o arguido Gama Nhampalele a 11 anos de prisão e a arguida Liliana Bule a 10 anos. Ambos são acusados da prática dos crimes de associação para delinquir, furto informático de moedas ou valores, falsificação de documentos e branqueamento de capitais.
Segundo a acusação, os réus desviaram do tesouro público cerca de 155 milhões de meticais, o equivalente a 1,8 milhões de euros, entre 2016 e o início do corrente ano, altura em que a fraude foi descoberta na sequência de uma auditoria.
Aproveitamento de "fragilidades"
O montante era retirado a partir do Centro de Desenvolvimento de Sistemas de Informação de Finanças (CEDSIF), uma instituição ligada ao Ministério da Economia e Finanças à qual Gama Nhampele estava afeto como técnico informático, refere ainda a acusação.
O tribunal afirma ter ficado provado que Gama Nhampalele, fazendo uso das fragilidades do sistema que ajudou a desenvolver, emitia ordens de pagamento fraudulentas para contas bancárias e empresas que foram criadas para servirem "de fachada", destinadas a "drenar" fundos do Estado.
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A juíza da causa, Ivandra Uamusse, disse nas considerações finais que. "no caso em concreto, trata-se de criminalidade cujas infrações assumem um expressivo e intolerável dano em termos de perturbar o regular funcionamento das instituições da administração pública, do sistema politico e do sistema financeiro."
A juíza indicou que os réus agiram de forma premeditada, impelidos pelo desejo de obtenção de ganho sem esforço laboral. "Este tipo de criminalidade tem vindo a registar uma enorme expansão à escala nacional e constitui hoje um dos desafios com que o sistema da justiça é confrontado, exigindo-se deste ações enérgicas para estancar este mal que cria insegurança na sociedade", declarou.
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Indemnizações ao Estado
Para além da condenação a pena de prisão, o réu Gama Nhampalele deverá indemnizar o Estado em cerca de 93 milhões de meticais, o equivalente a cerca de 1,1 milhões de euros, relativos a pelo menos 12 pagamentos indevidos em que ele participou. Já à ré Liliana Bule caberá indemnizar o Estado em 60 milhões de meticais, o equivalente a cerca de 714 mil euros, como resultado do seu envolvimento em diversas transações bancárias fraudulentas.
Durante o julgamento, os réus declararam-se inocentes. O advogado de Gama Nhampalele disse aos jornalistas que vai recorrer da sentença.
"Não temos outra alternativa senão recorrermos", afirmou o advogado Mirco Paulo. "Não temos como nos conformar com a decisão. A decisão é para todos os efeitos viciada, cheia de nulidades, porquanto a convicção do tribunal não chegou a refletir aquilo que é a matéria dos autos. Não existem provas para tal, pelo que a nossa reação, naturalmente, só poderia ser recurso."
Outras três pessoas, acusadas de envolvimento no caso, não foram julgadas por se encontrarem em parte incerta.
Maxixe: Obras sem qualidade são adjudicadas por milhões
Em Maxixe, Moçambique, somam-se os casos de obras públicas sobrefaturadas. A DW África juntou exemplos de obras cujo processo de adjudicação não foi transparente e nas quais os orçamentos foram inflacionados.
Foto: DW/L. da Conceição
Favorecimento na seleção das empresas
Em Maxixe, parte das obras de construção civil têm sido adjudicadas à empresa SGI Construções Lda. que não se encontra registada no Boletim da República e que apenas tem escritórios em Maputo. A empresa, com laços fortes com o Presidente do município, Simão Rafael, faturou, nos últimos dois anos, mais de 30 milhões de meticais (cerca de 427 mil euros) em obras que até hoje ainda não terminaram.
Foto: DW/L. da Conceição
Falta de transparência
Como se vê na imagem, para além de não se saber a data do início desta obra, não se conhece o fiscal nem a distância exata para a colocação de pavés. Sabe-se apenas que tem um prazo de execução de 90 dias.
Foto: DW/L. da Conceição
Figuras ligadas à FRELIMO criam empresa
Esta obra, orçada em mais de sete milhões de meticais, foi adjudicada à MACROLHO Lda, uma empresa com sede em Inhambane e que tem, segundo a imprensa local, participações de sócios ligados ao partido FRELIMO, como o ex-governador de Inhambane, Agostinho Trinta. Faturou, nos últimos dois anos, mais de 40 milhões de meticais em obras que, até agora, ainda não foram entregues. O prazo já expirou.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras faturadas e abandonadas
Esta via é a entrada do bairro Eduardo Mondlane. Desde 2016, o munícipio já gastou na reparação desta estrada - com cerca de 200 metros -, mais de quatro milhões de meticais. Até à data, apenas foram executados 150 metros. Ao que a DW África apurou, o empreiteiro apenas trabalha nos dias de fiscalização dos membros da assembleia municipal. O dinheiro faturado dava para pavimentar mais de 1 km.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras sobrefaturadas
Este é o estado atual de várias obras na cidade de Maxixe. Na imagem, a via do prolongamento da padaria Chambone, foi faturada em mais de cinco milhões de meticais (cerca de 71 mil euros) no ano de 2016. No entanto, esta mesma obra voltou a ser faturada este ano, não tendo o valor sido tornado público.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras sem qualidade
Desde o ano de 2015, o conselho municipal da cidade de Maxixe já gastou mais de 10 milhões de meticais (cerca de 142 mil euros) com as obras de reparação de buracos nas avenidas e ruas do centro da cidade. No entanto, o trabalho não tem qualidade e os buracos continuam a danificar carros ligeiros. O empreiteiro desta obra é também a SGI Construções Lda.
Foto: DW/L. da Conceição
MDM denuncia corrupção
A bancada do MDM na assembleia municipal de Maxixe denunciou que as viaturas adquiridas pela edilidade não estão a ser compradas em agências, mas no mercado negro em África do Sul. Diz a oposição que as últimas duas viaturas adquiridas custaram mais de sete milhões de meticais. Um preço quatro vezes superior, quando comparado ao valor das duas viaturas no mercado em Moçambique.
Foto: DW/L. da Conceição
“Não interessa qualidade, queremos faturar”
Jacinto Chaúque, ex-vereador do município de Maxixe, está a ser investigado pelo Gabinete de Combate à Corrupção de Moçambique. Da investigação consta, entre outros, uma gravação telefónica entre Chaúque e o empreiteiro desta obra, na avenida Ngungunhane, e em que o ex-vereador afirma que “não interessa a qualidade. Queremos faturar nestas obras”. Chaúque está a aguardar julgamento.
Foto: DW/L. da Conceição
Preços altos nas construções de edifícios
Em 2015, o conselho municipal de Maxixe construiu um posto policial no bairro de Mabil. Esta infraestrutura - com apenas dois quartos, uma sala comum e uma cela com capacidade para cinco pessoas – custou mais de 1,3 milhões de meticais, não contando com a aquisição de material como mesas ou cadeiras. Ao que a DW África apurou junto do mercado, esta obra não custaria mais de 300 mil meticais.
Foto: DW/L. da Conceição
Um milhão de meticais por cada sede do bairro
As sedes dos bairros são outro exemplo. Todas as sedes dos bairros construídas pelo conselho municipal contam com a mesma planta. Cada uma custou cerca de um milhão de meticais (cerca de 14 mil euros). O preço real de mercado para uma casa tipo dois, sem mobília de escritório, é de cerca de 300 meticais.
Foto: DW/L. da Conceição
Empreiteiro exige dinheiro de volta
O empreiteiro Ricardo António José reclamou, em 2015, a devolução do dinheiro que foi exigido pelo ex-chefe da Unidade Gestora Executora e Aquisições, Rodolfo Tambanjane. O montante pago por Ricardo José era referente ao valor da comissão de Tambanjane por ter selecionado esta empresa e não outra. Rodolfo Tambanjane foi preso, tendo saído depois de pagar caução. O caso continua em tribunal.