Tribunal Penal Internacional absolve Jean-Pierre Bemba
Jeff Murphy Barès | Mireille Dronne | Lusa
9 de junho de 2018
O ex-vice-presidente congolês estava a cumprir pena de 18 anos de prisão por crimes de guerra e contra a humanidade cometidos na República Centro-Africana. Foi absolvido esta sexta-feira (08.06). As reações dividem-se.
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O Tribunal Penal Internacional (TPI) absolveu esta sexta-feira (08.06) o antigo vice-Presidente da República Democrática do Congo (RDC) Jean-Pierre Bemba, condenado em primeira instância por crimes de guerra e contra a humanidade cometidos na vizinha República Centro-Africana (RCA), entre 2002 e 2003.
Com três votos a favor e dois contra, a secção de recurso do TPI, "anulou a declaração de culpabilidade de Jean-Pierre Bemba" e "declarou a absolvição do acusado porque os erros cometidos pela primeira instância removeram completamente a sua responsabilidade penal", afirmou a juíza Christine van den Wyngaert, em audiência pública. Segundo o Tribunal, a condenação de Jean-Pierre Bemba em 2016, "não comprovou totalmente que este não tenha tomado medidas suficientes para evitar os crimes cometidos pelas tropas congolesas".
Indignação nas ruas da RCA
Em Bangui, capital da República Centro-Africana, parte da população foi apanhada de surpresa, não concordando com a decisão do Tribunal. "Qual será o destino das vítimas? Jean Pierre Bemba não merece a liberdade! As suas milícias obedeceram às suas ordens. Ele deve ser culpado", disse à DW um residente.
Outras pessoas veem a absolvição de Bemba como uma decisão política. É o caso desta habitante na capital da RCA: "Como mulher, considero que esta é uma decisão política, eles querem tirar Joseph Kabila – presidente da RDC - do poder, por isso ilibaram Bemba para ele voltar”, afirma indignada, acrescentando que "os juízes nem sequer pensaram nas vítimas".
Há mesmo quem questione o papel da comunidade internacional e do TPI. "Eles lutam contra a impunidade. Este tribunal não terá sentido se [Bemba] for libertado, porque o TPI existe para punir estes crimes", afirma à DW outro cidadão.
Mas há também quem festeje
Enquanto muitos estão indignados, há quem acredite que "se pode falar agora em justiça no TPI". É o caso de Guida Mushigo. Um outro ouvinte da DW concorda. Numa mensagem do WhatsApp, este ouvinte proveniente da RDC afirma que "esta é uma boa notícia para os congoleses". "Vamos esperar que ele participe nas eleições na RDC", disse.
Detido há 10 anos em Haia, Jean-Pierre Bemba não será para já libertado, pois aguarda julgamento de outro caso pendente no TPI – relacionado com suborno de testemunhas. A secção de recurso do TPI pediu, no entanto, aos juízes que "considerem com urgência" uma possível libertação, dizendo que "não há necessidade de manter Jean-Pierre Bemba preso".
A audiência está já agendada, realizando-se na próxima terça-feira, dia 12 de junho.
A "maldição dos recursos" na República Democrática do Congo
O cobalto e o coltan são minérios abundantes na República Democrática do Congo. Mas, a par com a instabilidade regional, estes recursos atraem milícias, exploração e violência.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Bätz
Recursos atraem violência e oportunistas
Nas províncias da região oriental da República Democrática do Congo (RDC), tesouros como ouro e estanho atraem milícias oportunistas. Estes grupos violentos exploram pessoas, incluindo crianças, na extração dos chamados "minerais de conflito" – como são o ouro, o cobalto e o coltan. Com as receitas angariadas, os grupos compram armas para conquistar mais territórios e assim, perpetuam o conflito.
Foto: picture alliance / Jürgen Bätz/dpa
Proteger os cidadãos e a exploração legal
A Missão das Nações Unidas na República Democrática do Congo (MONUSCO), a maior e mais cara missão de paz da ONU, tem vindo a trabalhar na estabilização da situação nas províncias do norte e do sul de Kivu, que estão no centro da violência do país. As forças de segurança patrulham aldeias mineiras como Nzibira, localizada na margem da Zola Zola, uma mina legal de exploração de cassiterita.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Bätz
Pagar “o preço humano” por telemóveis
A cassiterita é apenas um dos minerais usados na fabricação de telemovéis. Metade da produção mundial destes minerais vem da África Central. A exportação de estanho, ouro e outros minérios da RDC tem estado sob vigilância desde 2010, altura em que entrou em vigor, nos Estados Unidos da América, a lei que exige que as empresas americanas assegurem que não trabalham com "minerais de conflito".
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Comprovar a legalidade dos minerais
Um cartaz em Nzibira explica como os sacos de minerais precisam de ser devidamente selados e rotulados por um inspetor de minas para que a sua origem legal possa ser provada às empresas dos EUA. No entanto, o sistema apresenta muitas falhas. As minas ilícitas podem simplesmente vender os seus "produtos" no mercado negro ou contrabande-á-los numa mina legal, embalando-os lá.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Bätz
Exploração de crianças
Apesar dos esforços levados a cabo por organizações, as violações de direitos humanos continuam a existir na exploração de minérios na RDC. Crianças como Esperance Furahaare, que foi raptada e violada por uma milícia quando tinha 14 anos, são vítimas comuns da exploração e violência.
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Impacto ambiental
As minas, que são difíceis de controlar, também podem prejudicar o meio ambiente e as comunidades vizinhas. Nas minas ilegais, acontece frequentemente, os esgotos misturarem-se com as águas locais, poluindo o abastecimento.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Bätz
Futuro pouco claro para a legislação
Os responsáveis pelas leis nos EUA estão a tentar avançar com um projeto de lei que poderá eliminar a reforma de 2010 - que exige que as empresas assegurem que não trabalham com "minerais de conflito". Os legisladores argumentam que a Lei Dodd-Frank tem reprimido o desenvolvimento económico do país e não teve efeito prático na exploração na África Central.