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Tunísia vai às urnas em presidenciais antecipadas

Lusa
14 de setembro de 2019

À última hora, dois participantes retiraram-se a favor do candidato do partido do Governo, o Nidaa Tounes. Eleições foram antecipadas para este domingo, após a morte do Presidente Béji Caid Essebsi a 25 de julho.

Tunesien | Präsidentschaftswahlkampf | Wahlplakate in Tunis
Foto: imago images/Xinhua/A. Wzzine

O número de participantes nas eleições presidenciais de domingo na Tunísia desceu para 24 devido à retirada nas últimas horas de dois aspirantes, ambos a favor do candidato do partido governante Nidaa Tounes, Abdelkarim Zbidi.

Por um lado, Mohsen Marzouk, da formação Machrou Tounes, formada por dissidentes do Nidaa Tounes, tornou pública a decisão de desistir a 48 horas da data das eleições em defesa "do interesse geral do país" e apelou ao voto "útil".

Da mesma forma, na sexta-feira, o opositor Slim Riahi, do partido União Patriota Livre, a poucos minutos de terminar o último dia de campanha eleitoral anunciou que, apesar de se encontrar numa "boa" posição nas sondagens internas, renuncia por não ter as "mesmas oportunidades" que os restantes candidatos por estar fora do país. 

Entretanto, a Instância Superior Independente das Eleições (ISIE), encarregada de supervisionar as eleições, declarou que a retirada dos candidatos não tem qualquer valor legal porque os nomes continuarão nos boletins de voto e por isso podem ser escolhidos pelos eleitores. 

A campanha eleitoral começou a 2 de setembro na Tunísia, onde cerca de sete milhões de tunisinos são chamados às urnas no domingo. Se nenhum dos 26 candidatos conseguir maioria absoluta, deverá realizar-se uma segunda volta antes de 13 de outubro, afirmou na sexta-feira a ISIE, apesar de ainda não estar fixada qualquer data.

Favorito na prisão

Nabil Karoui está detido desde agosto.Foto: Reuters/Z. Souissi

Um dos favoritos às eleições presidenciais, Nabil Karoui, vai permanecer na prisão após uma decisão emitida na sexta-feira pela justiça, anunciou o seu partido Qalb Tounes (Coração da Tunísia). "O Tribunal de apelo declarou-se incompetente (...) e por consequência recusou o recurso relacionado com Nabil Karoui", indicou o partido em comunicado. Karoui está em detenção provisória desde 23 de agosto, indiciado por branqueamento de dinheiro. 

"Não poderá votar no domingo, mesmo que tenha esse direito", sublinhou ainda a sua advogada Nazih Souii, ao precisar que será formulado em breve um novo pedido para a sua libertação. "Nunca existiram urnas nas prisões, mesmo que certos detidos tenham os seus direitos cívicos". 

Karoui, um empresário do universo dos media e da publicidade perseguido desde 2017 por branqueamento de dinheiro e evasão fiscal, foi detido em 23 de agosto. A data da sua detenção, dez dias antes do início da campanha, motivou interrogações sobre uma instrumentalização da justiça pela política. 

Nos últimos anos garantiu uma forte popularidade, em particular após organizar distribuição de ajuda nas regiões mais pobres do país, operações que foram transmitidas pela Nessma, a cadeia televisiva que fundou. 

A candidatura de Karoui foi validade pela comissão eleitoral do país (Isie), e continua a fazer campanha por intermédio da Nessma, de sua mulher Salwa Smaoui, e da sua família. Através do seu partido anunciou ter iniciado uma greve de fome, ao exigir o direito de voto no domingo. 

Os pedidos de libertação emitidos pelos seus advogados foram até ao momento rejeitados. Karoui e o seu irmão Ghazi são alvo de um processo judicial desde 2017, após uma queixa da ONG anti-corrupção I-Watch que os acusa de fraude fiscal. 

Em julho, o juiz de instrução responsável pelo inquérito decidiu o congelamento dos seus bens e a proibição de se ausentarem do país. 

Projeções inconclusivas

Funeral de Beji Caid Essebsi teve lugar a 27 de julho.Foto: Reuters/A. Awad

Inicialmente previsto para 17 de novembro, o escrutínio foi antecipado após a morte do Presidente Béji Caid Essebsi, a 25 de julho. Alguns meses antes, e perante um descrédito quase generalizado da classe política confirmado nas municipais de 2018, o atual primeiro-ministro, Youssef Chahed, 43 anos, parecia beneficiar da dupla vantagem da crise no partido Nidaa Tounes (Apelo da Tunísia, fundado em 2012 por Caid Essebsi e que o catapultou à Presidência dois anos depois), e por deter o controlo da máquina governamental. 

No entanto, esta vantagem parece ter esmorecido. Entre os candidatos, e para além de Chahed, dois já foram primeiros-ministros e oito, incluindo o chefe do Governo, membros ou próximos do Nidaa Tounes, vencedor das legislativas em 2014. 

Esta heterogénea formação, que surgiu com um programa anti-islamita, foi de seguida dizimada pelas lutas internas de poder e não apresenta candidato, limitando-se a apoiar o ministro da Defesa, Abdelkarim Zbidi. 

Duas mulheres concorrem ao escrutínio, a advogada anti-islamita Abir Moussi que reivindica a herança do antigo regime do ditador Zine el Abidine Ben Ali e defensora de um Estado "forte", e uma antiga ministra, Salma Elloumi. 

Nas vésperas do escrutínio permanece a incerteza e todos os cenários estão em aberto devido à forte indecisão do eleitorado. 

A instância eleitoral do país proibiu a divulgação de sondagens, mas segundo os estudos que circulam o favorito seria o controverso magnata dos media Nabil Karoui. Na prisão desde agosto, não pôde participar nos inéditos debates televisivos que foram organizados em três noites com os candidatos, um acontecimento muito raro no mundo árabe. Uma operação com grande impacto e que suscitou manifestações de júbilo entre os muitos tunisinos que consideram o seu país um "oásis" de democracia na região. 

A inversão do calendário eleitoral -- as legislativas permanecem agendadas para 06 de outubro --, implicou que as principais formações antecipassem a apresentação dos seus candidatos, incluindo o partido islamita moderado Ennahda (Movimento do Renascimento), um ator incontornável da política interna. 

Um dos debates televisivos entre os candidatos presidenciais, a 7 de setembro.Foto: Getty Images/AFP/Ettounsiya TV

Romper com o antigo regime?

Perante uma campanha que precede em poucas semanas as legislativas, e ao contrário da sua tradição, o Ennahda optou por designar o advogado e atual presidente interino do Parlamento, Abdelfattah Mourou, 71 anos, apesar da oposição do líder do partido. 

Os observadores admitem que Mourou, conhecido pela sua eloquência, poderá seduzir algum eleitorado indeciso. Mas vai confrontar-se com o antigo secretário-geral do Ennahda e primeiro-ministro entre 2011 e 2013, Hamadi Jebali, em rutura com o partido desde 2014. 

Diversos candidatos parecem surgir muitos próximos nas projeções, em particular Chahed, Zbidi e Mourou. No entanto, Moussi e ainda Saied poderão provocar uma surpresa. 

A questão da função do Presidente no regime permanece uma importante questão política. E os observadores interrogam-se se deverá cumprir a função de um líder, de um dirigente que aplique um projeto político, ou uma autoridade acima dos partidos que permita ao parlamento e ao governo exercer os seus poderes constitucionais. 

A maioria dos candidatos tem manifestado a intenção de serem líderes fortes, num país confrontado com múltiplos desafios. No entanto, o presidente eleito estará sempre dependente dos equilíbrios provenientes das legislativas. E à semelhança do que tem sucedido desde a queda do regime ditatorial, governar com ou sem o Ennahda vai permanecer uma questão central. 

No entanto, os analistas continuam a sublinhar que, apesar das imperfeições da sua democracia (pressões sobre a justiça, conjugação entre interesses económicos e política, ausência de projetos sociais), a Tunísia vai registar presidenciais tensas, mas livres e abertas, como pouco países árabes conhecem realmente. 

A campanha eleitoral, com uma eventual segunda volta a ser realizada a 13 ou 20 de outubro, ficou ainda assinalada pelo facto de as questões socioeconómicas terem permanecido no centro dos debates em detrimento da luta antiterrorista, um tema omnipresente durante muito tempo numa Tunísia traumatizada pelos atentados, e mesmo que permaneçam as inquietações sobre a segurança.

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