Gâmbia: União Africana e CEDEAO condenam tentativa de golpe
Lusa
22 de dezembro de 2022
A União Africana (UA) e a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) condenaram "veementemente" a alegada tentativa de golpe de Estado anunciada pelo Governo da Gâmbia na quarta-feira.
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"Condeno veementemente a tentativa de desestabilização do Governo da Gâmbia. A União Africana rejeita veementemente qualquer tomada de poder pelas armas e mantém-se solidária com o Governo da Gâmbia", disse na quarta-feira o chefe de Estado senegalês e presidente em exercício da UA, Macky Sall, na rede social Twitter.
O bloco regional de 15 países da África Ocidental, a CEDEAO, também condenou os acontecimentos num comunicado e expressou a sua "rejeição total" de qualquer mudança "inconstitucional" de Governo nos seus estados membros.
"A Comissão da CEDEAO saúda a liderança e o pessoal dos serviços de segurança da Gâmbia pela sua adesão ao seu papel constitucional e por impedir esta conspiração ilegal", disse a organização.
O Governo da Gâmbia alertou na quarta-feira (21.12) para uma alegada tentativa de golpe de Estado, que levou à prisão de quatro soldados do exército da Gâmbia e três outros alegados cúmplices estão a ser procurados.
"O Governo da Gâmbia anuncia que, com base em informações secretas, que alguns soldados do exército gambiano estavam a conspirar para derrubar o Governo democraticamente eleito do Presidente Adama Barrow", escreveu o porta-voz do executivo e conselheiro presidencial, Ebrima G. Sankareh.
Soldados detidos
Na declaração, o porta-voz do Governo anunciou que "numa rápida operação militar", realizada na terça-feira, o Alto Comando das Forças Armadas Gambianas "prendeu quatro soldados ligados a esta alegada conspiração golpista".
Segundo os "relatórios dos serviços secretos", "alguns soldados do exército gambiano conspiraram para derrubar o Governo democraticamente eleito do Presidente Adama Barrow", explicou.
"As investigações sobre este assunto continuam e os cidadãos serão devidamente informados de quaisquer novos desenvolvimentos", disse o porta-voz do executivo e conselheiro da presidência, acrescentando que a situação estava "totalmente sob controlo".
A confirmar-se, esta seria a mais recente tentativa de golpe de Estado na África Ocidental desde 2020, após dois golpes bem-sucedidos no Mali e no Burkina Faso e outro na Guiné-Conacri, e uma tentativa na Guiné-Bissau, que está fisicamente próxima da Gâmbia, separada apenas por uma pequena faixa de 300 quilómetros de território senegalês.
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Regime democrático "frágil"
A Gâmbia, um pequeno país que só desde 2017 tem um regime democrático, é considerado frágil, depois de 20 anos de ditadura de Yahya Jammeh.
A Gâmbia é presidida por Adama Barrow desde dezembro de 2016, quando derrotou nas urnas o ex-presidente Yahya Jammeh, que tinha governado o país com mão de ferro desde 1994, num regime caraterizado por graves violações dos direitos humanos, incluindo desaparecimentos forçados, tortura e execuções extrajudiciais de estudantes, ativistas, opositores e funcionários públicos.
Em 2018, Barrow lançou a Comissão de Verdade, Reconciliação e Reparação, que investigou estes abusos durante três anos e em finais de novembro de 2021 apresentou as suas conclusões finais ao Presidente, apelando à acusação dos responsáveis pelos crimes cometidos durante o regime de Jammeh.
Barrow foi reeleito como Presidente da Gâmbia em dezembro de 2021 para outro mandato de cinco anos, enquanto Jammeh está no exílio na Guiné Equatorial desde a sua derrota eleitoral.
Golpes de Estado em África: Um mal endémico
Em menos de um ano, o continente africano viveu oito golpes e tentativas de golpe de Estado. A maior parte aconteceu na África Ocidental, região do continente mais fértil para as intentonas. Não há fator surpresa.
Foto: Radio Television Guineenne/AP Photo/picture alliance
Níger: Tentativa de golpe fracassada
A tentativa de golpe de Estado aconteceu a 31 de março de 2021, dois dias antes da tomada de posse do Presidente Mohamed Bazoum. Na capital, Niamey, foram detidos alguns membros do Exército por detrás da tentativa. O suposto líder do golpe é um oficial da Força Aérea encarregado da segurança na base aérea de Niamey. O Níger já sofreu 4 golpes de Estado: o último, em 2010, derrubou Mamadou Tandja.
Foto: Bernd von Jutrczenka/dpa/picture alliance
Chade: Uma sucessão com sabor a golpe de Estado
Pouco depois do marechal Idriss Déby ter vencido as presidenciais, morreu em combate contra rebeldes. A 21 de abril de 2021, o seu filho, o general Mahamat Déby, assumiu a liderança do país, sem eleições, nomeando 15 generais para o Conselho Militar de Transição, entre eles familiares seus. Idriss governou o Chade por mais de 30 anos com mão de ferro e o filho dá sinais de lhe seguir os passos.
Foto: Christophe Petit Tesson/REUTERS
Mali: Um golpe entre promessas de eleições
O coronel Assimi Goita foi quem derrubou Bah Ndaw da Presidência do Mali a 24 de maio de 2021. Justifica que assim procedeu porque tentava "sabotar" a transição no país. Mas Goita prometeu eleições para 2022 e falou em "compromisso infalível" das Forças Armadas na defesa da segurança do país. Pouco depois, o Tribunal Constitucional declarou o coronel Presidente da transição.
Foto: Xinhua/imago images
Tunísia: Um golpe de Estado sem recurso a armas
No dia 25 de julho de 2021, Kais Saied demitiu o primeiro ministro, seu rival, Hichem Mechichi, e suspendeu o Parlamento por 30 dias, o que foi considerado golpe de Estado pela oposição, que convocou manifestações em nome da democracia. Saied também levantou a imunidade dos parlamentares e garantiu que as decisões foram tomadas dentro da lei. Nas ruas de Tunes, teve o apoio da população.
Foto: Fethi Belaid/AFP/Getty Images
Guiné-Conacri: Um golpista da confiança do Presidente
O dia 5 de setembro de 2021 começou com tiros em Conacri, uma capital que foi dominada por militares. O Presidente Alpha Condé foi deposto e preso pelo coronel Mamady Doumbouya - que dissolveu a Constituição e as instituições. O golpista traiu Condé, que o tinha em grande estima e confiança. Doumboya tinha demasiado poder e não se entendia com a liderança da ala castrense.
Foto: Radio Television Guineenne via AP/picture alliance
Sudão: Golpe compromete transição governativa
A 25 de outubro de 2021, os golpistas começaram por prender o primeiro ministro, Abdalla Hamdok, e outros altos quadros do Governo para depois fazerem a clássica tomada da principal emissora. No comando estava o general Abdel Fattah al-Burhan, que dissolveu o Conselho Soberano. Desde então, o Sudão vive manifestações violentas, com a polícia a ser acusada de uso excessivo de força.
Foto: Mahmoud Hjaj/AA/picture alliance
Burkina Faso: Golpe de Estado festejado
A turbulência marcou o começo do ano, mas a intentona foi celebrada em grande nas ruas da capital, Ouagadougou. A 23 de janeiro de 2022, o tenente-coronel Paul Damiba liderou o golpe de Estado ao lado do Exército. Ao Presidente Roch Kaboré não restou outra alternativa se não demitir-se. Tal como os golpistas de outros países, comprometem-se a voltar à ordem constitucional após consultas.
Foto: Facebook/Präsidentschaft von Burkina Faso
Guiné-Bissau: Intentona ou "inventona"?
Tiros, alvoroço, mortos e feridos no Palácio do Governo marcaram o dia 1 de fevereiro de 2022 em Bissau. O Presidente Umaro Sissoco Embaló diz que os golpistas queriam matá-lo e ao primeiro ministro, Nuno Nabiam. Houve algumas detenções, mas até hoje não se conhece o líder golpista. No país, acredita-se que tudo não passou de um "teatro" orquestrado pelo próprio Presidente, amplamente contestado.