Em digressão inédita, ministro dos Negócios Estrangeiros da Ucrânia, Dmytro Kuleba, diz que "chegou a hora" de explicar as "verdades ucranianas" aos homólogos africanos. Visita é "tática de sedução", afirma analista.
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Esta semana, ao iniciar o périplo africano de 10 dias, o chefe da diplomacia ucraniana, Dmytro Kuleba, disse que o seu grande objetivo é tentar "explicar melhor a Ucrânia".
"A narrativa russa tem estado muito presente em África", mas "chegou a hora das verdades ucranianas", disse Kuleba aos jornalistas na capital senegalesa, Dakar.
Esta é uma visita histórica. É a primeira viagem de um ministro dos Negócios Estrangeiros ucraniano a países africanos. Tem lugar numa altura em que a influência russa aumenta em África.
"Creio que esta visita é uma procura por simpatia, uma procura de aliados, para explicar a reação da Ucrânia contra a Rússia", comenta Bley Hyacinthe, analista político da Universidade de Abidjan.
A primeira paragem no Senegal é simbólica, acrescenta Hyacinthe em declarações ao serviço da DW em francês. "O Senegal detém atualmente a presidência da União Africana e é a porta de entrada para África".
Armas e cereais
Muitos países africanos dependem fortemente das importações de cereais da Rússia e da Ucrânia.
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Na sua primeira conferência de imprensa no continente, Dmytro Kuleba prometeu que a Ucrânia fará o possível para "continuar a exportar cereais ucranianos para África e para o mundo em busca de alimentos com segurança''.
No entanto, a nível de fornecimento militar, a balança pende para a Rússia, que continua a ser o maior fornecedor de armas do continente africano. Além disso, muitos países estimam os fortes laços históricos que os unem a Moscovo - a antiga União Soviética ajudou-os nas suas lutas de libertação.
"Recordemos que, nas Nações Unidas, África absteve-se de condenar a Rússia", afirma Bley Hyacinthe.
Mas a Rússia não é a União Soviética socialista - a riqueza do país está concentrada num pequeno grupo de oligarcas. E a Ucrânia também é um antigo Estado soviético, que está a ser alvo de uma invasão.
A visita de Kuleba faz parte de "ofensiva diplomática" para explicar isso mesmo, entende Hyacinthe. "É preciso explicar que a Rússia está a abusar das suas prerrogativas ao querer anexar a Ucrânia, que está apenas a defender-se."
"Táticas de sedução"
Sendo assim, África parece estar no centro das "táticas de sedução" diplomática, tanto de Kiev como de Moscovo.
Ainda esta semana, o ministro dos Negócios estrangeiros russo, Sergei Lavrov, acusou o Ocidente de "intimidar" os países em desenvolvimento, sobretudo em África, para não apoiarem a Rússia. Mas Lavrov disse confiar que a verdade "encontrará o seu caminho".
"Quer o Ocidente queira, quer não, é um cenário ditado pela própria vida. Quaisquer outros apelos, confrontações e mobilização de forças antirussas, ameaças, chantagem, tudo isto é contra a história e será esquecido. A vontade do povo permanecerá para sempre", disse Lavrov.
A visita a África do ministro ucraniano Dmytro Kuleba ocorre apenas dois meses depois de uma viagem semelhante do homólogo russo, Sergei Lavrov.
Mais de 6.100 civis foram mortos na Ucrânia desde o início do conflito, a 24 de fevereiro. Moscovo e Kiev rejeitam negociações de paz. Esta quarta-feira (05.10), a Rússia oficializou a anexação de quatro regiões ucranianas.
Rússia - Ucrânia: Uma cronologia das relações que levaram a guerra à Europa
Ao invadir a Ucrânia, o Presidente Vladimir Putin foi acusado pelos países ocidentais de provocar uma guerra na Europa. Veja aqui a cronologia dos acontecimentos que levaram à guerra entre a Rússia e a Ucrânia.
Foto: UMIT BEKTAS/REUTERS
2004
O candidato pró-Rússia, Viktor Yanukovich (na foto), é declarado Presidente, mas alegações de fraude eleitoral provocam um movimento de protesto. Conhecida como a Revolução Laranja, a iniciativa força uma nova votação, que resulta na eleição do pró-ocidental Viktor Yushchenko.
Foto: Reuters/T. Makeyeva
2005
Um ano mais tarde, o novo Presidente, Viktor Yushchenko, promete retirar a Ucrânia da órbita de Moscovo e conduzi-la em direção à NATO e União Europeia. Durante a sua campanha em 2004, Yushchenko sofreu uma tentativa de assassinato por envenenamento que o deixou desfigurado. Desde então, fez uma recuperação física total.
Foto: picture-alliance/dpa/Sputnik/A. Vitvitsky
2008
Na cimeira de Bucareste, a NATO concorda em iniciar o processo de adesão da Ucrânia e da Geórgia. "Acordámos hoje que estes países se tornarão membros da NATO", lê-se na declaração da cimeira. Na mesma cimeira, o Presidente russo, Vladimir Putin (na foto), avisou que as relações com o Ocidente dependeriam do respeito pelos interesses do seu país.
Foto: Vladimir Rodionov/dpa/picture-alliance
2010
Viktor Yanukovich derrota Yulia Tymoshenko nas presidenciais e torna-se chefe de Estado. As eleições foram consideradas justas por observadores internacionais. Uma semana antes da assinatura do acordo com a UE, Yanukovich suspende o processo e anuncia que a Ucrânia prefere juntar-se à Rússia na União Aduaneira Eurasiática.
Foto: Reuters
2013 e 2014
A decisão de Yanukovich gera uma onda de protestos de apoiantes da integração europeia. O movimento chamado "Euromaidan", por centrar as manifestações na Praça Maidan, em Kiev, tornam-se violentos. Dezenas de manifestantes são mortos, mas o Presidente acaba por ser retirado do Governo, exilando-se na Rússia.
Foto: Tomas Rafa
2014 - anexação da Crimeia
Em março, a Rússia anexa a península da Crimeia, no sudeste da Ucrânia.
Em abril, separatistas com apoio de Moscovo declaram a independência das "repúblicas" de Luhansk e de Donetsk, na região oriental ucraniana do Donbass, iniciando uma guerra que provoca 14 mil mortos em oito anos.
Foto: Imago Images
2019
O ex-ator e comediante Volodymyr Zelensky é eleito Presidente da República em 21 de abril e promete pôr fim ao conflito no leste da Ucrânia. Em 2021, apela ao novo Presidente dos Estados Unidos da América, Joe Biden, para apoiar a adesão da Ucrânia possa à NATO, colocando o país em novamente nos trilhos rumo à Europa.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Sivkov
2021 - Março até Novembro
O Governo russo estaciona tropas perto da fronteira da Ucrânia, alegando treinos miltares.
A Ucrânia acusa Putin de ter concentrado 100 mil tropas e armamento pesado nas suas fronteiras, o que motiva um pedido de explicação dos EUA ao Kremlin. Putin acusa o Ocidente de exacerbar tensões "entregando armas modernas a Kiev e conduzindo exercícios militares provocatórios" no Mar Negro.
Foto: Maxar Technologies via REUTERS
2021 - Dezembro
Biden adverte que a Rússia será alvo de sanções económicas duras se invadir a Ucrânia.
Moscovo divulga as suas exigências ao Ocidente: tratados a proibir a adesão da Ucrânia e da Geórgia à NATO, o estabelecimento de bases militares no leste e a retirada de tropas aliadas da Roménia e da Bulgária, num regresso à situação anterior a 1997.
Foto: Brendan Smialowski/AFP
2022 - 10 de Fevereiro
Tropas russas e bielorrussas iniciam dez dias de exercícios de combate próximo da fronteira da Bielorrússia com a Ucrânia. A presença destas tropas gera mais preocupação na comunidade internacional, que vê os exercícios como um posicionamento estratégico das tropas russas, dando-lhes mais um ponto de entrada na Ucrânia.
Foto: Alexander Zemlianichenko/AP Photo/picture alliance
2022 - 21 de Fevereiro
Os líderes das autoproclamadas repúblicas populares de Donetsk e Luhansk pedem a Putin para as reconhecer como Estados independentes. Putin assina os decretos em que a Rússia reconhece a independência das regiões e ordena ao exército russo que envie uma missão de "manutenção da paz" para os territórios no leste da Ucrânia.
A NATO acusa Moscovo de fabricar um pretexto para invadir a Ucrânia.
Foto: Alexei Alexandrov/AP Photo/picture alliance
2022 - 22 de Fevereiro
Zelensky pede ao Ocidente "medidas de apoio claras e eficazes", assegura que os ucranianos "não vão ceder uma única parcela do país" e responsabiliza a Rússia por tudo o que acontecer.
Olaf Scholz, chanceler da Alemanha, diz que tomou medidas para interromper a certificação do gasoduto Nord Stream 2, numa decisão saudada pela UE e pelos EUA.
Foto: Clemens Bilan/Getty Images
2022 - 24 de Fevereiro
Tropas russas entram na Ucrânia e muitos locais são atingidos por mísseis. Vladimir Putin pronuncia um discurso no qual afirma que apenas alvos militares serão atingidos. Mas relatos de civis feridos e vídeos de ataques em zonas urbanas enchem as redes sociais. Várias baixas são reportadas nas primeiras horas do conflito.
Foto: Ukrainian President s Office/Zuma/imago images
2022 - 24 de Fevereiro
Edifícios residenciais civis atingidos durante a operação militar do Kremlin contra a Ucrânia. Relatos, vídeos e pedidos de ajuda surgem nas redes sociais, expondo vários cenários em que zonas urbanas e civis foram apanhados na destruição dos ataques militares.
Foto: UMIT BEKTAS/REUTERS
2022 - 24 de fevereiro
Muitas pessoas utilizaram as estações de metro em Kiev como abrigo durante a operação militar do Kremlin. As sirenes contra ataques aéreos soaram pela primeira vez desde a 2ª Guerra Mundial. As estações encheram-se de pessoas à procura de guarida.
Foto: Zoya Shu/AP/dpa/picture alliance
2022 - 24 de Fevereiro
Protestos contra a iniciativa militar do Kremlin surgem em vários países, incluindo na Rússia. Na foto, uma manifestante russa é detida pela polícia enquanto segura um cartaz que diz "Não à guerra!".