UE lamenta falta de liberdade da missão da ONU no Mali
Lusa
2 de julho de 2022
União Europeia (UE) anunciou que a ONU renovou por mais um ano a missão no Mali, mas lamenta que o Governo daquele país não lhe dê liberdade para investigar violações de direitos humanos.
"As capacidades da Minusma em termos de investigação e recolha de provas são um atributo crucial e contribuem para a confiança da população no Estado serviços", referiu uma porta-voz do Serviço Europeu de Ação Externa em comunicado.
Entretanto, a União Europeia (UE) lamenta que o Mali se tenha oposto à liberdade de circulação para que a missão da ONU cumpra seu mandato, "ainda mais num contexto de aumento exponencial de violações e abusos de direitos humanos nos últimos meses".
"A UE insta o Estado do Mali a agir em conformidade com o mandato da Minusma e a realizar investigações eficazes sobre qualquer alegação de violação de direitos humanos, independentemente do suposto autor, bem como a realizar buscas efetivas", disse a porta-voz.
Mandato da missão no Mali
O Conselho de Segurança da ONU estendeu na quarta-feira o mandato da missão no Mali, mas o embaixador permanente do país na ONU, Issa Konfourou, disse que, embora o Mali tenha votado a favor dessa extensão, há "oposição" à liberdade de movimento da missão.
Assegurou que o seu Governo sempre "colaborou de boa-fé" com a Minusma desde a sua criação em 2013, mas reivindicou a sua "soberania" nacional e sustentou que a missão é chamada a apoiar o Governo, e não a "substituí-lo", sublinhando que as investigações sobre as violações dos direitos humanos são da responsabilidade do executivo do Mali.
O Mali, governado por uma junta militar após dois golpes em menos de um ano, não controla grandes áreas do país, especificamente no norte e centro, onde a administração central está praticamente ausente, enquanto aumentam os ataques perpetrados por diferentes grupos jihadistas.
Além disso, nos últimos meses existe tensão entre o governo do Mali e a comunidade internacional e a ONU, que alertou para as restrições que os "capacetes azuis" enfrentam.
Conflito no Mali: Dogon refugiam-se em terra ancestral
Com a escalada do conflito no centro do Mali, o povo Dogon fugiu da região de Mopti, que foi a sua casa durante cerca de 700 anos, para "Mande", a sua terra ancestral.
Foto: Udo Lucio Borga
Uma nova vida na terra ancestral
Tal como milhares de outros Dogon, Isaie Dignau deixou a região de Bandiagara, no centro do Mali, por causa da insegurança. Ele e a família refugiaram-se em Nana Kenieba, uma aldeia a cerca de 150 quilómetros a sudeste da capital Bamako. De acordo com Isaie, os contadores de histórias Dogon previram esta migração para terras outrora chamadas "Mande" há centenas de anos.
Foto: Udo Lucio Borga
A profecia do regresso a casa cumpriu-se
Segundo a lenda, os Dogon são originalmente de "Mande", a região do povo Malinke. Entre os séculos XI e XIII, foram forçados a partir face à islamização da África Ocidental. Após uma longa migração, instalaram-se em torno da famosa falésia de Bandiagara, no que é hoje a região de Mopti. Agora, devido à ameaça jihadista, estão a regressar a casa.
Foto: Udo Lucio Borga
Mali, um conflito sem fim
Os caçadores de Dan Na Ambassagou são a principal milícia Dogon em Mopti. O conflito no Mali começou em 2012 e em 2016 alastrou-se para o centro do país. À medida que as tensões entre grupos étnicos aumentavam, formaram-se milícias de autodefesa. A violência é causada pela falta de terras férteis e de água numa área afetada pelo jihadismo.
Foto: Ugo Lucio Borga
As consequências do conflito
O Mali está a enfrentar uma grave crise humanitária em regiões já subdesenvolvidas. A insegurança alimentar afeta 1,3 milhões de pessoas. Cerca de 347.000 pessoas foram forçadas a fugir das suas terras. Muitas procuraram refúgio em países vizinhos, mas a maioria está deslocada internamente e refugiada no sul do Mali e em campos de refugiados próximos de áreas urbanas.
Foto: Ugo Lucio Borga
Os Dogon no conflito do Mali
Muitos Dogon estão diretamente envolvidos no conflito. Seidu Doungo lutou contra os Dan Na Ambassagou na região de Koro. Em 2020, abandonou as armas. A sua família foi ameaçada por jihadistas e ele já não conseguia uma fonte de rendimento. Quando Seidu ouviu falar de Nana Kenieba, decidiu deixar Koro para encontrar a paz em "Mande".
Foto: Ugo Lucio Borga
A hospitalidade local
Os Malinke são o grupo étnico maioritário em Nana Kenieba. Segou Keita é o chefe da aldeia e acolheu os Dogon que regressaram de acordo com a antiga profecia. A comunidade apoia-os financeiramente e inclui-os na tomada de decisões.
Foto: Udo Lucio Borga
Distribuição justa da terra
No alojamento principal de Nana Kenieba, Isaie Dignau mostra a alguns habitantes um mapa das parcelas de terreno. Desde 2016, cerca de 400 famílias Dogon, principalmente de Mopti, instalaram-se aqui. Cada família recebeu dois hectares de terra e alimentos.
Foto: Udo Lucio Borga
Uma comunidade secular
Os Dogon são uma comunidade secular, onde as pessoas são livres de professar o islamismo, o cristianismo ou crenças ancestrais. A aldeia tem duas mesquitas e duas igrejas, com correspondentes escolas corânicas e aulas de catecismo, sinal de um novo tempo de abertura.
Foto: Udo Lucio Borga
O medo ainda existe
O ambiente pacífico de "Mande" parece muito longe do conflito no Mali. Mas a comunidade vive com medo de que os jihadistas possam chegar e iniciar um conflito. Em Nana Kenieba, os habitantes organizaram patrulhas que mantêm os bandidos afastados por agora.