Um mês depois polícia procura criminosos no caso Amurane
Sitoi Lutxeque (Nampula)
3 de novembro de 2017
Família de Mahamudo Amurane, assassinado há um mês, continua à espera de informações concretas sobre os autores materiais e morais do hediondo crime.
Publicidade
No sábado (04.11.) completa um mês após o assassinato a tiros do edil de Nampula, Mahamudo Amurane, na sua residência, por desconhecidos. A família e a população em geral continuam a desconhecer as motivações e os autores do crime.
Selemane Amurane que é o sétimo irmão Mahamudo Amurane, num grupo de nove, disse em entrevista a DW África, que a família continua preocupada com o silêncio das autoridades quanto ao esclarecimento do assassinato do seu irmão mais velho.
"Como dizem, está nos segredos da justiça, então nós não temos nenhuma informação nem por parte do Governo nem por outras entidades", lamentou.
Celeridade nas investigaçõesNo dizer de Selemane, a família ainda chora pela morte de Mahamudo, o filho mais velho do casal Amurane e que agora o pedido é no sentido da celeridade nas investigações para que sejam apurados os verdadeiros mandantes e assassinos.
"Ainda temos aquele sentimento. Queremos reforçar o nosso pedido às instituições no sentido de ser acelerado o processo [investigativo] para que tenhamos acesso a todas informações e esclarecimentos. Pela pressão da família e de todo o povo moçambicano penso que este caso será esclarecido", acredita Selemane.
Segundo ele, a família tem recebido muito apoio moral por parte dos moçambicanos, em particular dos residentes em Nampula e, recentemente, o primeiro-ministro moçambicano, Carlos Agostinho do Rosário, "visitou a família para demonstrrar o seu sentimento de pesar e dor face a este hediondo crime".
"Aparente silêncio"
A igreja Católica, na qual Mahamudo Amurane era crente, também já se pronunciou sobre a ausência de esclarecimentos por parte das autoridades neste processo de investigação. O padre diocesano Cantifulas de Castro lamenta a lentidão ou o que considera "um aparente silêncio neste caso"."É lamentável, 30 dias não são como um dia. 30 dias passam sem nenhum esclarecimento deste macabro assassinato do nosso presidente muito bem amado, não é possível. O povo apelidou-o de mopoli [salvador] e a Justiça, nem a local ou a nacional, ainda não conseguiu saber quem foram os autores do crime?", questionou o religioso.
OL - MP3-Mono
Mas o reverendo Cantifulas está otimista quando à divulgação dos trabalhos de investigação e pede mais flexibilidade das autoridades nesse sentido.
"O facto Amurane não é igual aos outros, é um facto ‘marginal'... então a expectativa é que se esclareça o mais rápido possível quem foram esses que se envolveram neste macabro incidente e que pretensões tiveram para silenciar aquela voz profética que estava a contribuir de forma assaz para o desenvolvimento da cidade de Nampula", disse.Entretanto, ao evocar o segredo da justiça, a Liga dos Direitos Humanos, na pessoa do seu delegado em Nampula, Tarcísio Abibo, disse que o processo pode demorar algum tempo, mas está confiante que serão conhecidos e responsabilizados os autores do crime.
"A intervenção do Presidente da República, aquando do desaparecimento físico do edil de Nampula, foi crucial e extremamente importante. Pelo facto julgo ter sido uma chamada de atenção grande para os investigadores tanto do Ministério Público bem como do Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC)", disse.
"Pode demorar mas será solucionado"
Tarcisio Abibo, que também é advogado, disse por seu turno que o caso Amurane, embora seja diferente de outros que já aconteceram e que continuam sem resposta, este pode demorar, mas terá de certeza uma solução.
"Para nós até é necessário que demore muito, para que se consiga chegar a uma justiça plena. Não nos interessa que a investigação seja aquela parcial e que tenha que correr para trazer dados e contentar quem quer que seja", concluiu.
Entretanto, segundo o jornal nacional Canal de Moçambique, na edição desta sexta-feira (03.11.), seis pessoas já foram constituídas arguidas no caso Amurane e outras mais de 60 já foram ouvidas pelas autoridades judiciárias.
Moçambique: Assassinato de figuras incómodas é uma moda que veio para ficar
O preço de fazer valer a verdade, justiça, conhecimento ou até posições diferentes costuma ser a vida em Moçambique. A RENAMO é prova disso, no pico da tensão com o Governo da FRELIMO perdeu dezenas de membros.
Foto: BilderBox
Mahamudo Amurane: Silenciada uma voz contra corrupção e má governação
O edil da cidade de Nampula foi morto a tiros no dia 4 de outubro de 2017. Insurgia-se contra a má gestão da coisa pública e corrupção no seu Município. Foi eleito para o cargo de edil através do partido MDM. Embora mais de sessenta pessoas já estejam a ser ouvidas pela justiça não se conhecem os autores do crime.
Foto: DW/Nelson Carvalho Miguel
Jeremias Pondeca: Uma voz forte nas negociações de paz que foi emudecida
Foi alvejado mortalmente a tiro por homens desconhecidos no dia 8 de setembro de 2016 em Maputo quando fazia os seus exercícios matinais. O assassinato aconteceu numa altura delicada das negociações de paz. Pondeca era membro da Comissão Mista do diálogo de paz, membro do Conselho de Estado, membro sénior da RENAMO e antigo parlamentar. Até hoje a polícia não encontrou os autores do crime.
Foto: DW/L. Matias
Manuel Bissopo: O homem da RENAMO que escapou por um triz
No dia 4 de janeiro de 2016 foi baleado depois de uma conferência de imprensa do seu partido na Beira. Bissopo tinha acabado de denunciar alegados raptos e assassinatos de membros do seu partido e preparava-se para se deslocar para uma reunião da força de oposição quando foi baleado. A polícia moçambicana até hoje não encontrou os atiradores.
Foto: Nelson Carvalho
José Manuel: Uma das caras da ala militar da RENAMO que se apagou
Em abril de 2016 este membro do Conselho Nacional de Defesa e Segurança em representação da RENAMO e membro da ala militar do principal partido da oposição foi morto a tiro por desconhecidos à saída do aeroporto internacional da Beira. A questão militar é um dos pontos sensíveis nas negociações de paz. Os assassinos continuam a monte.
Foto: DW/J. Beck
Marcelino Vilanculos: Assassinado quando investigava raptos
Era procurador foi baleado no dia 11 de abril de 2016 à entrada da sua casa, na Matola. Marcelino Vilanculos investigava casos de rapto de empresários que agitavam o país na altura. O julgamento deste assassinato começou em outubro de 2017.
Foto: picture-alliance/Ulrich Baumgarten
Gilles Cistac: A morte foi preço pelo conhecimento divulgado?
O especialista em assuntos constitucionais de Moçambique foi baleado por desconhecidos no dia 3 de março de 2015 na capital Maputo. O assassinato aconteceu após uma declaração que fortaleceu a posição da RENAMO de gestão autónoma na sua querela com o Governo da FRELIMO. Volvidos mais de dois anos a sua morte continua por esclarecer.
Foto: A Verdade
Dinis Silica: Assassinado em circunstâncias estranhas
O juiz Dinis Silica também foi morto a tiro por desconhecidos, em 2014, em plena luz do dia, quando conduzia o seu carro na capital moçambicana. Na altura transportava uma avultada quantia de dinheiro, cuja proveniência é desconhecida. O juiz da Secção Criminal do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo investigava igualmente casos de raptos. Os assassinos continuam a monte.
Foto: picture-alliance/dpa/U. Deck
Siba Siba Macuacua: Uma morte brutal em nome da verdade
O economista do Banco de Moçambique foi atirado de um dos andares do prédio sede do Banco Austral no dia 11 de agosto de 2001. Na altura investigava um caso de corrupção na gestão do Banco Austral. Siba Siba trabalhava na recuperação da dívida de milhões de meticais, resultante da má gestão do banco. Embora tenha sido aberta uma investigação sobre esta morte ainda não há esclarecimentos até hoje.
Foto: DW/M. Sampaio
Carlos Cardoso: O começo da onda de assassinatos
Considerado o símbolo do jornalismo investigativo em Moçambique, Carlos Cardoso foi assassinado a tiros a 22 de novembro de 2000. Na altura investigava a maior fraude bancária de Moçambique. O seu assassinato foi interpretado como um aviso claro aos jornalistas moçambicanos para que não interferissem nos interesses dos poderosos. Devido a pressões internacionais o caso chegou a justiça.