Há três anos que o Quénia quer construir um muro na fronteira com a Somália. Para já, pouco foi alcançado e a população está dividida quanto ao projeto.
Publicidade
Depois do ataque terrorista de 2015 na Universidade de Garissa, que causou 150 mortos, o Governo do Quénia decidiu fechar a fronteira com a Somália, construindo um muro entre os dois países. Três anos depois, o que era para ser um muro não passa de uma vedação ainda francamente longe de delimitar a fronteira de quase 700 quilómetros.
A cidade de Mandera fica no norte do Quénia, junto à fronteira com a Somália. É um dos locais onde já se iniciou a construção da vedação. Um dos postos de passagem entre os países fica junto ao movimentado mercado de Mandera. Mas, para já, é usado por poucos.
Um muro entre o Quénia e a Somália?
Jamal, vendedor no mercado, preocupa-se com o possível fecho da fronteira, pois os comerciantes estão muito dependentes do país vizinho. "Quase 90% dos nossos produtos vêm da Somália. Estamos dependentes da Somália", conta.
Se o plano do Governo queniano avançar, o mercado livre e as importações baratas têm os dias contados. Mas há quem partilhe da opinião do Governo e considere que a vedação pode contribuir para uma maior segurança. É o caso de Mohammed Adi Sani. "A nossa fronteira é permeável. Há muitos problemas com terrorismo, a nível global e aqui na região. Já não conseguimos dormir. Esta vedação vai melhorar a nossa segurança", garante.
Dois anos depois do início da construção, apenas 8 quilómetros foram concluídos. O "muro" é na verdade composto por duas filas paralelas com esteios de cimento e arame farpado. Há também uma vala com três metros de profundidade que serve para travar eventuais carros.
O segurança Mohamud Saleh conta que Mandera sofreu muito com o terrorismo e que esta construção já está a tornar a região mais segura. "A população disse-nos que não houve mais ataques desde que estes 8 km de vedação foram construídos", afirma o segurança.
Uma "vitória" para os terroristas
A barreira não é tão impenetrável como parece. Facilmente se pode cortar o arame com um alicate, uma vez que a vedação não é guardada permanentemente. Um ancião da aldeia mostra-se descontente com o projeto. Para ele, a vedação aumenta a desconfiança em relação à região, pois as pessoas de ambos os lados pertencem ao mesmo grupo étnico. "Casei-me do outro lado da fronteira. A minha família está lá. Como posso aceitar que se coloque uma vedação aqui?", lamenta.
Se a fronteira naquela zona for completamente fechada, a rotina dos cidadãos será alterada. As pessoas terão de passar por um dos postos transfronteiriços, incluindo as crianças que vão à escola do outro lado. Até os pastores nómadas terão de conduzir os seus animais por longas distâncias à procura de pastos e fazê-los passar pelo posto de controlo.
Hassan, outro ancião, considera que a vedação representa uma vitória para os terroristas. "Quando se ergue uma vedação por causa do medo, é sinal que já fomos derrotados. Eles alcançaram o objetivo. Espero que este projeto desapareça", sublinha. Acrescenta, contudo, que não acredita que o muro venha a ser concluído.
Somália - Entre o terror e o quotidiano
O país, marcado pela guerra civil e confrontos com a milícia islâmica Al-Shabab, oscila entre o retorno à normalidade e ataques terroristas.
Foto: STUART PRICE/AFP/Getty Images
O regresso à normalidade?
A Somália, um país do Corno de África devastado pela guerra. Depois da brutal guerra civil e a queda do regime de Mohamed Siad Barre, em 1991, o país, já atingido pela pobreza e pelas secas, tornou-se um paraíso para os piratas e radicais islâmicos. A milícia Al-Shabab baniu o futebol. Hoje, este rapaz pode jogar com os soldados da missão da União Africana na Somália, a AMISOM.
Foto: STUART PRICE/AFP/Getty Images
Um novo parlamento para a Somália
Em 2012, as forças da AMISOM, apoiadas por unidades etíopes e somalis, expulsaram os islamistas da Al-Shabab de Mogadíscio e outras grandes cidades. Em Agosto do mesmo ano, o novo parlamento da Somália é juramentado – o primeiro, depois de oito anos de um governo de transição. Por razões de segurança, o evento não tem lugar no Parlamento, mas no aeroporto, um local mais seguro.
Foto: Mohamed Abdiwahab/AFP/GettyImages
Uma vitória de esperança
Em Setembro de 2012, pela primeira vez em 20 anos, o Parlamento elege um novo presidente, Hassan Sheikh Mohamud. Apenas dois dias após a tomada de posse, o presidente escapa a um ataque suicida: diante do seu gabinete improvisado, num hotel, dois bombistas fazem-se explodir. O professor universitário, de 56 anos, muçulmano moderado, foi várias vezes alvo de ataques.
Foto: ABDURASHID ABDULLE ABIKAR/AFP/GettyImages
Libertação das cidades costeiras
Pescadores somalis em Marka, a cerca de 100 km de Mogadíscio, assistem à chegada das tropas da União Africana, em Setembro de 2012. A cidade, no oceano Índico, foi, durante muito tempo, um ponto estratégico da Al-Shabab. No final do mês, os rebeldes deixam a cidade, após combates com soldados quenianos da UA. A missão expulsa também as milícias do seu último bastião, a cidade costeira de Kismayo.
Foto: SIMON MAINA/AFP/GettyImages
Fome, desespero e medo
Receando os radicais islâmicos, muitos civis fogem das áreas controladas pela Al-Shabab. Esta família carregou um camião com os seus pertences. Há quem transporte os seus bens em carros puxados por burros. Por causa da seca e da guerra, muitos somalis sofrem de fome: entre 2010 e 2012, cerca de 260 mil pessoas morreram de fome, de acordo com dados da ONU.
Foto: Mohamed Abdiwahab/AFP/GettyImages
Proteger a população
A presença das tropas da União Africana (UA) na Somália já é normal. As primeiras chegaram em 2007, após uma decisão do Conselho de Segurança da UA no país. Apoiar o governo de transição também fazia parte da missão. A UA garante a segurança dos habitantes de Afgoye, cidade localizada a oeste de Mogadíscio, bem como de 400 mil deslocados.
Foto: STUART PRICE/AFP/GettyImages
Recuperar as áreas rurais
Dezembro de 2012: as tropas da UA avançam para os bastiões rebeldes a norte. 17 mil soldados, no total, participam na luta contra a Al-Qaeda e as milícias da Al-Shabab. Pouco a pouco, as áreas rurais são retomadas pelas tropas e, no geral, a situação de segurança melhorou na Somália. Mas os ataques e atentados ainda são frequentes em Mogadíscio.
Foto: STUART PRICE/AFP/Getty Images
Bombas e tiros em Mogadíscio
Numa altura em que a Somália voltava à normalidade, vários meses depois, uma série de atentados atinge novamente o país. Dois veículos armadilhados explodem em abril de 2013, diante do Palácio da Justiça de Mogadíscio, matando 16 pessoas. Duas semanas mais tarde, um funcionário da justiça e um jornalista são mortos a tiro na rua.
Foto: Mohamed Abdiwahab/AFP/Getty Images
Passo a passo, em direcção à paz
Apesar dos incidentes, a Somália está no caminho da normalidade: desde o início do ano, vários cidadãos somalis regressaram ao seu país. O Reino Unido reabriu uma embaixada em Mogadíscio, depois de 22 anos de encerramento. A ONU decidiu, no início de maio de 2013, enviar peritos para a Somália. Também os ataques piratas ao largo do Corno de África diminuíram significativamente.