"Vinte anos de uma imprensa em declínio"
18 de agosto de 2015 O Centro de Estudos Internacionais da Universidade de Lisboa, lançou, em julho, um livro digital que relata a situação do jornalismo e da liberdade de imprensa em seis paises africanos.
A jornalista angolana, Ana Margoso, foi uma das convidadas a escrever sobre o estado atual da imprensa em Angola.
Margoso cobre temas como a censura na imprensa pública, a violência sobre os jornalistas, a concentração da informação na capital e o regulamento da lei de imprensa no artigo intitulado "Vinte anos de uma imprensa em declínio”. A DW África entrevistou a jornalista.
DW África: Como é ser jornalista em Angola?
Ana Margoso (AM): O jornalista em Angola neste momento corre vários riscos, é detido para cobrir uma manifestação, por exemplo, tem os salários baixos porque a imprensa privada vê-se abraços com muitas dificuldades. Não é fácil ser jornalista em Angola. Outros riscos que corremos são porque ainda vivemos num país não democrático. Com a ausência da democracia está-se logo a ver o que é ser jornalista em Angola.
DW África: Refere no seu artigo a existência de “olheiros” ou “pontas-de-lança” a controlar tudo que é publicado na imprensa pública. Pode explicar o que se trata?
AM: Os olheiros são pessoas que têm um papel preponderante dentro das redações, estão não só na imprensa privada como principalmente na imprensa estatal. São próximos do regime, alguns jornalistas, tem uma missão clara de controlar aqueles jornalistas que não se reveem no atual regime. Eu própria fui chamada quando trabalhava no Novo Jornal por coisas que publicava no facebook e depois disso passei a ser perseguida.
DW África: Angola alcançou definitivamente a paz há 12 anos, mas no que diz respeito à liberdade de expressão estava bem melhor do que está agora.
AM: Parece mentira mas é pura verdade. Eu comecei a trabalhar no Jornal de Angola, no jornalismo em 1997, e lembro que nessa altura havia mais liberdade a nível da redação do Jornal de Angola do que existe hoje. No que toca à liberdade, as pessoas falavam à vontade, criticavam abertamente mas isso já não é possível, dentro do Jornal de Angola fazer uma critica aberta. Estou a falar no Jornal de Angola como na televisão pública (TPA) ou na rádio nacional (RNA).
DW África: Nos dias de hoje, Angola é um dos países mais violentos para os jornalistas. Tem havido registos de jornalistas desaparecidos, alguns acabaram mortos. Que explicação se pode encontrar para esta perseguição aos jornalistas em Angola?
AM: Tem imensos casos, jornalistas que faleceram há quase 20 anos, estou a falar do Ricardo Melo e do Paulo Roberto cujos processos simplesmente pararam. Ninguém sabe, até hoje, quem são os assassinos ou quem são os mandantes desses assassinatos. Fazer jornalismo em Angola não é uma coisa tâo simples como em outros países que não têm um regime antidemocrático como o nosso.
DW África: Os meios de comunicação social estão todos concentrados em Luanda. O que é preciso para impulsionar a descentralização da imprensa?
AM: Nós precisamos para já de pessoas que invistam na imprensa privada. As pessoas têm medo de investir, tem medo de criar rancor com quem está a governar.
DW África: A lei de imprensa está “pendurada” desde 2006, no entanto “o Governo angolano diz que a imprensa está no bom caminho e recomenda-se”.
AM: Exatamente, se ouvirmos outra pessoa a debater o que estou a dizer agora, vai dizer que eu sou mentirosa! A imprensa está muito bem, há pluralidade porque há mais jornais privados e trazem grandes manchetes mas isso não significa que em Angola haja de facto liberdade de expressão, isso é mentira. Como exemplo dou-lhe a Lei de Imprensa, os jornalistas em Angola não têm carteira profissional. Também interessa a quem manda no país que assim seja. Não passa no Parlamento, aliás os próprios deputados dizem que nunca viram essa lei.