Violência policial em África: "As vítimas são os pobres"
Martina Schwikowski | ac
7 de julho de 2020
Após a morte de George Floyd, nos EUA, o debate sobre a violência policial espalhou-se por todo o mundo. Em África, pesquisadores apontam a pobreza e questões étnicas como fatores que influenciam a ação da polícia.
Publicidade
A violência policial é um problema que está na ordem do dia. Depois da morte de Geoge Floyd, no dia 25 de maio deste ano nos Estados Unidos, realizaram-se várias manifestações, um pouco por todo o mundo. Também em Joanesburgo, na África do Sul, em Nairobi, no Quénia, ou em Lagos, na Nigéria, houve protestos da sociedade civil contra a violência policial: milhares de cidadadãos empunharam cartazes com slogans como "Stop Killer Cops" ("Parem os agentes assassinos") ou "I Can't Breathe" ("Não consigo respirar").
Annette Weber, pesquisadora na fundação alemã de ciência e política (Stiftung Wissenschaft und Politik) afirma que "as maiores vítimas da violência policial, nos países africanos, são os pobres e também pessoas pertencentes a minorias étnicas, que em teoria têm os mesmos direitos da maioria, mas que na prática são discriminadas".
"No Quénia, por exemplo", cita a pesquisadora, "os habitantes das faixas costeiras, ou os somalis quenianos, são frequentemente mal tratados pela polícia. Existe, de facto, uma espécie de hierarquia, no que diz respeito aos grupos étnicos".
Violência contra os pobres
Na África do Sul, a DW falou com Gareth Newham, especialista do Instituto de Estudos de Segurança (ISS) em questões de violência policial. Newham explica que, na África do Sul, os polícias, na sua "esmagadora maioria" são negros, assim como as vítimas também são negras.
"Trata-se sobretudo de homens relativamente jovens. Penso que a violência não é motivada por questões raciais. Tem mais a ver com a classe social. A polícia usa a violência simplesmente contra os pobres, independentemente da sua cor. Normalmente, não usa a violência contra um condutor de um carro caro, ou contra um advogado, que tem meios para contra-atacar, recorrendo à justiça".
Spike Lee vê conexão entre violência institucional e racismo
02:51
Raízes coloniais
A violência polícial em África tem causas estruturais e culturais, que têm a ver com a história colonial, afirma ainda a pesquisadora alemã Annette Weber. "As relações entre o Estado e a população são más, desde os tempos coloniais. Um exemplo é o Sudão, que foi colonizado pela Grã-Bretanha, até 1953. Os sucessivos regimes pós-coloniais, inclusivé o de Omar Al-Bashir, foram muito repressivos, tanto ou mais que o regime colonial. O atual Governo de transição poderá ser diferente".
O mesmo se aplica à África do Sul, explica Gareth Newham: "Tortura e violência foram ancoradas no sistema colonial do apartheid. E essa mentalidade passou para a democracia".
O pesquisador salienta que os detentores do poder político têm que assumir as suas responsabilidade pela violência policial. "Temos uma liderança política que não reconhece que há uma crise no exercício de tarefas policiais. As coisas só podem melhorar se a atitude do governo mudar".
A derrocada de símbolos coloniais e racistas
A morte do afro-americano George Floyd incentivou um movimento de derrube de símbolos coloniais em todo o mundo. Manifestantes consideram que as estátuas em homenagem a líderes escravocratas são inapropriadas.
Foto: picture-alliance/empics/B. Birchall
Um gesto contra a escravatura
Uma das primeiras estátuas a serem derrubadas nas manifestações do movimento "Black Lives Matter" ("As vidas negras importam") foi a de Edward Colston, comerciante de escravos do século XVII. Erguido em 1895 no centro de Bristol, no Reino Unido, o monumento de bronze foi jogado ao rio que corta a cidade.
Foto: picture-alliance/empics/B. Birchall
Estátua de Leopoldo II retirada
A cidade de Antuérpia, no norte da Bélgica, retirou uma estátua vandalizada do rei Leopoldo II depois de protestos contra o racismo. Leopoldo II protagonizou muitas das piores atrocidades do colonialismo europeu em África, nomeadamente na atual República Democrática do Congo (RDC).
Foto: Reuters/ATV
Colombo derrubado
Estátuas do explorador italiano Cristóvão Colombo foram derrubadas em várias cidades dos Estados Unidos da América. Na cidade de Richmond, no estado norte-americano da Virgínia, os manifestantes jogaram uma estátua ao chão e envolveram-na numa bandeira em chamas, lançando-a depois a um lago.
Foto: Reuters/Instagram/Videoguns
Estátua de Colombo decapitada
Em Boston, a estátua de Cristóvão Colombo ficou sem cabeça. O monumento no coração da capital do estado de Massachussetts é motivo de controvérsia há muitos anos e já tinha sido vandalizado no passado.
Foto: Reuters/B. Synder
Graffiti em memória de Floyd
Em Miami, no estado norte-americano da Flórida, além de uma estátua de Cristóvão Colombo, um monumento de Juan Ponce de León, outro conquistador espanhol, foi grafitado, incluindo com o nome de George Floyd.
Foto: picture-alliance/AA/E.-A. Uzcategui Trinkl
Manifestantes foram mais rápidos
Em Richmond, nos EUA, os manifestantes derrubaram uma estátua de Jefferson Davis, que foi presidente dos Estados Confederados da América durante a guerra civil. A cidade já tinha planeado retirar a estátua, mas os manifestantes foram mais rápidos.
Foto: Getty Images/AFP/P. Michels-Boyce
Proprietário de escravos
Ainda na cidade de Richmond, manifestantes usaram cordas para derrubar a estátua do general confederado Williams Carter Wickham do seu pedestal, em Monroe Park. O líder pró-confederação norte-americana era proprietário de escravos.
Foto: picture-alliance/AP Photo/A. W. Edlund
Contra jornalista italiano
A estátua do jornalista Indro Montanelli, em Milão, norte da Itália, também foi alvo dos protestos antirracistas. O italiano reconheceu que, nos anos 1960, teve uma "noiva" de 12 anos de idade, vinda da Eritreia.
Foto: Reuters/F. Lo Scalzo
Winston Churchill blindado
Em Londres, manifestantes grafitaram a estátua do antigo primeiro-ministro do Reino Unido, Winston Churchill. O monumento foi depois blindado para evitar novos ataques. No lugar do nome de Churchill, os participantes dos protestos escreveram "was a racist" ("era um racista").
Na Nova Zelândia, a escultura de bronze do comandante militar colonial John Fane Charles Hamilton foi removida da cidade de Hamilton. A iniciativa foi da própria edilidade. As autoridades locais afirmaram que a retirada da estátua se enquadra num esforço mais vasto para eliminar monumentos "considerados representativos de desarmonia e opressão cultural".