Vitória do ANC na África do Sul decepciona analistas
12 de maio de 2014O Congresso Nacional Africano (ANC, na sigla em inglês) conseguiu uma clara vitória nas eleições gerais da última quarta-feira (07.05.14) com 62,15% dos votos, alcançando assim a sua quinta maioria absoluta consecutiva no Parlamento.
Com o resultado, o ANC, há 20 anos no poder, irá reconduzir o seu líder e actual chefe de Estado, Jacob Zuma, ao cargo de Presidente pelos próximos cinco anos.
De acordo com o acadêmico e analista português, José Francisco Pavia, a vitória esmagadora do ANC prova, mais uma vez, o receio dos africanos em afastar os partidos que lutaram pela independência de seus países.
"Eu diria que em Moçambique é a mesma coisa, em Angola é a mesma coisa e, dependendo, em outros países será a mesma coisa," afirma.
O acadêmico explica que a democracia consiste não apenas na realização de eleições periódicas, mas também na alternância democrática.
"Alternância com alternativas. Não havendo alternância democrática - como tem acontecido em Moçambique, em Angola e na África do Sul - isso acaba por levar ao cansaço dos eleitores," considera.
Elevada insatisfação popular
O chefe do Departamento de Direito Constitucional, Internacional e Público da Universidade da África do Sul (Unisa), o acadêmico alemão Andre Thomashausen, destaca que o ANC não resolveu os problemas do povo.
"A estabilidade da África do Sul nunca foi garantida e vê-se que há grandes rupturas sociais, grandes rupturas económicas," diz.
"A África do Sul, hoje, é o país com o pior índice de Gini, que é o índice que dá uma medida da distância entre a maioria da população pobre e os ricos dessa população," acrescenta.
Exatamente devido à elevada onda de insatisfação popular no país, José Francisco Pavia caracteriza a vitória do ANC como surpreendente.
"Como nós sabemos, existe uma enorme taxa de desemprego, existe uma série de questões que não são resolvidas na África do Sul e esperar-se-ia que eventualmente essa insatisfação fosse canalizada através do voto, que eventualmente poderia, digamos, capitalizar essa insatisfação," avalia.
Como isso não aconteceu, o acadêmico português considera o resultado "um pouco decepcionante."
Evasão do capital estrangeiro
Para Andre Thomashausen, com o Congresso Nacional Africano no poder, os países vizinhos poderão beneficiar de um possível remanejamento dos investimentos estrangeiros.
"O endurecimento da vaga das greves - que já se alastra desde há seis meses - e como consequência, possivelmente, uma fuga ou saída do capital investido no setor mineiro, o que poderá beneficiar diretamente os países vizinhos, especialmente Moçambique e Zimbábue."
Thomashausen defende ainda que a existência de uma hegemonia sul-africana ganhou vida somente na imaginação dos políticos do país, "porque na realidade económica, hoje em dia, um país como Angola já tem um peso e uma influência dentro da União Africana talvez até superior à África do Sul e Moçambique está em boas vias de conseguir um estatuto muito semelhante ao de Angola, com a concretização da exploração do gás natural."
Refira-se que mais de 73% dos 25 milhões de cidadãos registados para votar compareceram às urnas na África do Sul.