Não estão esquecidos os moçambicanos assassinados na África do Sul há dois anos numa onda de violência xenófoba. Agora, pequenos comerciantes somalis voltaram a ser vítimas de ataques na cidade de Joanesburgo.
Publicidade
A xenofobia permanece uma realidade na África do Sul. Pelo menos é esta a conclusão a que chegam analistas e ativistas, na sequência de renovada violência contra pequenos comerciantes estrangeiros no bairro do Soweto na cidade de Joanesburgo.
A pretexto que estavam a vender produtos falsos e alimentos pós-prazo de validade, residentes do bairro de Soweto atacaram pequenos comerciantes, na sua maioria imigrantes somalis. O somali Amir, que não quis dar o seu nome completo por medo de retaliação, disse à DW: "Pensei que me iam matar. Alguém me arrastou para fora da loja e atirou-me para o chão e quatro homens começaram a dar-me pontapés”.
Governo diz que não se trata de xenofobia
Mais de cem pessoas atacaram e espancaram Amir e pilharam a sua loja. O secretário geral da associação somali na África do Sul, Abdirizak Ali Osman, rejeita acusações de venda de produtos falsos: "Tudo isto começou por causa de um vídeo que circulou nas plataformas sociais online. Nenhuma autoridade responsável verificou o conteúdo. Nas plataformas sociais há muita gente que diz que não quer estrangeiros no township e apela para que sejam expulsos”.
Mas Lebogang Maile, membro do Conselho Executivo para o Desenvolvimento Económico de Gauteng, diz que a comunidade está genuinamente preocupada com a venda de produtos falsos: "Temos que examinar os casos para perceber onde estas coisas estão a ser fabricadas e as autoridades competentes devem tomar medidas imediatas”.
Ativistas responsabilizam autoridades por inércia
Xenofobia persiste na África do Sul
Por seu lado, O Governo insiste que não se trata de ataques xenófobos, mas apenas de conflitos gerados pela competição por recursos e oportunidades de vida. Thifulifeli Sinthumule, diretor do Consórcio de Refugiados e Imigrantes na África do Sul, discorda. O ativista acusa o Governo de fechar os olhos à realidade xenófoba para não ter que combatê-la: "Os residentes dizem que não querem lá "aquelas pessoas”. É óbvio que se estão a referir aos imigrantes que normalmente chamam de estrangeiros. Ou seja, no terreno as pessoas rejeitam os imigrantes”.
Loren Landau, diretor do Centro Africano para a Migração e Sociedade na Universidade de Witwatersrand em Joanesburgo, deteta premeditação por detrás de grande parte da violência. Segundo o pesquisador, muitas vezes são os próprios políticos locais que organizam esses ataques, e depois distribuem os bens pilhados entre os seus adeptos para angariar votos: "Suspeito que é o que está a acontecer também”.
A violência xenófoba contra imigrantes e refugiados africanos na África do Sul é recorrente. Em 2008, 60 morreram numa onda de violência xenófoba e outros seis foram massacrados em 2015, incluindo dois cidadãos moçambicanos.
Há cada vez mais deslocados no centro de Moçambique
Cerca de 6.000 pessoas estão alojadas em centenas de tendas distribuídas por quatro centros de acomodação do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INCG) nos distritos de Gondola, Vanduzi, Mossurize e Báruè.
Foto: DW/B. Jequete
Fugir à guerra
Mais de mil pessoas chegaram em setembro e outubro de 2016 ao novo centro de acolhimento de Vanduzi, na província de Manica, onde se avolumam as queixas. Fogem do conflito que opõe as forças governamentais aos homens armados da RENAMO, por medo de serem atingidas pelas hostilidades. Dezenas de cidadãos ficaram sem casa na sequência de incêncios provocados por grupos rebeldes.
Foto: DW/B. Jequete
Deslocados de todas as idades
As autoridades abriram o centro de acolhimento de Vanduzi recentemente face ao número crescente de ataques armados na região. Aqui, vivem adultos, idosos, jovens e crianças que foram obrigados a abandonar a escola. Feniasse Mateus está a faltar às aulas. "Viemos para aqui com a família, estou há um mês sem estudar", lamenta.
Foto: DW/B. Jequete
Sem água potável
Em Vanduzi, onde foi acolhida, Fátima Saíde queixa-se das fracas condições, nomeadamente pela inexistência de água potável. "Estamos a sofrer por causa da água, estamos a beber água suja, cheia de capim e de bichos. Têm-nos dado cloro para pormos na água e bebermos". Segundo esta deslocada, a água é retirada de furos tradicionais e charcos.
Foto: DW/B. Jequete
Risco de doenças
A falta de água própria para consumo a somar à falta de condições de higiene preocupa estes milhares de deslocados. Fátima Saíde, teme por exemplo, a eclosão de doenças como a cólera e os surtos de diarreia aguda. Por outro lado, a seca na região agrava as dificuldades.
Foto: DW/B. Jequete
Mais de uma centena de famílias deslocadas em Vanduzi
Os deslocados do novo centro de Vanduzi, criado no início de outubro inicialmente com 125 famílias, são provenientes de Nhamatema, Punguè Sul, Chiuala, Honde, Guta, Mucombedzi, Pina, cruzamento de Macossa, Mossurize, Dombe e Chemba, zonas críticas e agora despovoadas, onde são frequentes relatos de confrontos entre as forças governamentais e o braço armado do principal partido da oposição.
Foto: DW/B. Jequete
Uma fuga pela defesa e segurança
Joaquim Abril Jeque condena o clima de terror no centro do país que, na sua opinião, é culpa dos homens armados da RENAMO (Resistência Nacional Moçambicana). "Achámos conveniente fugir à procura de defesa", conta este deslocado. Segundo ele, as ameaças da RENAMO são constantes. "Ameaçam-nos com armas, matam os nossos animais, levam a nossa comida, agridem as nossas mulheres", exemplifica.
Foto: DW/B. Jequete
"Toneladas" de bens de apoio a caminho
Cremildo Quembo, porta-voz do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC), diz que as autoridades estão a ajudar como podem as famílias deslocadas, em Vanduzi. "De salientar que este processo de assistência às famílias é contínuo e já estão a entrar toneladas [de bens de apoio] para todos os distritos afetados", garante o responsável.
Foto: DW/B. Jequete
Falta de espaço
Devido à insuficiência de tendas, duas ou mais famílias são obrigadas a conviver na mesma barraca de seis metros quadrados. Rostos tristes e lábios rasgados denunciam a pobreza e a fome. A maioria destes deslocados dependem apenas da distribuição de alimentos do INGC, que definem no entanto como "irregular".
Foto: DW/B. Jequete
Faltar à escola
Para além do trauma e do medo constante, a escalada do conflito interno em Moçambique terá outras consequências no futuro das crianças do centro do país. Chinaira José é uma de várias centenas de estudantes que ao serem obrigados a sair da sua zona de residência têm de faltar às aulas, pondo em risco a sua formação escolar.