Na Zambézia, há relatos de famílias a dormir com 10 pessoas numa tenda. O material distribuído pelo Governo não chega para todos e gera polémica. Há quem pense em abandonar o centro de acomodação.
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Na província moçambicana da Zambézia, a falta de material para a construção de casas próprias para as vítimas do ciclone Idai está a gerar tumultos. Tem havido problemas nos centros de acomodação em Nicoadala e em Namacurra, onde estão a ser distribuídos terrenos para habitação das famílias deslocadas. As autoridades dizem que fazem os possíveis, mas não conseguem satisfazer a todos.
"O material de abrigo é constituído por duas lonas, um 'kit' que contém cordas, enxadas, catanas, arames recozidos e outras ferramentas que possam ajudar os afetados a iniciar o processo de construção. Neste momento, estamos a precisar de muito apoio em lonas", afirmou Milton Barbosa, chefe da logística do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC) na província.
A Zambézia, na região centro de Moçambique, é uma das quatro províncias afetadas pela passagem do ciclone Idai a 14 de março.
Falta quase tudo
De acordo com o responsável do INGC, no mínimo, são necessárias com urgência 5.000 lonas para as famílias afetadas que estão sem abrigo. Segundo as autoridades, já foram atribuídos perto de mil terrenos a 2.500 famílias que se encontram nos centros de acomodação nos distritos de Nicoadala, Namacurra e Maganja da Costa, na província de Zambézia.
O problema é que não há material suficiente para os desalojados construírem as suas casas nos lugares estabelecidos pelo Governo. E não é só o material de construção que não chega para todos. Também há relatos de falta de comida e de utensílios domésticos.
"Estamos a sofrer, as pessoas que não sofrem são as que estão a engordar. Veio uma brigada que estava a distribuir material. Estamos a perder muitas coisas. Pessoalmente, não recebi manta, enxada, panelas também não temos. Isso é um problema para nós que viemos para aqui pelo sofrimento e não por vontade," descreve uma das vítimas.
10 pessoas dormem numa tenda
Entretanto, alguns realojados já pensam em abandonar os centros de acomodação e voltar às zonas de origem, devido à disparidade na distribuição de donativos.
Zambézia: Material distribuído a vítimas do Idai não chega
"Estamos a dormir 10 pessoas numa tenda, com crianças e maridos no mesmo sítio. Temos crianças e estamos a sofrer aqui. Recebemos milho só ontem, pessoas dormem sem comer, estamos a chorar. Se quiser, que nos digam para continuarmos nas nossas zonas. Temos que sair daqui porque não há meios para sobrevivemos," relata uma mãe, que se encontra no centro de acomodação com a família.
"A vida é assim aos empurrões. Estamos aqui há dois meses e ainda não temos nada. Estamos desamparados. Sobre alimentação, mais ou menos o que eles conseguem dão-nos, não há maldade," conta outra vítima.
Milton Barbosa, do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC), diz que as reivindicações são normais.
"Nós, como INGC, temos estado a envolver todos. É claro que, na comunidade, os produtos, da forma como vão sendo geridos, não chegam a ser da mesma maneira. Há uns que consomem mais e outros consomem menos num determinado tempo," diz Barbosa.
Beira: Depois da tempestade, a reconstrução
A Beira tenta reerguer-se após o ciclone Idai. Autoridades e habitantes estão focados na limpeza da cidade e na reabilitação de infraestruturas.
Foto: DW/A. Kriesch
Beira em obras
Seis semanas depois da passagem do ciclone Idai, reconstruir é palavra de ordem na Beira. Quase todos os telhados foram arrancados ou danificados. O Banco Mundial estima em 2 mil milhões de dólares (1,78 mil milhões de euros) os prejuízos nos países afetados - Moçambique, Malawi e Zimbabué.
Foto: DW/A. Kriesch
Viver sem teto
André Lino ficou sem telhado à passagem do ciclone e não tem como pagar um novo. Vive aqui com a família desde 1977, a 100 metros da praia. "O mar está a aproximar-se", afirma. "Isso assusta-me". Se tivesse dinheiro suficiente, ia-se embora, conta.
Foto: DW/A. Kriesch
O mar cada vez mais perto
Partes da Beira estão abaixo do nível do mar. No passado, a cidade sofreu várias vezes com graves inundações. E há ameaça de novos desastres: o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) das Nações Unidas estima que o nível do mar deverá subir entre 40 a 80 centímetros até 2100.
Foto: DW/A. Kriesch
Cabanas frágeis à beira-mar
Os habitantes das zonas mais pobres da cidade, como a Praia Nova, foram os mais afetados. As suas cabanas desmoronaram-se rapidamente. Muitos pescadores também perderam os seus barcos devido ao ciclone.
Foto: DW/A. Kriesch
Projeto de gestão das águas contra as cheias
No centro da cidade, foram construídos há alguns anos milhões de quilómetros de canais e estruturas para controlar as marés, com a ajuda do banco estatal alemão de desenvolvimento KfW. A instituição contribuiu com 13 milhões de euros para o financiamento dos trabalhos de construção.
Foto: DW/A. Kriesch
Menos danos graças à cancela
"No dia do ciclone, começou também a chuva", lembra Eduardo dos Santos, que opera uma das cancelas construídas para proteger a Beira de inundações. "Abrimos as comportas para que a água pudesse regressar ao mar. Se não o tivéssemos feito, teria havido cheias ainda piores na cidade".
Foto: DW/A. Kriesch
Edil contra as mudanças climáticas
"Já estamos habituados a inundações", diz o edil Daviz Simango. "Mas um ciclone assim foi algo novo para nós. Agora, temos de reagir". Simango está a organizar uma conferência de doadores na Beira, em junho. O edil espera angariar fundos para preparar a cidade para as mudanças climáticas.
Foto: DW/A. Kriesch
Trabalhos de limpeza continuam
As autoridades continuam empenhadas em restaurar a ordem. Em algumas zonas da cidade já há eletricidade e água corrente. Noutras áreas ainda são visíveis os destroços causados pelo ciclone.
Foto: DW/A. Kriesch
Uma frente de voluntários
Voluntários como Magdalena Louis ajudam nos trabalhos de reconstrução. Há várias semanas que está aqui a trabalhar e, em troca, a cidade da Beira dá-lhe apenas o almoço. "Só quero que a nossa cidade esteja limpa outra vez. Ninguém tem de me pagar por isso", afirma.
Foto: DW/A. Kriesch
Campos de refugiados na cidade
Há organizações humanitárias de todo o mundo por toda a cidade. Milhares de pessoas continuam a viver em tendas e a depender de ajuda alimentar. A saúde também é uma preocupação: a Beira foi atingida por uma crise de cólera e registam-se vários casos de malária.
Foto: DW/A. Kriesch
Sem colheitas, não há comida
Nos arredores da Beira, o ciclone destruiu grandes áreas de cultivo. "Todo o milho, todo o arroz... foi-se tudo", conta a agricultora Elisa Jaque, de 61 anos. Já está a plantar novamente, mas só dentro de seis meses deverá voltar a ser capaz de alimentar a sua família.
Foto: DW/A. Kriesch
Regresso à rotina
Apesar de tudo, há sinais de regresso à rotina e à normalidade. Um jogo amigável do Grupo Desportivo da Companhia Têxtil do Púnguè atrai centenas de adeptos - apesar de o telhado do estádio ter sido também atingido pelo Idai.
Foto: DW/A. Kriesch
Rumo à normalidade
Quem não pode pagar o bilhete para ver o jogo, encontra soluções criativas. À volta do estádio, mini-autocarros e carrinhas estacionados funcionam como bancadas improvisadas gratuitas. O cenário deve repetir-se no fim de semana, com o arranque do Moçambola e o Têxtil do Púnguè - União Desportiva do Songo agendado para 27 de abril.