Zimbabué: Líder da oposição Tendai Biti enfrenta tribunal
Reuters | AP | Lusa | cvt
10 de agosto de 2018
Dirigente da oposição zimbabueana Tendai Biti começou quinta-feira a ser ouvido em tribunal. Detido após extradição pela Zâmbia, ex-ministro é acusado de incitar à violência e declarar resultados eleitorais não oficiais.
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Tendai Biti pediu asilo na vizinha Zâmbia na quarta-feira (08.08), mas as autoridades de Harare entregaram-no ao Zimbabué, apesar de uma ordem judicial determinar que não deveria ser deportado até que o seu pedido de asilo fosse avaliado.
De volta ao Zimbabué, o político, cujo Partido Democrático do Povo formou uma aliança eleitoral com o Movimento pela Mudança Democrática (MDC), liderado por Nelson Chamisa, foi detido. "Vamos continuar a lutar", disse Biti à entrada do tribunal, em Harare, a capital.
"É uma pena que em África não respeitamos o Estado de Direito, os padrões internacionais, mas nós sobrevivemos e vivemos para lutar mais um dia", declarou o antigo ministro das Finanças.
Eleições históricas no Zimbabué
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A acusação de incitação à violência pública pode levar a uma pena de prisão até dez anos. A declaração de resultados não oficiais pode resultar em seis meses de prisão.
"Ele tem de pagar 5.000 dólares, deve entregar o seu passaporte e os títulos de uma das suas propriedades em Harare e também lhe foi ordenado que não interfira com as testemunhas", explica o advogado Denford Halimani.
Logo após a audiência, Emmerson Mnangagwa disse que o político tinha sido libertado após a sua intervenção, mas não deu detalhes. No Twitter, o Presidente zimbabuenao disse que o caso continuaria "devido à natureza séria das alegações" e apelou a todos os partidos para pararem com o incitamento à violência.
Violação do direito internacional
Em reação ao retorno forçado de Biti ao Zimbabué, o porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), Babar Baloch, chamou a ação para uma séria violação do direito internacional e das leis da Zâmbia. "Estamos seriamente preocupados com o futuro e a segurança de Tendai Biti", declarou.
Zimbabué: Líder da oposição Tendai Biti enfrenta tribunal
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David Coltart, membro do MDC e advogado dos direitos humanos, lembra que Biti foi preso em 2008 por uma acusação semelhante e "brutalmente torturado".
Levantam-se, por isso, preocupações de que o Governo do Presidente Emmerson Mnangagwa tratará a oposição com a mesma severidade do seu antecessor Robert Mugabe, apesar das promessas de reformas.
Contestação judicial dos resultados
O Departamento de Estado dos Estados Unidos declarou que o país "convocou" os embaixadores do Zimbabué e da Zâmbia "para registrar as mais graves preocupações" e que revisaria sua cooperação com o Governo da Zâmbia.
Uma declaração conjunta dos chefes de missão no Zimbabué da União Europeia, Estados Unidos, Canadá e Austrália pediu urgentemente às autoridades zimbabueanas que garantam a segurança de Biti e respeitem os seus direitos.
A oposição diz que está a preparar uma contestação legal dos resultados eleitorais que deram a vitória a Mnangagwa e que considera fraudulentos. O prazo final para a formalização desta ação termina esta sexta-feira (10.08).
De herói a vilão: a vida de Robert Mugabe
Depois de 37 anos no poder, chega ao fim a governação do humilde camponês que se tornou, aos olhos de muitos, um ditador. Robert Mugabe renunciou à Presidência do Zimbabué.
Foto: picture-alliance/abaca/G. Buthaud
Origens humildes
Nascido, em Harare, no seio de uma família humilde – o seu pai era carpinteiro e a sua mãe professora – Robert Gabriel Mugabe foi educado numa escola jesuíta até se tornar professor primário. Entre os anos de 1942 e 1960, exerceu na antiga Rodésia, Zâmbia e no Gana. Estudou Inglês, História, Educação e tirou uma licenciatura em Economia, na Universidade de Londres.
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Uma década detido
Aos 36 anos, Mugabe dá inicio à sua luta política focada na independência da Rodésia do Sul do Reino Unido. Funda a União Nacional Africana do Zimbabué – Frente Patriótica (ZANU-PF) em 1963 e, um ano depois, é preso. Em 1974, altura em foi libertado, Mugabe vai para Moçambique, onde liderou uma guerrilha contra o Governo de minoria branca de Ian Smith. Em 1979, Mugabe voltou ao seu país.
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Mugabe torna-se primeiro-ministro
Em 1980, Robert Mugabe é eleito primeiro-ministro da ex-Rodésia do Sul. Em abril deste ano, é declarada a independência do país que passa a chamar-se “Zimbabué”. Na altura, Mugabe afirmou: "O facto de os brancos nos terem oprimido no passado quando detinham o poder jamais poderá justificar que, hoje, os negros os oprimam só porque agora detêm o poder".
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Povo esperançoso
A subida de Mugabe ao poder trouxe a esperança. O líder do ZANU-PF prometeu melhorias na vida dos cidadãos. Começou por introduzir o ensino primário gratuito, assim como o acesso a assistência médica básica para os mais desfavorecidos, ainda que estas medidas apenas tenham chegado a uma parte da população. Mugabe foi mesmo comparado a Nelson Mandela.
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Chegam os massacres
Dois anos mais tarde, em 1982, Mugabe rompe a coligação do seu partido (ZANU-PF) com a União Popular Africana do Zimbábue (ZAPU) de Joshua Nkomo. Nesta disputa pelo poder, Nkomo teve o apoio das etnias Ndebele. É nesta altura que tem lugar um dos piores massacres que o país tem memória. As forças armadas leais a Mugabe cometeram atrocidades, matando cerca de 20.000 civis.
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Mugabe a Presidente
Em 1987, Mugabe torna-se Presidente do Zimbabué. Já aqui se falava na deterioração do seu estado de saúde. No entanto, o sexagenário deixava claro que a reforma não estava para breve: “O partido irá encontrar um sucessor. Eu vim do povo. O povo na sua sabedoria irá selecionar alguém, assim que eu diga que me vou aposentar. Mas ainda não é altura. Nesta idade ainda posso seguir em frente”, disse.
Foto: picture-alliance/AP Photo
Um homem, várias perspetivas
Em 1994, enquanto milhares de cidadãos do Zimbabué continuavam dependentes de ajuda humanitária, não tendo acesso aos cuidados básicos, o presidente era distinguido pela Coroa britânica, em Londres. No Zimbabué, os primeiros protestos deixavam perceber que no país não havia motivo de orgulho no Presidente. No final dos mesmos anos 90, as manifestações contra o poder começaram a intensificar-se.
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A trágica reforma agrária
Em resposta ao descontentamento social, Mugabe lança a reforma agrária no início de 2000, uma medida que levou à nacionalização forçada das propriedades agrícolas que pertenciam à população branca para serem redistribuidas pelos negros. No entanto, os mais beneficiados foram a família de Mugabe e a elite partidária do ZANU-PF que ficaram com várias explorações. A produção agrícola caiu muito.
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"Deixem-me ser Hitler vezes dez"
Até aqui, Mugabe já tinha ganho as eleições de 1984, 1990 e 1996. A cada nova eleição sucediam-se as acusações de fraude, o que fez com que, em 2002, os Estados Unidos e a União Europeia aplicassem sanções ao país. Aos que o apelidavam de ditador, disse: "Sou o Hitler da nossa época. O Hitler que tem por objetivo a justiça para o povo. Se isso é ser um Hitler, deixem-me ser Hitler vezes dez".
Foto: picture-alliance/dpa
"Fatídico" 2008
Em 2008, Mugabe perdeu mesmo a maioria no Parlamento, tendo o Movimento para a Mudança Democrática (MDM) de Morgan Tsvangiari conseguido um maior número de lugares. As eleições ficaram marcadas pelo elevado número de mortes em consequência de confrontos. O ano de 2008 ficou ainda marcado pela inflação, que atingiu valores recorde, e pela epidemia de cólera que matou milhares de zimbabueanos.
Foto: dpa
Aniversários excêntricos
Do percurso do vilão não se esquecem também as famosas festas de aniversário. Enquanto grande parte do seu povo vivia na miséria, Mugabe exibia a sua excentricidade. No seu 93º aniversário, comemorado este ano, estima-se que Mugabe tenha gasto cerca de 1,9 milhões de euros numa festa que contou com cem mil convidados. Na mesma altura, cinco milhões de zimbabueanos dependem de ajuda internacional.
Foto: Getty Images/AFP/J. Njikizana
Grace, a não sucessora
Em 2015, começa a falar-se da possibilidade da primeira-dama, Grace - segunda mulher de Mugabe, 40 anos mais nova, e que já mantinha um caso com o Presidente enquanto era sua secretária - poder ser a sua sucessora. O que intensificou os conflitos dentro do ZANU-PF. Emmerson Mnangagwa, o vice de Mugabe, foi humilhado e demitido de funções e fugiu do país após um braço-de-ferro com Grace Mugabe.
Foto: Reuters/Philimon Bulawayo
15 de novembro de 2017 - o início do fim
Na festa dos seus 93 anos, em fevereiro, Mugabe nem sonhava o que 2017 tinha reservado para si. Em outubro, foi eleito embaixador da boa vontade da Organização Mundial da Saúde, mas uma chuva de críticas internacionais fez com que a nomeação fosse retirada. Cerca de um mês depois, militares próximos de Mnangagwa protagonizavam um aparente golpe de Estado que culminou com a detenção do Presidente.
Foto: Reuters/Zimpapers/J. Nyadzayo
Adeus Mugabe
A 19 de novembro esperava-se que Mugabe anunciasse a sua demissão depois de ter sido deposto da liderança do seu partido. Mas, num discurso à nação, rejeitou que a intervenção militar no país tenha sido "um desafio" à sua "autoridade como chefe de Estado". Dois dias mais tarde, foi anunciada a sua renúncia, ao mesmo tempo que o Parlamento debatia uma moção de censura contra o agora ex-governante.