Zimbabué: Opositores do Governo queixam-se de perseguição
Lusa | AP | mc
15 de setembro de 2020
Movimentos de direitos humanos acusam Governo de aproveitar a pandemia para "silenciar e punir" críticos. Opositores estão a ser alvo de detenções arbitrárias, perseguições e agressões, denunciam organizações.
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Vários movimentos de defesa dos direitos humanos estão a denunciar a perseguição dos que se manifestam contra o Governo do Zimbabué, seja através das redes sociais, de cantigas, pela escrita ou numa simples conversa de bar. As mesmas fontes dão conta de vários processos em tribunal, raptos e torturas.
Godfrey Kurauone, um oficial da oposição do Zimbabué, cantou uma canção de protesto no funeral de um membro do partido, em julho. Por isso, e por outras acusações políticas, passou 42 dias na prisão.
Hopewell Chin'ono, um jornalista de investigação que usou a sua conta na rede social Twitter para expor a alegada corrupção governamental, foi detido na famosa prisão de segurança máxima de Chikurubi durante quase seis semanas, antes de lhe ser concedida fiança sob a acusação de incitar à violência por ter manifestado no Twitter o seu apoio a um protesto antigovernamental.
Também o internacionalmente aclamado autor e cineasta Tsitsi Dangarembga passou uma noite na prisão por estar ao pé de uma estrada de Harare e segurar um cartaz, no qual se lia: "Queremos melhor" e "reformar as nossas instituições".
Todos enfrentam processos em tribunal por desafiarem publicamente o Governo.
Aproveitamento da pandemia?
A deterioração da economia do Zimbabué e os relatos de alegada corrupção envolvendo a aquisição de equipamento de proteção contra a Covid-19 e de medicamentos têm alimentado a raiva das pessoas contra um Governo que prometeu reformas e prosperidade quando tomou o poder em 2017.
Os defensores dos direitos humanos acusam o Governo de usar as restrições impostas para combater o novo coronavírus para suprimir as críticas políticas.
"Enquanto o bloqueio do Governo [devido à pandemia] foi prolongado indefinidamente, as violações dos direitos humanos têm aumentado constantemente, sugerindo que o Governo está a utilizar a Covid-19 como cobertura para violar as liberdades fundamentais e atacar os opositores", disse o grupo local de direitos humanos Zimrights, numa declaração conjunta com a Federação Internacional para os Direitos Humanos.
Críticos silenciados
Funcionários da oposição, grupos de direitos humanos e alguns analistas acusam o Presidente Emmerson Mnangagwa de abusar dos direitos dos críticos, utilizando táticas tão duras como o seu antecessor, o falecido Robert Mugabe.
Mnangagwa e os seus funcionários negam as acusações, afirmando que levaram a cabo reformas democráticas e que se justificam as medidas contra pessoas que procuram derrubar ilegalmente o Governo.
Dezenas de pessoas - incluindo advogados, jornalistas, enfermeiros, médicos, deputados da oposição e ativistas dos direitos humanos - foram detidos e acusados de violar as regras de confinamento por causa da pandemia, ou de protestar nas ruas e nas redes sociais.
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Violação de direitos humanos
A organização ZimRights afirma ter registado 820 violações dos direitos humanos, tais como detenções arbitrárias, agressões por agentes estatais, ataques a jornalistas, raptos, agressões com tiros e mordidas de cães entre o final de março, quando o confinamento foi introduzido, e 9 de agosto.
"Estes casos revelam uma tendência de violação dos direitos humanos que visam esgotar moralmente, silenciar, punir, empobrecer, por vezes ferir fisicamente os indivíduos visados e expô-los ao risco de contrair o vírus nas prisões", disse a Zimrights.
Um grupo de advogados que afirma ter representado cerca de 60 pessoas acusadas de insultar o Presidente desde que Mnangagwa assumiu o poder refere que nem sequer é seguro criticar o chefe de Estado nos bares, nos transportes públicos ou nos meios de comunicação social.
Zimbabué: Onde estão os sinais de mudança?
05:15
Abuso de poder?
"Estamos a assistir a uma tendência cada vez mais preocupante em que as autoridades estão a abusar da lei para perseguir pessoas com opiniões diferentes das do estabelecido", disse Kumbirai Mafunda, porta-voz da Zimbabwe Lawyers for Human Rights, que está a proporcionar advogados a muitos dos detidos.
As autoridades, acrescentou, "estão a utilizar a prisão preventiva como forma de punição", apontando os casos em que é negada fiança às pessoas presas por longos períodos.
Outros críticos do Governo têm enfrentado ataques verbais insultuosos. O porta-voz do partido no poder, Patrick Chinamasa, chamou "bandido" ao embaixador norte-americano Brian Nichols.
Os bispos católicos do país foram apelidados de "diabinhos" pelo ministro da Informação, enquanto o Presidente os desafiou a formar o seu próprio partido, depois de terem emitido uma carta pastoral acusando o Governo de má gestão política e económica.
"Não há crise no Zimbabué"
A esperança de que a vizinha África do Sul, a potência económica da região, ajude a encontrar uma resolução desapareceu após uma delegação do Congresso Nacional Africano, no poder, ter vindo ao Zimbabué, mas só se ter encontrado com funcionários do partido governante e não com a oposição nem com as organizações cívicas.
Mnangagwa disse aos representantes do ANC que não há crise no Zimbabué que precise de intervenção e que os sul-africanos não se iriam encontrar com a oposição nem com as organizações não governamentais.
Chinamasa, o porta-voz do partido no poder, avisou na semana passada os líderes da oposição, afirmando que "não devem ser como crianças a brincar com o fogo" e ameaçou o principal partido da oposição, Aliança MDC, de treinar "renegados" no estrangeiro "para virem e causarem a desordem e a violência".
O presidente da Aliança MDC, Nelson Chamisa, negou as acusações. "Faz tudo parte das táticas para nos aniquilar. Estamos a ser tratados como uma organização proibida, não podemos sequer realizar reuniões sem correr o risco de ser presos", disse à agência de notícias Associates Press, apelando aos países vizinhos para "ajudarem a resolver a crise".
África 2019: Entre dívidas ocultas, ataques e revoluções
2019 em África foi marcado por novos começos e catástrofes. Em Moçambique houve ciclones, dívidas ocultas, eleições e ataques armados, apesar do novo acordo de paz. A Guiné-Bissau foi às urnas eleger um novo Presidente.
Foto: picture-alliance/dpa/T. Mukwazhi
Ciclones Idai e Kenneth
Dois ciclones atingiram a África Oriental este ano. Em março e abril, ciclones devastaram áreas inteiras de Moçambique, Madagáscar, Zimbabué, Malawi, Tanzânia e Comores. Mais de 1.400 pessoas morreram, muitas ainda estão desaparecidas e milhares perderam os seus meios de subsistência. Após o desastre, um surto de cólera atingiu as zonas por onde os ciclones passaram.
Foto: Reuters/M. Hutchings
Félix Tshisekedi é o novo Presidente congolês
O novo Presidente da República Democrática do Congo, Félix Tshisekedi, tomou posse no início do ano. O resultado desta eleição caótica foi considerado controverso. Tshisekedi prometeu grandes reformas, como o combate aos rebeldes no leste do país. Mas após um ano a esperança esmoreceu: Tshisekedi é apelidado de "fantoche" do ex-Presidente Joseph Kabila, que governou o país durante 18 anos.
Foto: picture-alliance/AP Photo/J. Delay
Um segundo mandato para Buhari
Na Nigéria, o atual Presidente Muhammadu Buhari venceu novamente as eleições com mais de três milhões de votos. Buhari tem-se dedicado particularmente à pobreza e à segurança. Temas mais do que necessários, já que o grupo terrorista Boko Haram continua a atacar no norte do país. Além disso, conflitos entre pastores e agricultores originaram centenas de mortes, também em países como Mali e Níger.
Foto: Bayo Omoboriwo
A revolução sudanesa
O sudanês Alaa Salah tornou-se uma figura simbólica da revolução. O aumento dos preços dos alimentos e a difícil situação económica levaram a protestos em todo o país. Em abril, o Presidente Omar al-Bashir foi deposto depois de governar por quase 30 anos. Um Governo de transição de militares e civis está a preparar o caminho para as eleições. Durante as manifestações, dezenas de pessoas morreram.
Foto: Getty Images/AFP
Uma surpreendente Taça das Nações Africanas
A maior surpresa do CAN deste ano foi provavelmente a equipa de Madagáscar. Ao vencer a Nigéria e a República Democrática do Congo, chegaram aos quartos de final. Entretanto, a Argélia venceu o Senegal na final. O Senegal nunca ganhou um CAN até agora. O torneio foi originalmente planeado para decorrer nos Camarões, mas foi transferido para o Egito devido a distúrbios políticos naquele país.
Foto: Getty Images/AFP/M. El-Shahed
Epidemia de ébola na RDC
Desde agosto de 2018, a República Democrática do Congo enfrenta uma das maiores epidemias de ébola: mais de 3.300 casos já foram registados, dois terços dos quais fatais. Em novembro, o Uganda confirmou o fim da epidemia no distrito de Kasese, na fronteira com a RDC. Uma vacina ainda não aprovada contra o vírus tem-se mostrado bem-sucedida e os medicamentos para aqueles já infetados também.
Foto: picture-alliance/dpa/AP Photo/Medecins Sans Frontieres/J. Wessels
Repatriamento de congoleses em Angola
Milhares de congoleses regressaram a casa depois de se refugiarem em Angola desde 2017 devido aos conflitos na província congolesa do Cassai. O repatriamento começou de forma espontânea, mas em setembro o processo foi organizado e acompanhado pelas autoridades angolanas e pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR).
Foto: Getty Images/AFP/S. Kambidi
Primeiro-ministro etíope vence Nobel da Paz
O primeiro-ministro da Etiópia fez as pazes com a vizinha Eritreia após décadas de conflitos. Por isso, Abiy Ahmed recebeu o Prémio Nobel da Paz. Além disso, conseguiu estabilizar a situação no país dividido em 80 grupos étnicos diferentes, libertou milhares de presos políticos, introduziu reformas económicas e nomeu mulheres para metade do seu gabinete.
Foto: Ethiopian Prime Minister Office
Conflito em Moçambique
O Presidente Filipe Nyusi foi reeleito com uma grande maioria, mas a RENAMO rejeitou os resultados e acusou Nyusi e a FRELIMO de "grande fraude eleitoral". Até 1992, os dois partidos travaram uma brutal guerra civil que matou quase um milhão de vidas. As partes assinaram um acordo de paz em agosto, mas as tensões no país permanecem, com ataques nas estradas do centro do país.
Foto: Reuters/S. Sibeko
Ataques no norte de Moçambique
A província de Cabo Delgado continua a ser alvo de grupos armados. Os primeiros ataques foram registados em 2017 e este ano novos episódios de violência aterrorizaram aldeias locais. Pelo menos 300 pessoas já morreram e há centenas de deslocados, segundo as autoridades. A situação também deixa em alerta empresários. A região abriga um megaprojeto de exploração de gás natural.
Foto: DW/A. Chissale
Novo estado federal na Etiópia
Em novembro, 98,5% dos moradores de Sidama, na Etiópia, votaram num referendo para a formação de um novo estado federal e mais autonomia. Os Sidama, quinto maior grupo étnico da Etiópia, espera controlar os recursos da terra, ter voz na política e preservar e fortalecer a sua identidade cultural. Dez outros grupos étnicos manifestaram interesse num referendo semelhante.
Foto: Reuters/T. Negeri
Quem será o novo Presidente da Guiné-Bissau?
Com José Mário Vaz já fora da corrida, a segunda volta das presidenciais disputou-se a 29 de dezembro, entre os favoritos Domingos Simões Pereira e Umaro Sissoco Embaló. Os resultados provisórios deverão ser divulgados pela CNE a 1 de janeiro. A disputa entre Jomav e o Parlamento levou à crise política e económica no país. O novo Presidente terá de resolver isso em 2020.
Foto: DW/B. Darame
Ataques às Nações Unidas na RDC
Manifestantes em Beni, uma cidade no leste congolês, invadiram uma base da ONU no final de novembro e incendiaram o edifício municipal. Alegavam que a missão da ONU no país, a MONUSCO, não está a fazer nada para protegê-los dos ataques rebeldes. A milícia extremista "Forças Democráticas Aliadas" matou e sequestrou dezenas de pessoas na região. A luta em Beni continua.
Foto: Reuters/File Photo/O. Oleksandr
"Arquiteto" das dívidas ocultas ilibado nos EUA
Jean Boustani, tido como o principal mentor no caso das dívidas ocultas, foi considerado inocente em julgamento nos EUA. Entretanto, a Justiça norte-americana quer também julgar o ex-ministro das Finanças de Moçambique, por alegado envolvimento nas dívidas ocultas. Manuel Chang está detido na África do Sul desde dezembro de 2018, com pedidos de extradição para Moçambique e para os EUA.
Foto: Reuters/E. Munoz
Protestos no Zimbabué
O ano começa e termina com protestos no Zimbabué. Depois de o preço dos combustíveis ter subido 130%, milhares de pessoas saíram às ruas e houve escassez de alimentos nos mercados. Foram também demitidos 211 dos 1.550 médicos do país por protestarem por melhores salários e condições de trabalho. Dizem que os seus salários - menos de 200 dólares por mês - são insuficientes para sobreviver.