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HistóriaAlemanha

1860: Nascia o compositor Gustav Mahler

Augusto Valente
Publicado 7 de julho de 2010Última atualização 7 de julho de 2021

Segundo entre 14 filhos, Mahler nasceu em 7 de julho de 1860, em Kaliště, Boêmia. De menino-prodígio a regente de sucesso internacional, seu caminho para o reconhecimento como compositor foi longo e árduo.

National Gallery: Facing the Modern Gustav Mahler
Foto: picture-alliance/umapress/B. Strenske

Certa vez, Gustav Mahler comentou: "O tempo da minha música ainda está por vir". Uma profecia que se cumpriu, sem dúvida. Porém, o compositor, condenado a viver à sombra da própria fama como regente, não podia ter ideia dos percalços por que sua obra ainda passaria até o boom mahleriano da década de 1960.

Em vida, Mahler foi acusado de epígono de Richard Wagner e Anton Bruckner, sua música tachada de decadente, vulgar, megalômana, entre outros adjetivos. Ele próprio se definia como "um anacrônico"; para o celebrado colega Richard Strauss, era um "sonhador alheio ao mundo". Após sua morte, essa obra "difícil", cujo virtuosismo e integridade artística intimidam, ficou basicamente esquecida, até ser banida pelos nazistas, junto com a de outros compositores de origem semita. Somente depois de 1945 ela seria pouco a pouco reabilitada.

Da Boêmia a Viena

Como o segundo entre 14 filhos, Gustav Mahler nasceu em 7 de julho de 1860 na cidade de Kaliště, Boêmia (então pertencente ao Império Austríaco, hoje República Tcheca), em uma família judaica ligada à hotelaria. A música folclórica na hospedaria familiar e nas ruas, as marchas militares da caserna próxima e os cantos da sinagoga são elementos que marcariam suas sinfonias e canções.

Apesar de sua origem humilde, ele teve a chance de desenvolver seu talento musical, e logo se revelou uma típica criança-prodígio. Tendo iniciado sua formação musical ao acordeão com apenas quatro anos de idade, aos seis já dava aulas e escrevia suas primeiras composições. Com dez anos, se apresentou pela primeira vez como pianista.

Após frequentar o Conservatório e a Universidade da capital austríaca, a partir dos 20 anos atuou como maestro e diretor artístico em diversos teatros, culminando com a Ópera de Viena, que dirigiu de 1897 a 1907. Em meio ao crônico antissemitismo reinante, ele só obteve o posto após se converter ao catolicismo. Mantendo um nível musical e interpretativo sem precedentes, por vezes à custa de métodos tirânicos, nesses dez anos Mahler foi responsável pela estreia de 122 obras inéditas naquela cultuada casa de ópera.

Anos fatídicos

Dado o caráter inovador de suas obras, seu sucesso como compositor foi bem menos brilhante do que a carreira de regente. Apesar de toda sua atividade como regente de ópera, ele jamais escreveu uma obra dramática, e só deixou uma peça de câmara, concentrando toda a sua produção artística em dois gêneros: o lied e a sinfonia.

As conexões autobiográficas de sua produção são quase obsessivas. Além de dez sinfonias – a última das quais inacabada, confirmando a mística numérica que o assombrava ("Beethoven, Schubert e Bruckner não passaram de nove!") –, deixou alguns poucos, porém importantes ciclos de canções sinfônicas, cujos textos ele próprio adaptou ou escreveu, como Des Knaben Wunderhorn, Kindertotenlieder ou Das Liede von der Erde.

O ano de 1907 marcou uma série de reviravoltas fatídicas na vida do grande músico. Não só ele encerrou sua gestão na Ópera de Viena, após inúmeras tensões e aborrecimentos: em julho, faleceu de difteria, aos cinco anos de idade, sua filha Maria-Anna, nascida do casamento com Alma Schindler – 19 anos mais jovem do que Mahler, bela e cobiçada pelos intelectuais e artistas de Viena.

Em seguida, foi diagnosticada uma moléstia cardíaca que limitou dramaticamente as atividades do homem atlético e amante da natureza. Ainda assim, contratado pela Metropolitan Opera de Nova York, ele partiu para os Estados Unidos. Lá, foi aclamado com entusiasmo, em especial como compositor, fato inusitado para Mahler. No entanto, atritos profissionais com a Filarmônica de Nova York o levaram a retornar à Europa em 1910.

A estreia da Sinfonia nº 8 (apelidada "Dos Mil", devido às gigantescas forças vocais e instrumentais empregadas), em setembro de 1910, em Munique, foi um triunfo raro para o compositor incompreendido e consumido pelos ciúmes (justificados) em relação a Alma. Gustav Mahler faleceu em Viena em 18 de maio de 1911.

Legado revolucionário

Para além de todo o páthos pós-romântico e da grandiloquência orquestral, ele deixou uma obra extremamente moderna, revolucionária tanto do ponto de vista técnico como em sua ambiguidade, na mescla de gêneros, na justaposição do sublime e do trivial, no uso de citações e colagens.

Por outro lado, apesar da recepção inicialmente mais do que reticente e de seu potencial controverso, as sinfonias e canções de Mahler marcaram decisivamente compositores das gerações posteriores, como Arnold Schönberg, Alban Berg, Anton Webern, Dimitri Shostakovitch, Benjamin Britten e Hans Werner Henze.

A popularização de Mahler a partir de 1960 é geralmente atribuída a dois fatores: a entrada de sua obra no domínio público e o progresso da técnica fonográfica estereofônica, permitindo sua difusão para o grande público, com a fidelidade e a amplitude sonora que sua música exige. Mas talvez essa seja uma explicação simplista demais.

O músico no divã

Em nossos dias, pode-se falar em "Mahler superstar"? Não, isso seria certamente um exagero: dificilmente se escutará alguém assobiando Mahler pelas ruas. Sua música permanece sendo complexa demais para permitir tais familiaridades, ela exige demais de seus ouvintes – em termos de concentração, imaginação ativa, amplo repertório de referências. E é de uma sinceridade que também pode assustar: o próprio Mahler confessou certa vez jamais ter escrito uma nota que não fosse "absolutamente verdadeira".

Porém, duas produções cinematográficas definitivamente contribuíram para aproximar o artista fin de siècle do grande público: a versão de Luchino Visconti de Morte em Veneza (1971), que colocou o Adagietto da Sinfonia nº 5 nas paradas de sucesso; e o delirante Mahler (1974), do britânico Ken Russell.

Agora, no sesquicentenário do músico austríaco, a indústria cinematográfica faz uma nova contribuição a sua aura midiática. Em Mahler auf der Couch (Mahler no divã), os diretores Percy Adlon (Bagdad Café) e seu filho Felix explora o encontro, em 1910, entre o pai da psicanálise, Sigmund Freud, e o genial músico, desesperado pelo romance entre sua esposa e o arquiteto Walter Gropius. Contrariando a prática de reservar a quinta-feira para as estreias, o filme foi lançado nos cinemas alemães exatamente em 7 de julho de 2010.