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A batalha perdida da Google em Berlim

5 de novembro de 2018

Gigante da internet amarga derrota ao desistir de campus na capital alemã. Empresa enfrentou resistência de moradores, que lutam contra a especulação imobiliária e gentrificação.

Em setembro deste ano, ativistas ocuparam o imóvel que abrigaria o campus da Google em Berlim
Em setembro deste ano, ativistas ocuparam o imóvel que abrigaria o campus da Google em BerlimFoto: Imago/C. Mang

A gigante da internet Google gosta de passar uma imagem positiva de boa empregadora, preocupada com o bem estar de seus funcionários e das cidades onde possui sede. A empresa, porém, segue à risca as regras de mercado voltado ao lucro. Na Europa, já recebeu multa bilionária por abuso de poder econômico ao violar regras de concorrência no serviço de compras online; e é também é acusada burlar o pagamento de impostos.

Diante dessas acusações, a Google vem enfrentando alguns embates no âmbito europeu. Mas a gigante não foi confrontada no velho continente somente em aspectos legais. Berlim foi palco de uma de suas maiores batalhas nos últimos dois anos, e onde a empresa amargurou uma grande derrota.

O conflito começou em 2016, quando a Google anunciou que abriria um campus para abrigar start-ups na cidade. O local escolhido foi Kreuzberg, um dos bairros do momento na capital berlinense, mas também um dos que mais sofre com a gentrificação - o processo de valorização de áreas urbanas que se reflete na explosão dos valores dos aluguéis, dificultando a permanência de moradores antigos.

Em 2017, a capital da Alemanha foi a cidade do mundo onde o preço dos imóveis mais subiu, um aumento de 20,5%. Essa tendência se reflete também nos aluguéis. Em apenas sete anos, os valores dos aluguéis subiram 71%. Apenas entre 2016 e 2017, esse aumento foi de 12%. 

Ao escolher a região, a Google se esqueceu, ou ignorou, a longa história de resistência dos moradores de Kreuzberg contra essa transformação, quase sempre nociva para a pluralidade social.

O anúncio da empresa acendeu a luz vermelha da paciência dos moradores do bairro, que se uniram para protestar contra os planos da Google. São pessoas que estão sofrendo na pele as mudanças. Antigos moradores e estabelecimentos comerciais tradicionais estão sendo obrigados a deixar imóveis por não poderem mais pagar o preço pedido no aluguel. Há casos em que o aumento ultrapassa 400%.

O temor de muitos era que, com a vinda da Google para a região, esse processo de exclusão social aceleraria ainda mais. Para tentar reverter isso e mostrar a insatisfação popular, várias manifestações contra o plano da gigante americana foram organizadas desde então. Em setembro deste ano, a resistência atingiu seu ápice. Cerca de 70 ativistas ocuparam por algumas horas o imóvel de 3 mil metros quadrados.

O barulho e a resistência contra a empresa foram tanto que a Google anunciou há cerca de duas semanas que estava desistindo de abrir um campus em Berlim. Como já havia alugado o imóvel, a Google resolveu ceder, então, o espaço para duas iniciativas sociais, uma delas que ajuda crianças e adolescentes em situação de emergência.

Em sua retirada estratégica, a empresa se comprometeu a arcar com os custos do aluguel para ajudar as iniciativas nos próximos cinco anos, depois disso, elas terão que se manter com os próprios esforços. Sem reconhecer a derrota, a empresa alegou que já planejava há tempos destinar o espaço para causas sociais.

A desistência da Google é mais uma vitória dos ativistas berlinenses que lutam contra a gentrificação. Após a decisão, a secretária da Economia de Berlim, Ramona Pop, lembrou que crescimento econômico é importante, porém, não a qualquer preço e precisa respeitar o meio ambiente e fatores sociais.

No caso, abre-se espaço para o argumento que a retirada da empresa seria ruim para cidade, que perderia empregos, porém, se as intenções da Google fossem as melhores, a gigante poderia ter escolhido algum bairro mais afastado e com menor tensão social para abrigar seu campus, onde há espaço e aceitação suficientes.

Clarissa Neher trabalha como jornalista freelancer para a DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Na coluna Checkpoint Berlim, publicada às segundas-feiras, escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy.

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