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A cidade alemã onde metade dos eleitores votou na AfD

Kate Brady cn
6 de setembro de 2019

Localizada no ponto mais oriental da Alemanha, Neisseaue ganhou fama diante do sucesso dos populistas de direita nas eleições regionais. Imigração foi tema que moveu os habitantes locais – numa cidade sem refugiados.

Propaganda eleitoral da AfD em Neisseaue
Propaganda eleitoral da AfD em NeisseaueFoto: DW/K. Brady

Às margens do rio que cruza a cidade de Neisseaue, na fronteira entre Alemanha e Polônia, há uma enorme pedra. "Ponto mais oriental da Alemanha", diz a placa. Há muito tempo, a pedra atrai ciclistas e pedestres, que param para registrar sua passagem pelo local no "Zipfelbuch" – uma espécie de livro de visitas e monumento.

Dois ciclistas do estado da Renânia do Norte-Vestfália, onde fica o ponto mais ocidental do país, escreveram no início do dia que estavam muito gratos em estar em Neisseaue, 30 anos depois da queda do Muro que separava a Alemanha em duas.

Desde a eleição regional na Saxônia, no último domingo, a pequena cidade de apenas 1,8 mil habitantes ficou conhecida por outro motivo: quase metade dos eleitores de Neisseaue (48,4%) votou no partido populista de direita e anti-imigração Alternativa para a Alemanha (AfD). Foi um recorde no estado, onde a legenda terminou em segundo lugar, com 27,5% dos votos, atrás da União Democrata Cristã (CDU).

Paisagem pitoresca

Localizadas atrás das margens arborizadas do rio Neisse, as casas do município estão longe da imagem de uma Alemanha negligenciada e esquecida, que é frequentemente usada para explicar por que eleitores votam na AfD. Grandes residências pintadas em tons pastéis, cercadas por enormes jardins, com arranjos de flores ao longo da rua.

Prefeita ficou chocada com o resultado da AfD na cidadeFoto: DW/K. Brady

O município tem um parque temático, lojas para compras básicas e uma escola. As pitorescas ruas sinuosas parecem, a princípio, estranhamente vazias, com alguns cartazes remanescentes da campanha eleitoral. "Isso ocorre porque a maioria das pessoas está trabalhando", conta a prefeita de Neisseaue, Evelin Bergmann.

Após o sucesso dos populistas de direita nas eleições europeias em maio, Bergmann não se surpreendeu com o resultado recente da legenda no estado. No entanto, ela diz que ficou chocada com o fato de um em cada dois eleitores locais ter votado na extrema direita.

"Após a reunificação da Alemanha, as coisas estiveram ruins por aqui. Muitas pessoas foram embora depois do fechamento de muitas indústrias na região. Muitos que permaneceram ficaram desempregados. Mas agora a vida é boa aqui. A comunidade está ficando mais jovem também. Muitos estão se mudando para cá", diz a prefeita.

Do que reclamam os cidadãos

Contudo, o município ainda é atormentado por problemas comuns das regiões rurais da Alemanha, como a falta de médicos e de professores, pouca iluminação nas ruas à noite e crimes na fronteira. Mas o problema mais mencionado pelos eleitores locais da AfD é a política de refúgio do país – embora não haja nenhum refugiado em Neisseaue. A prefeitura não tem meios para apoiá-los.

"As pessoas aqui têm medo que algo lhes seja tirado", afirma Bergmann à DW. "Eles leem sobre radicais [islamistas] em jornais, sobre ataques terroristas, e desenvolvem medos fictícios. Eles vão para cidades próximas como Görlitz ou Dresden e, em algumas partes, só veem migrantes na rua – o que, claro, é um exagero. Então decidem que não querem isso aqui. E a mídia tem um papel crucial nisso", acrescenta.

Dias depois de a cidade ilustrar manchetes em toda a Alemanha como o "coração dos populistas de direita", muitos eleitores da AfD relutam em falar com jornalistas. "Não tenho nada a dizer. Nós fomos apresentados na imprensa tão negativamente como neonazistas e extremistas de direita", diz uma mulher ao sair de um açougue.

"AfD nos deu voz"

Do lado de fora de uma mercearia, outra mulher estaciona seu jipe. "A vida é boa", afirma ela à DW, contando que tem um emprego em período integral e que votou no partido populista de direita. "A AfD nos deu voz. Uma voz para dizer o que não pudemos dizer por anos. É hora de a Alemanha parar de pedir desculpas pelo passado. A ordem precisa ser restaurada. Não podemos ter essas pessoas vindo para cá pensando que podem esfaquear os outros ou violar nossas mulheres", ressalta.

Nenhum refugiado vive em NeisseaueFoto: DW/K. Brady

Em tom semelhante, um homem que costumava votar em Angela Merkel, da conservadora CDU, disse que a decisão da chanceler federal, durante a crise migratória de 2015, de abrir as fronteiras alemãs foi a gota d'água.

"Não se pode deixar pessoas entrarem aqui sem controle. Por que eles precisam ficar aqui? Eles deveriam ser gratos por darmos um lugar para eles ficarem. Eles deveriam estar felizes por estarem vivos", afirma ele, acusando ainda o governo alemão de ter negligenciado os alemães do Leste. "Eles pararam de se importar conosco há muito tempo. Estamos no ponto mais ao leste da Alemanha, e aqui não há rodovia, não há nada", conclui ele, rindo.

"AfD não é a resposta"

Mas a outra metade de Neisseaue não votou no partido populista de direita. Muitos deles se questionam se moram no mesmo lugar que os apoiadores da legenda. "O que mais nos preocupa é que os eleitores da AfD são pessoas normais, como eu e você. Eles não são neonazistas. Mas acredito que muitos deles sequer leram o manifesto do partido", diz uma mulher que passava de bicicleta.

Conhecendo os problemas do município, ela afirma que algumas pessoas tiveram de enfrentar duas ou três situações ruins em alguns poucos anos. "É preciso lidar com a criminalidade na fronteira, mas, no geral, a vida é boa aqui. E a AfD não é de longe a resposta para os nosso problemas."

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