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A decadência da social-democracia alemã

Tessa Clara Walther
4 de junho de 2019

O partido mais antigo da Alemanha vive a maior crise de sua história. Em questão de anos, viu sua base eleitoral se pulverizar e amarga cifras desastrosas nas urnas. Ter se aliado a Merkel pode ter acelerado o declínio.

O SPD, Partido Social-Democrata alemão, vive a maior crise de sua história
O SPD, Partido Social-Democrata alemão, vive a maior crise de sua históriaFoto: picture-alliance/dpa/P. Endig

Postura confiante, passos firmes. Um dia após sua renúncia, Andrea Nahles parecia disfarçar sua resignação com um sorriso corajoso. Ela perdeu sua luta pela sobrevivência política, mas sua renúncia como presidente do Partido Social-Democrata (SPD) não é o único problema da mais antiga legenda do país ainda em atividade, membro da coalizão do governo Angela Merkel.

"Adeus, tudo de bom para vocês", despediu-se a social-democrata da imprensa em Berlim nesta segunda-feira (03/06). E com a despedida vai também sua promessa de resgatar o partido do buraco, abalado por recordes negativos nas urnas, e reconstruí-lo praticamente do zero.

Há algum tempo a situação está desfavorável para os social-democratas na Alemanha. No mais recente pleito – as eleições para o Parlamento Europeu, em maio –, o SPD recebeu apenas 15,8% dos votos e alcançou seu pior resultado da história.

Nas eleições estaduais do estado Bremen, também em maio, os social-democratas não foram os mais votados pela primeira vez desde o fim da Segunda Guerra Mundial.  

E mesmo na liderança partidária reina a desordem: com exceção de Sigmar Gabriel, nenhum presidente do SPD conseguiu permanecer no cargo por mais de cinco anos desde a queda do Muro de Berlim. Mas qual é a causa da derrocada contínua do SPD?

"Há 15 anos nos perguntamos: o que ganho se eu votar no SPD? Ninguém sabe responder a questão", diz Olaf Böhnke, analista da consultoria política Rasmussen Global.

Historicamente, o partido sempre pôde confiar nos votos da classe trabalhadora simples. Por décadas, social-democratas e sindicatos lutaram por melhorias na lei trabalhista, na educação e na participação social. Com sucesso. Mas atualmente um em cada dois cidadãos alemães pertence à classe média. O clássico eleitorado do SPD se dissipou.

O começo do fim?

Hoje na Alemanha, não faltam problemas sociais. Segundo dados da agência federal de estatísticas Destatis, um em cada cinco cidadãos alemães está em risco de pobreza ou exclusão social.

Ao mesmo tempo, o aumento dos aluguéis tem comprometido a subsistência de muitas pessoas. Uma em cada dez pessoas se sente seriamente sobrecarregada com os custos mensais de moradia.

Mas aqueles que vivem em circunstâncias tão precárias não escolhem mais votar no SPD, mas na sigla populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD), no leste alemão, ou no ambientalista Partido Verde, na faixa ocidental do país.

"O SPD perdeu muita confiança e credibilidade nos últimos anos", afirma Thorsten Faas, cientista político e professor da Universidade Livre de Berlim. Especialmente estando na coalizão de governo com a União Democrata Cristã (CDU), da chanceler federal Angela Merkel, tem sido difícil para o SPD reconquistar essa confiança. "O partido teve que lutar repetidas vezes pela visibilidade e buscar meio-termos com os conservadores", acrescenta o analista.

Para muitos, exatamente a grande coalizão entre CDU/CSU e SPD parece ter sido o começo do declínio final dos social-democratas – embora tenha havido repetidas tentativas internas de redefinir o partido depois da desastrosa marca de 20,5% dos votos nas eleições legislativas de 2017.

No ano passado, por exemplo, o SPD pleiteou fortemente "uma ofensiva de política social" no governo federal – e ao mesmo tempo definiu os tópicos na pauta: aposentadoria, proteção ao inquilino, assistência de enfermagem e salário mínimo. Mas o SPD não conseguiu que os progressos nesses temas fossem atribuídos aos seus esforços.

Há outros que se referem à era Gerhard Schröder, de 1998 e 2005, como o começo do fim. "Desde o seu fim como chanceler federal, o SPD sofreu muito", opina Böhnke.

Particularmente controversa foi sua Agenda 2010, que liberalizava o mercado de trabalho e reduzia os benefícios estatais. Desde então, segundo Böhnke, o partido social-democrata não conseguiu "representar a opinião majoritária sobre o Hartz IV [o sistema de assistência social aos desempregados de longa data], seja essa reforma boa ou ruim".

Um fenômeno europeu

Mas os social-democratas alemães não são os únicos que enfrentam um declínio em seu eleitorado. Na França, o Partido Socialista somou menos de 6% dos votos nas eleições europeias. Na Áustria, o Partido Social-Democrata (SPÖ) perdeu as eleições locais de 2017 e deixou o governo. Até mesmo na Suécia, outrora modelo de política social-democrata, o Partido Trabalhista computou seu pior resultado da história, com menos de 30% dos votos em 2018.

Böhnke não vê carência de questões social-democratas a nível europeu. Mas a estratégia de convencimento de seus eleitores, para o analista, deve ser reajustada.

"As políticas funcionam, elas não estão desatualizadas, mas é sobre como elas são empacotadas e por quem elas são pessoalmente representadas no partido", afirma Böhnke.

E exatamente perante essa questão de representatividade está o SPD. Interinamente, o partido será conduzido pelo trio Manuela Schwesig (governadora de Schleswig-Holstein), Malu Dreyer (presidente do Bundesrat, o Conselho Federal) e Thorsten Schäfer-Gümbel (deputado estadual de Hessen).

Como será daqui para frente, contudo, segue em aberto. Assim que definida, a nova liderança terá de decidir por uma continuação da grande coalizão com CDU/CSU ou por um curso mais radical, mais de esquerda do partido.

Essa segunda opção, no entanto, o SPD só poderia acionar credivelmente como força da oposição. E quem sabe, talvez o SPD encontre nessa posição novos aliados – seja A Esquerda ou os verdes – depois de possíveis novas eleições gerais no final deste ano.

 

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