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A elite encastelada: o que esperar de Davos em 2019? 

Andreas Becker jps
21 de janeiro de 2019

Em tempos de conflitos comerciais e nacionalismo, diálogo para o entendimento e colaboração proposto pelo Fórum Econômico Mundial fica ainda mais difícil. Na ausência de Trump, atenções deverão se voltar para Bolsonaro.

Jair Bolsonaro
Presidente Jair Bolsonaro chega à Suíça, onde participará do Fórum de DavosFoto: Alan Santos/Presidência da República do Brasil

O crescimento global está perdendo gás, enquanto conflitos comerciais estão em alta. Problemas ambientais e mudanças climáticas permanecem sem solução. Ao mesmo tempo, grandes mudanças ocorrem por causa da crescente digitalização. "Cada uma dessas questões é um grande desafio", diz Borge Brende, ex-ministro das Relações Exteriores da Noruega e atual presidente do Fórum Econômico Mundial, que começa nesta terça-feira (22/01) em Davos. "Vistas em conjunto, elas são uma tarefa tremenda que só pode ser resolvida por meio da colaboração." 

No entanto, há uma crescente falta de cooperação. O presidente americano, Donald Trump, é um opositor declarado dos acordos multilaterais e, em meio à paralisação do governo nos Estados Unidos, nem sequer irá a Davos. O novo presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, também adotou uma linha nacionalista. A União Europeia está ocupada com o Brexit, populistas estão governando a Itália e outros países europeus, "coletes amarelos" estão protestando na França, o Oriente Médio é um barril de pólvora, e a China está se intrometendo em Taiwan.

O presidente do conselho executivo do Fórum, Klaus Schwab, vê a organização que ele fundou em 1971 como um instrumento de entendimento. "Diálogo para facilitar a compreensão mútua é mais importante hoje do que nunca", disse. 

Já Brende acabou soando como um organizador de um festival quando listou de maneira entusiasmada os participantes deste ano. "Nós temos 37 chefes de Estado e de governo da Europa e da Eurásia, nove do Oriente Médio, seis presidentes da América Latina e seis ou sete da África", disse. "Da China vem o vice-presidente Wang Qishan, e ainda esperamos altos representantes do gabinete americano."

No total, cerca de 70 chefes de Estado e de governo, além de líderes das Nações Unidas, do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco Mundial e da Organização Mundial do Comércio (OMC) estão entre os 3 mil participantes. Além deles são esperados 300 ministros, mil empresários, numerosos cientistas e representantes de organizações ambientais e de desenvolvimento. 

E o que eles vão fazer nas montanhas da Suíça? Nada menos do que discutir a situação do mundo, afinal esta é a missão do fórum. Nas palavras de Brende: "Nosso desafio é encontrar soluções para as questões mais urgentes do mundo com todos os líderes, representantes de organizações internacionais, dos negócios e da sociedade civil". 

No entanto, nenhum acordo internacional costuma ser assinado em Davos. E Trump, o homem que sem dúvida gosta de questionar a antiga ordem das coisas, não vai estar presente. Ele cancelou sua participação com a justificativa da disputa com o Congresso americano em torno da paralisação do governo.

Até mesmo o presidente da França, Emmanuel Macron, vai permanecer em casa – oficialmente por causa de uma suposta agenda cheia, mas extraoficialmente porque a participação em um encontro da elite pode minar a credibilidade do diálogo que ele começou a travar com os cidadãos franceses.

Em contrapartida, a chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel, vai comparecer, assim como sua sucessora na chefia da União Democrata Cristã (CDU), Annegret Kramp-Karrenbauer, e o ministro alemão da Saúde, Jens Spahn.

Com a ausência de Trump, as atenções se voltam para o novo presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, que vai falar pela primeira vez diante de um público internacional.

Para o fórum, a ausência de Trump é sem dúvida um prejuízo do ponto de vista da repercussão internacional. Um ano atrás, a presença do americano ganhou manchetes pelo mundo, mesmo sem qualquer contribuição da parte dele na discussão sobre questões globais. 

Em vez de dialogar, Trump fez apelos aos empresários presentes para que investissem em seu país. Muitos líderes de governos fazem isso em Davos, mas poucos ousam se promover de forma tão pública quanto Trump. 

O tema do encontro deste ano é o impacto da globalização e da digitalização industrial. Com o título "Globalização 4.0: em busca de uma arquitetura global na era da da Quarta Revolução Industrial", o encontro se propõe fazer um prognóstico do futuro. 

O mundo sofre com a falta de visão, diz Schwab. Segundo ele, o fórum pode ajudar nesse ponto – embora ele admita que propostas feitas por grupos de elite estejam sendo vistas com cada vez mais desconfiança por cidadãos. 

"As elites são só dignas de desconfiança se o compromisso for apenas a próxima eleição ou o próximo relatório trimestral", diz. "Em Davos, por outro lado, nós procuramos ativamente uma abordagem de longo prazo, baseada nas oportunidades que queremos conceber."

A crítica às elites formulada por Schwab vai ainda mais longe. Segundo ele, enquanto a globalização produziu muitos vencedores, ele e o fórum nunca foram defensores ideológicos da ideia de submeter tudo às forças do livre mercado. 

Schwab afirma que advertiu em 1996 que a globalização não era sustentável da forma como está. "Se falarmos de globalização 4.0 agora, então ela precisa ser mais inclusiva e sustentável", diz. "E ela precisa ser baseada mais em princípios morais. Nós precisamos de uma moralização, uma remoralização da globalização."

Ainda na discussão dos seus objetivos, o fórum tem avançando lentamente em seu plano de aumentar significativamente o número de participantes do sexo feminino. A parcela de mulheres neste ano subiu para 22%, ante 21% no ano passado. 

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