A estética do asfalto
16 de julho de 2004A mais poética interpretação de estradas e viadutos é certamente a música Autobahn (Rodovia), do grupo alemão Kraftwerk. Composta em 1974, poucas semanas após a crise do petróleo e a suspensão da lei que impedia o trânsito de veículos aos domingos devido à crise do combustível, a banda resumiu quilômetros de estradas em 23 minutos de melodias eletrônicas – incluindo todas as promessas de mobilidade e as sensações de mudanças que a época transmitia.
As fotos de Hans-Christian Schinck também contam histórias de rodovias e promessas de transformação. Durante quase dez anos, o fotógrafo de Erfurt percorreu o território da antiga Alemanha Oriental em busca de projetos rodoviários construídos no Leste do país – dos menores aos megalômanos. Seu livro, que traz o título Verkehrsprojekte (Projetos de Trânsito), mostra a situação desses empreendimentos hoje em dia.
Beleza ambígua
Não há flores nos canteiros: a paisagem capturada em suas imagens é hostil, perdida sob um céu vazio. São pontes, viadutos, pilares gigantescos de concreto e asfalto até perder de vista. "O que me fascina mais, principalmente profissionalmente, são coisas ambivalentes", explica Schinck. "Objetos que, normalmente, não são considerados bonitos, mas que, transformados em fotos, transportem uma certa beleza".
Em algum lugar entre terrenos baldios e plantações, Schinck mostra uma situação intersticial. Um silêncio quase visível domina o cenário – não há pessoas, nem guindastes ou betoneiras, nem automóveis. O vazio monumental antes do tiro de largada. Antes do início. Antes que venha o trânsito e atropele tudo.
Claro que se pode classificar de entediantes as fotos de Schinck, recém-formado na Faculdade de Design Gráfico e Editoração de Leipzig. Mas suas fotos, tomadas com uma câmera fotográfica panorâmica, transmitem mais do que uma simples visão neutra da periferia do urbano. Elas exigem uma reação imediata do observador. A melancolia da perda ou da explosão do movimento são temas que habitam seu projeto.
11 mil quilômetros de mitos
Desde a unificação da Alemanha, o país é cortado por mais de 11 mil quilômetros de rodovias. Websites pessoais em todo o mundo celebram o mito, elogiam a velocidade e a perfeição alemãs. A promessa de crescimento explosivo e mobilidade continua existindo. Desde que o primeiro trecho de uma rodovia foi planejado em Berlim no ano de 1909. No mais tardar até que a chave faça a ignição e o carro parta. Comentário melhor que Autobahn, do Kraftwerk, ainda não se ouviu. Melhor que Verkehrsprojekte, de Schinck, ainda não se viu.
Hans-Christian Schinck, Verkehrsprojekte, Editora Hatje Cantz, ISBN 3-7757-1425-1