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A força dos evangélicos na eleição

27 de setembro de 2018

Na política brasileira, eles ainda estão sub-representados. Mas agora podem ser decisivos para a escolha do mais alto cargo do Estado. E podem tornar o Brasil ainda mais conservador.

Fiéis levantam os braços para o alto durante culto da igreja Assembleia de Deus em Goiânia
Fiéis durante culto da igreja pentecostal Assembleia de Deus em GoiâniaFoto: AFP/Getty Images

O outrora "país mais católico do mundo" sempre teve presidentes católicos – com exceção do evangélico Ernesto Geisel. A eleição do dia 7 de outubro terá dois candidatos à Presidência com perfil evangélico: Marina Silva e Jair Bolsonaro. A primeira é evangélica convertida do catolicismo, e o segundo, católico, se deixou batizar em 2016 por um pastor evangélico no rio Jordão.

As igrejas evangélicas estão há décadas ganhando cada vez mais fiéis. No censo de 2010, 42 milhões de brasileiros (22%) se declararam "evangélicos", enquanto 123 milhões eram católicos (64%). Atualmente, a parcela de evangélicos é de cerca de 30%, segundo estimativas de especialistas.

Mas politicamente eles ainda estão sub-representados. Atualmente, dos 513 deputados da Câmara dos Deputados, apenas cerca de 90 pertencem à Frente Parlamentar Evangélica, fundada em 2003. No Senado, cinco dos 81 senadores são evangélicos, sendo que dois estão licenciados.

Nas próximas eleições, é esperado que a bancada evangélica cresça pelo menos 10% devido ao desempenho de Bolsonaro, na opinião do cientista político Ricardo Ismael, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ): "A novidade é que os evangélicos começam a ser competitivos em eleições para o Poder Executivo".

Uma prova disso é a eleição em 2016, do bispo da Igreja Universal do Reino de Deus Marcelo Crivella para prefeito do Rio de Janeiro. Para isso, ele contou com o poder da Igreja Universal, fundada por seu tio Edir Macedo, junto com o império de TV Rede Record. Pastores teriam pedido votos para Crivella, segundo reportagens da mídia. Não se sabe com quanto dinheiro a Igreja Universal contribuiu para a dispendiosa campanha eleitoral.

Nem todos os candidatos evangélicos têm o apoio de Igrejas tão grandes, influentes e poderosas financeiramente. Mas eles ganham eleitores da nova classe média baixa, onde a Igreja Católica vem perdendo influência desde os anos 70.

"A população de baixa renda e de classe média baixa brasileira se afastou da chamada teologia da libertação, defendida pela Igreja Católica progressista, e aderiu ao que ficou conhecido como 'teologia da prosperidade', propagada pelas igrejas evangélicas neopentecostais", ressalta Ismael.

Para o sociólogo Francisco Borba Ribeiro Neto, coordenador do Núcleo Fé e Cultura da PUC-SP, a ascensão dos evangélicos é resultado do êxodo rural na segunda metade do século 20. A devota população rural encontrou nas cidades grandes uma sociedade católica secularizada e liberal e foi buscar refúgio nas Igrejas Pentecostais –  moralmente mais severas, conservadoras e puristas –, com suas promessas de prosperidade.

"Para uma população massacrada por condições de vida extremamente difíceis, escandalizada pela perda dos valores tradicionais, solitária nas grandes cidades, essa mensagem era muito atraente", afirma Ribeiro Neto.

Ela conseguiu ascender economicamente nas últimas décadas para uma nova classe média – e vota tendencialmente na direita conservadora. A pesquisa Ibope de 18 de setembro, por exemplo, aponta que os eleitores evangélicos votam menos na esquerda (6%) do que os católicos (21%). "O discurso católico tem mirado mais a questão social, dos direitos dos mais pobres", sublinha o sociólogo. "Enquanto o discurso evangélico – particularmente entre os neopentecostais – está mais centrado na questão dos valores morais."

Diferentemente das classes mais pobres, que tendem a votar na esquerda, que são mais dependentes da ajuda estatal, a população da ascendente classe baixa média não depende mais de ajudas diretas do Estado.

"Já os neopentecostais são hegemônicos nessas novas classes médias, e se preocupam muito com os valores morais, o combate à insegurança urbana e o fim do Estado assistencialista – que não atende mais às suas necessidades", comenta o especialista.

A grande maioria dos políticos evangélicos também é contra uma agenda a favor das minorias, segundo Ismael. "A bancada evangélica tem se colocado contra uma agenda de esquerda, que quer mudanças na questão dos direitos das minorias, na possibilidade de novos formatos de famílias, nas discussões sobre gênero e no sistema educacional. É cedo para dizer que ela terá êxito em impedir tais avanços. Mas tem força para provocar muitos embates e negociações."

Será que o próximo presidente será evangélico? Jair Bolsonaro lidera as pesquisas de intenção de voto (27%, segundo a CNI/Ibope de quarta-feira), enquanto Marina Silva perde força (6%). Ela não restringe seu discurso a temas evangélicos, mas abraça tanto a política social quanto o ambientalismo, segundo Ismael.

"O candidato Jair Bolsonaro tem um discurso que reproduz os valores da pregação evangélica, se colocando contra a agenda da esquerda na área de costumes. Dai vem sua expressiva votação entre os evangélicos", analisa.

Enquanto Marina Silva, declaradamente evangélica, possui um perfil com características mais católicas, o católico Bolsonaro discursa como um evangélico, na avaliação de Ribeiro Neto.

"Curiosamente, Marina é a candidata católica por excelência, vivendo essa cisão entre as questões sociais – onde tem um perfil de esquerda – e as morais – onde se aproxima da direita", afirma.

Já Bolsonaro, de acordo com o especialista, é totalmente identificado com as aspirações da nova classe média. "Tanto para um evangélico quanto para um católico ultraconservador, Bolsonaro representa a alternativa populista de um líder capaz de usar a força para resolver os problemas que não estão sendo resolvidos pelo diálogo democrático", frisa o sociólogo.

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