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A luta do clã Bolsonaro pelo controle do PSL

22 de outubro de 2019

Após duas semanas de crise que rachou o partido do presidente, desfecho da batalha em torno da sigla ainda é incerto. Disputa de poder deve atrapalhar o andamento de reformas no Congresso.

Jair Bolsonaro e Eduardo Bolsonaro
"Essas coisas acontecem, é igual a uma ferida, cicatriza naturalmente", disse Bolsonaro ao ser questionado sobre crise no PSLFoto: Getty Images/AFP/S. Lima

A cada dia parece se desenrolar um novo capítulo da novela pelo controle do PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro e que detém a segunda maior bancada na Câmara. Nesta segunda-feira (21/10), o deputado Eduardo Bolsonaro, filho do chefe de Estado, conseguiu apoio suficiente para assumir a liderança da sigla na Casa – pelo menos por enquanto. Ainda não está decidido quem vencerá a batalha final pelo controle do PSL e dos imensos fundos partidários aos quais o partido tem direito – a previsão é que a sigla receba 110 milhões de reais neste ano.

A disputa feroz entre o clã Bolsonaro e o presidente nacional da sigla, o deputado Luciano Bivar (PSL-PE), já era de se esperar, afirma o sociólogo Celso Rocha de Barros.

Jair Bolsonaro se filiou ao partido para disputar as eleições presidenciais de 2018, e seus filhos Eduardo e Flávio se tornaram líderes do partido em São Paulo e no Rio de Janeiro, respectivamente. Um ex-aliado de Bolsonaro, o ex-ministro Gustavo Bebianno, chegou a assumir interinamente a presidência nacional do partido durante a campanha eleitoral, no lugar de Bivar.

"O PSL foi um partido que eles mais ou menos alugaram durante a eleição, e já faz tempo que a família Bolsonaro quer centralizar o PSL", diz Barros em entrevista à DW Brasil.

"Ao contrário de outros movimentos autoritários semelhantes, como na Hungria ou na Turquia, o bolsonarismo não tem um partido forte. Não tem um partido bolsonarista. E com o escândalo dos laranjas, eles tentaram acelerar esse processo", aponta o sociólogo.

No começo do ano, várias candidaturas laranjas do PSL vieram à tona, tanto em Minas Gerais como em Pernambuco – "quintal" de Bivar –, colocando em xeque o discurso anticorrupção do próprio Bolsonaro.

Além disso, a relação entre o presidente e o partido já mostrou ter outras rachaduras logo no começo do mandato, quando um grupo de deputados viajou à China, em janeiro, irritando Olavo de Carvalho. "Palhaços e semianalfabetos" foram as palavras usadas pelo guru bolsonarista na época para se referir aos visitantes do país comunista.

Nas últimas semanas, um processo de autoimplosão do PSL se acelerou. Em 8 de outubro, ao sair do Palácio da Alvorada, Bolsonaro pediu a um apoiador que esquecesse o PSL, alegando que Bivar "está queimado para caramba". Poucos dias depois, o presidente do partido foi alvo de uma operação da PF no âmbito de uma investigação sobre candidatos laranjas.

Agora, Bolsonaro deve tentar se aproveitar dos problemas de Bivar para assumir o controle do partido, mas o momento não é bom para comprar uma briga desnecessária, avalia o cientista político Marco Aurélio Nogueira. "Essa não é a hora de comprar uma briga desse porte, porque tem reformas que o governo diz querer aprovar", afirma.

Planos econômicos e políticos em risco

Mesmo não afetando a iminente votação da reforma da Previdência no Senado, onde o PSL só tem três representantes, o racha no principal partido da base do governo enfraquece os futuros planos da equipe econômica, avalia Nogueira.

"Bolsonaro não sabe em que apostar, ele não tem uma pauta muito organizada. Ele vai indo conforme os hormônios dele mandam", opina Nogueira. Para o cientista político, até Paulo Guedes, "o ministro supostamente mais racional", está, neste momento, sem foco.

"Uma hora é a reforma tributária, agora, de repente, a prioridade é a redução das despesas públicas, ou pode ser que seja a reforma administrativa, ou melhor, quem sabe, deixá-la para o ano que vem. É um governo perdido, dando tiros para o alto, sem saber onde está o alvo", diz.

Além de trazer problemas para a pauta econômica, rachar o próprio partido a menos de um ano das eleições municipais não é boa ideia em termos políticos, avalia Nogueira. "As eleições municipais acabam sendo um termômetro das eleições gerais, em 2020. Então, é uma loucura desencadear uma crise agora."

Ainda mais considerando que a ala bolsonarista perdeu, no meio da batalha, o apoio de figuras de peso extraordinário dentro do PSL, principalmente do senador Major Olimpio e da deputada federal Joice Hasselmann, ambos do diretório de São Paulo, aponta o cientista político.

Como líder do PSL no estado, Eduardo Bolsonaro freou o desejo dos dois de saírem como candidatos à disputa pela prefeitura de São Paulo e tentou emplacar um candidato próprio. Assim, o filho do presidente ganhou inimigos perigosos.

Enquanto isso, o senador Flávio Bolsonaro, irmão de Eduardo, perdeu uma queda de braço com políticos do próprio PSL no Rio. "Isso tem a ver com a incapacidade de dimensionar a própria força", avalia Nogueira. "Eles acham que controlam tudo, quando, na verdade, eles controlam cada vez menos a dinâmica política."

O mesmo erro de cálculo aconteceu na disputa pela liderança nacional, acredita Nogueira. "Erraram na definição dos adversários, pois superestimaram a força interna dentro do partido." Assim, o partido se dividiu ao meio, o que teria alimentado o sentimento de outros partidos de que o governo não é de confiança.

"Uma crise desse tamanho não tem como ser apagada"

Mas para Bolsonaro, não existe uma crise política. Na segunda-feira, em viagem pelo Japão, o presidente comentou a disputa dos últimos dias: "Essas coisas acontecem, é igual a uma ferida, cicatriza naturalmente."

Para Nogueira, não é bem assim. "Rachou mesmo. Agora, se a lógica política funciona, isso aí não tem retorno, não tem como cicatrizar. Porque foram ditas coisas que você não apaga com um acordo de cavalheiro. Uma crise desse tamanho não tem como ser apagada."

O cientista político acredita que há um risco de um isolamento político da família Bolsonaro. Caso eles não consigam controlar o PSL, especula-se uma troca de partido, mas uma ida para um dos grandes partidos da direita ou do centrão, como o DEM ou o MDB, parece improvável, avalia Nogueira.

"Nenhum deles deseja a companhia de Bolsonaro e da família Bolsonaro. Se eles tiverem que sair do PSL, ele, a família e metade do PSL vão ter que buscar um partido novo que está por ser aprovado, como a UDN", diz.

Para Nogueira, seria até possível a Justiça permitir a transferência dos mandatos de um partido para um outro, "mas eles vão perder as vantagens de um partido rico, o PSL".

Barros, por sua vez, reforça que o mandato é do partido. "A princípio, Eduardo Bolsonaro não pode sair do PSL. Agora, a lei tem exceções. Se o deputado conseguir provar que está sendo perseguido dentro do partido, ele pode conseguir sair e manter o seu mandato. Provavelmente sem fundo eleitoral. É muito difícil arranjar um argumento para você levar o fundo partidário com você."

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