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Esporte

A maior derrota do Maracanã

Roberta Jansen do Rio
14 de fevereiro de 2017

Apenas meio ano após Jogos Olímpicos, estádio reformado ao custo de mais de 1 bilhão de reais está abandonado e, em meio a impasse sobre administração, foi invadido, roubado e depredado.

Brasilien Maracan -Stadion
Turistas esperam na porta do Maracanã: um dos principais pontos turísticos do Rio segue fechadoFoto: picture alliance/dpa/G. Ismar

Seis meses após ser palco da luxuosa festa de abertura dos Jogos Olímpicos, o Maracanã reflete a dramática situação de falência do estado do Rio de Janeiro: o estádio está completamente abandonado. O gramado foi destruído, há cadeiras quebradas, a luz foi cortada por falta de pagamento, vários equipamentos foram roubados e até o busto do jornalista Mário Filho – que dá o nome oficial ao estádio – desapareceu.

"Que bom que nem o busto do Mario Filho esteja lá para ver o que fizeram com seu estádio", afirma o jornalista Ruy Castro, autor da biografia de Garrincha, Estrela Solitária, e também de Flamengo: o vermelho e o negro. "E que bom que tantos outros cronistas esportivos, como Nelson Rodrigues, João Saldanha, Sandro Moreyra, Armando Nogueira, também não estejam mais vivos para ver o que fizeram."

Ironicamente, aponta o escritor, de todos os grandes nomes da crônica esportiva brasileira, o único ainda vivo é Sérgio Cabral (pai), que sofre de mal de Alzheimer em estágio avançado, e, por conta disso, tampouco tem consciência do que acontece no estado e no estádio.

Seu filho, o ex-governador Sérgio Cabral, se encontra preso, acusado de comandar um gigantesco esquema de propina junto a empreiteiras, que teria movimentado mais de 200 milhões de reais em contratos ilegais e contribuído para a falência do estado.

Durante o período em que Cabral filho esteve à frente do governo (entre 2007 e 2014), o Maracanã passou por diversas reformas – para os Jogos Pan-americanos de 2007, para a Copa do Mundo de 2014 e, logo depois, para os Jogos Olímpicos do ano passado. Os custos superaram 1 bilhão de reais. E foram tantas mudanças que, do Maracanã original, não sobrou praticamente nada.

"O Maracanã sempre foi visto como o principal palco do futebol brasileiro, a casa da seleção brasileira, que é um dos maiores produtos de exportação do país", diz o jornalista Arthur Dapieve, autor de Maracanazo e outras histórias. "A gente enchia a boca para dizer que era o maior estádio do mundo. Mas essas reformas controversas o tornaram um estádio igual aos outros. Até a marquise de concreto, que era tombada pelo Patrimônio Histórico, foi retirada."

O historiador Leonardo Pereira, da PUC, especializado em futebol, concorda com o jornalista:

"O atual problema do Maracanã começou com a decisão de se fazer uma reforma que destruiu completamente o antigo estádio, marco arquitetônico e histórico, e criou um novo dentro dele. A verba que foi gasta era suficiente para se ter construído outra arena e deixado o Maracanã intacto, do jeito que era."

Jogo de empurra

Desde 2013, o estádio é administrado pela concessionária Maracanã S.A., liderada pela Odebrecht. Mas entre março e novembro do ano passado, por conta dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos, ficou sob o controle do Comitê Rio-2016. A concessionária, no entanto, não aceitou o estádio de volta em novembro, alegando que precisava de reparos.

Somente em janeiro, por conta de uma liminar, a concessionária assumiu novamente o Maracanã. No tempo em que ficou sem dono e sem segurança, o estádio foi invadido, roubado e depredado. E até hoje continua sem luz por falta de pagamento.

Em nota, a concessionária informou que está negociando o pagamento das contas em atraso. A concessionária informou ainda que aguarda a habilitação de empresas interessadas pelo estado para dar continuidade ao processo de venda do controle acionário. E espera anunciar até o fim deste mês o nome do novo grupo que substituirá a Odebrecht à frente do consórcio.

"O Maracanã tem uma importância simbólica muito grande para o Rio e para o Brasil", afirma o historiador Leonardo Pereira. "Ele foi inaugurado num momento em que o Brasil não tinha ainda ganhado nenhum campeonato mundial, não era aclamado como uma grande potência do futebol. A sua construção foi uma tentativa de afirmar essa ideia de Brasil grande, de maior estádio do mundo, de uma grandiosidade ainda pretendida."

Inaugurado em 1950, com capacidade para 200 mil torcedores, o Maracanã hoje abriga, no máximo, 79 mil pessoas. Há muito tempo não é mais "o maior estádio do mundo".

"É uma coisa horrível isso que está acontecendo, mas num país em que a Copa do Mundo foi roubada e derretida, tudo parece ser possível, inclusive o maior patrimônio esportivo do país, o Maracanã, estar abandonado", resume Dapieve.