Capital alemã deu a Haddad sua maior vitória na Europa, numa clara rejeição ao projeto de extrema direita de Bolsonaro. Passado da cidade, marcado pelo autoritarismo, pode ser um dos fatores que explicam o resultado.
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Na cidade onde o autoritarismo deixou marcas que as gerações posteriores fazem questão de não esquecer, centenas de brasileiros voltaram às urnas na Embaixada do Brasil neste domingo (28/10). O local de votação foi também o ponto de encontro de amigos e conhecidos, que aproveitaram o momento para colocar novidades em dia ou conversar sobre o cenário político.
A grande maioria dos reunidos em frente à embaixada parecia ter votado contra o candidato do PSL, Jair Bolsonaro. Muitos traziam livros na mão em apoio presidenciável Fernando Haddad (PT), que, durante a campanha, afirmou que o país "precisa de livros, e não de armas", como defende Bolsonaro. Alguns poucos vestiam a camisa verde e amarela, símbolo do voto no capitão reformado.
Nas urnas, os bolsonaristas mostraram ser realmente uma minoria: Bolsonaro conquistou apenas 26,3% dos votos válidos, contra 73,7% obtidos por Haddad. Berlim concedeu ao ex-prefeito de São Paulo a maior vitória entre as cidades da Europa.
Uma grande parcela dos votos de Haddad em Berlim não foi, porém, em apoio ao PT. No primeiro turno, o petista ficou em segundo lugar, com 20,9% dos votos – atrás de Ciro Gomes (PDT), com 34,8% –, apenas 0,6 ponto percentual à frente de Bolsonaro. Grande parte dos que foram à embaixada neste domingo votaram a contragosto no petista, e a decisão foi muito mais um voto #elenão, com um posicionamento claro contra o projeto de extrema direita de Bolsonaro.
Não é à toa que o militar reformado enfrenta em Berlim uma de suas maiores rejeições no exterior. A capital alemã é marcada por um passado autoritário, do regime nazista da década de 1930 até 1945 ao muro construído pelo regime comunista, que dividiu a cidade por 28 anos, 2 meses e 26 dias, separando famílias e amigos. Berlim também é símbolo de resistência, reconstruída no pós-guerra com o trabalho braçal de mulheres que removeram os escombros, palco do movimento estudantil da década de 1960, um dos cenários do fim da Guerra Fria e da queda do comunismo.
É difícil dizer se a rejeição ao projeto de Bolsonaro está relacionada à convivência diária com as memórias do passado de Berlim. É possível que, desde que passaram a viver na cidade, alguns brasileiros tenham aberto os olhos para os perigos do autoritarismo, tanto de direita quanto de esquerda.
Acredito que o não ao autoritarismo tenha origem numa série de fatores. Muitos dos brasileiros que moram aqui talvez tenham escolhido Berlim para viver justamente por ser uma cidade cosmopolita e aberta a todas as diferenças, sem preconceitos e ódio. Uma cidade capaz de levar 240 mil pessoas às ruas em marcha por mais solidariedade e tolerância.
Clarissa Neher trabalha como jornalista freelancer para a DW Brasil e mora desde 2008 na capital alemã. Na coluna Checkpoint Berlim, publicada às segundas-feiras, escreve sobre a cidade que já não é mais tão pobre, mas continua sexy.
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1989: a primeira eleição direta da redemocratização
Os brasileiros voltaram a escolher diretamente um presidente depois de 27 anos. Um total de 22 candidatos se apresentou – até hoje um recorde. O pleito foi marcado por debates na TV e acusações de manipulação jornalística. Fernando Collor, filiado a um partido nanico, largou na frente ao se apresentar como “caçador de marajás”. No final, Collor derrotou o líder sindical Lula (PT) no 2° turno.
Foto: Radiobras/Roosewelt Pinheiro
1994: o início da era tucana
No início de 94, o pleito tinha um favorito: Lula. No entanto, alguns meses antes da eleição foi lançado o Plano Real, bem-sucedido em conter a inflação. A popularidade de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), um dos autores do plano, disparou. Lula, que havia criticado o real, afundou nas pesquisas. FHC acabou vencendo a eleição ainda no 1° turno. Era o início de oito anos de hegemonia do PSDB.
Foto: Acervo FHC
1998: a reeleição entra em cena
Em 1997, foi aprovada a emenda da reeleição– com denúncias de compra de votos –, abrindo caminho para FHC disputar mais um mandato. Mais uma vez seu adversário foi Lula, que indicou Leonel Brizola, seu antigo rival na esquerda, como vice. Durante a campanha, o governo omitiu que o real estava sobrevalorizado. FHC foi eleito no 1° turno. Depois da posse, o real sofreu uma desvalorização recorde.
Foto: Acervo FHC/Secretaria de Imprensa
2002: o início da hegemonia petista
Lula chegou à eleição com uma nova imagem: se comprometeu a apoiar o plano real, nomeou um empresário como vice e recorreu a marqueteiros. A estratégia para acalmar o mercado deu certo. Ciro Gomes chegou a despontar em segundo lugar, mas afundou após uma série de declarações que repercutiram mal. No final, Lula derrotou o candidato do governo FHC, José Serra, no segundo turno, com 61% dos votos.
Foto: Agência Brasil/M. Casal Jr.
2006: escândalos não impedem reeleição de Lula
Lula se candidatou novamente após a eclosão do escândalo do Mensalão. Parecia destinado a vencer no 1° turno, mas a prisão de assessores do PT na reta final abalou sua campanha. No 2° turno, os petistas contra-atacaram. Rotularam o tucano Geraldo Alckmin de privatista e de ser contra o Bolsa Família. Alckmin acabou recebendo menos votos no 2° turno do que na primeira rodada, e Lula foi reeleito.
Foto: Instituto Lula/R. Stuckert
2010: a primeira presidente mulher
Com alto índice de popularidade, Lula apresentou Dilma Rousseff como candidata à sucessão. Os tucanos voltaram a lançar José Serra, e a ex-ministra Marina Silva disputou pela primeira vez. A campanha de Serra tentou encurralar Dilma ao acusá-la de ser favorável ao aborto. No final, pesou a popularidade de Lula, e a petista ganhou no 2° turno, se tornando a primeira mulher a chegar à Presidência.
Foto: Agência Brasil/W. Dias
2014: a campanha mais cara e acirrada
Nova polarização entre PSDB e PT: Dilma disputou um novo mandato com Aécio Neves. Após a morte de Eduardo Campos (PSB), Marina Silva entrou na corrida, mas desabou nas pesquisas após ataques do PT. Dilma foi reeleita com apenas 3,28 pontos percentuais a mais que Aécio no 2° turno. A petista e o tucano gastaram R$ 570 milhões - com muitas doações de empresas acusadas de corrupção na Lava Jato.
Foto: Reuters/R. Moraes
2018: polarização entre PT e Bolsonaro
Após uma campanha que acirrou ânimos e dividiu o país, Jair Bolsonaro (PSL) foi eleito com 55,13% dos votos, contra 44,87% de Fernando Haddad (PT). A vitória do ex-capitão defensor do regime militar marcou a volta da extrema direita brasileira ao poder e representou um fracasso para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que nesse pleito estava preso por corrupção e impedido de se candidatar.
Foto: Reuters/P. Whitaker/N. Doce
2022: inédita disputa entre presidente e ex-presidente
Os candidatos mais bem posicionados nas pesquisas são o presidente Jair Bolsonaro (PL), que disputa reeleição, e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que recuperou os direitos políticos. Bolsonaro ampliou benefícios sociais às vésperas da campanha e vem questionando o sistema eleitoral. Já Lula busca aliança ampla contra extrema direita e capitalizar sua experiência anterior no governo.