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A xenofobia chegou ao "centro"

(sv)7 de dezembro de 2004

Estudo da Universidade de Bielefeld aponta rumos nada alentadores para a Alemanha: um abismo crescente entre ricos e pobres e níveis cada vez mais altos de xenofobia e aversão a minorias.

Segregação étnica: direções opostasFoto: dpa

O professor universitário Wilhelm Heitmeyer voltou às páginas dos jornais alemães na última semana. A razão é simples: Heitmeyer coordena um estudo que já se estende por mais de dez anos, no qual pesquisadores analisam tendências na sociedade alemã em relação a grupos sociais minoritários. Trata-se da terceira publicação de uma série intitulada, não por acaso, Estados Alemães (Deutsche Zustände).

Islamofobia

Se os resultados anteriores já haviam causado preocupação, eles passaram a parecer até inofensivos, se comparados aos atuais. Estes apontam que mais de 65% da população defende posições xenófobas e, mesmo assim, se autoclassifica de "centro" em questões de ordem política.

O mesmo percentual acredita ainda que o número de estrangeiros vivendo na Alemanha é alto demais e boa parte não tem pudor em destilar fartas doses do que os pesquisadores chamam de "islamofobia". Heitmeyer observa que "hoje, quase 58% da população não pode se imaginar vivendo em um bairro habitado por muitos muçulmanos".

As conseqüências de tal postura, de acordo com o estudo, são claras: desintegração social, segregação étnica e o recuo dos migrantes com a formação de guetos. "Isso deveria ficar claro: se entre a população existem posições avessas ao islã e, de certo modo, aos muçulmanos em geral, isso acaba sendo a água que move os moinhos de grupos islâmicos extremistas", diz Heitmeyer.

Desigualdade e preconceitos

Cineasta holandês Theo van Gogh, assassinado em Amsterdã em novembroFoto: AP

A partir de pesquisas empíricas, o estudo observa algumas tendências de "racha" na sociedade: entre ricos e pobres, entre ex-alemães orientais e ex-ocidentais e, a mais grave de todas, entre a maioria da população e uma suposta "minoria muçulmana".

Suposta porque o cidadão comum tende, muitas vezes, a colocar tudo em uma "panela só", como observou o diário berlinense taz por ocasião do assassinato do cineasta Theo van Gogh na Holanda, em novembro último: "Islã, islamismo, o ingresso da Turquia na União Européia, muçulmanos, sociedades paralelas, repressão de mulheres, o conflito no Oriente Médio, o fim da sociedade multicultural – tudo vem sendo jogado numa panela só. E o muçulmano comum, o turco, árabe, o nosso vizinho então, é colocado na categoria de risco para a segurança".

Cadeia de ações e reações

Desempregados na ex-Alemanha OrientalFoto: AP

Algumas das causas deste tipo de comportamento estão, de acordo com os pesquisadores da Universidade de Bielefeld, intimamente ligadas à perda da confiança nas lideranças políticas e nas instituições democráticas. Perda essa que tende a crescer cada vez mais com o alto desemprego no país e com as recentes reformas tributária, do mercado de trabalho e dos sistemas de saúde e previdência.

"Crescem então mentalidades hostis, que se voltam contra os grupos mais frágeis da sociedade, que, por sua vez, quando são capazes de se articular e mobilizar, reagem com rejeição, distância, recuo e até com formas ocultas de agressão", analisa Heitmeyer no semanário Die Zeit.

E essas novas formas de xenofobia do século 21 não caminham sozinhas, segundo o pesquisador. Aliada a elas está também uma crescente aversão ao homossexualismo (apesar dos evidentes progressos na legislação do país) e um desejo cada vez mais nítido de eliminar mendigos e desabrigados da paisagem urbana dos grandes centros.

Cultura dominante

Muçulmanos no bairro de Kreuzberg, em BerlimFoto: AP

E a cadeia de reações não pára por aí. O próximo degrau é preenchido pela mídia e por parte da classe política, em defesa do que chamam de "cultura dominante" (leitkultur). "Começa a parecer senso comum que não só o mundo árabe-muçulmano, mas também o árabe em si é renitente a reformas, bárbaro e simplesmente incompatível com a Modernidade", analisa o diário taz.

Tal fenômeno acaba por acentuar os abismos internos no país, cujos efeitos, segundo Heitmeyer, desembocam num "esvaziamento da democracia". Esvaziamento este que leva parte da população a apoiar facções de extrema direita e a se resignar numa espécie de apatia política.

Como no início dos anos 80?

A análise do "estados das coisas" leva o jornal berlinense taz ao alerta: "A atmosfera lembra o início dos anos 80, quando a elite política e a mídia na Alemanha adotaram um discurso antiturco. A título de lembrança: as conseqüências foram homicídios por motivos racistas, mobilização nas ruas e um clima político interno que se manteve envenenado por vários anos".

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