Adversários nas eleições, Aécio e Dilma debatem no Senado
30 de agosto de 2016
Nos momentos finais do julgamento do impeachment, senador acusa Dilma de ter mentido na eleição presidencial de 2014 e diz que "voto não é salvo-conduto". Petista rebate e cita medidas políticas para "desestabilizá-la".
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Em sessão histórica, Dilma faz apelo aos senadores
01:23
O senador Aécio Neves (PSDB-MG), adversário de Dilma Rousseff na última eleição presidencial, em 2014, foi um dos parlamentares a questionar a petista durante a sessão desta segunda-feira (29/08) do julgamento do processo de impeachment, dedicada à defesa pessoal da presidente afastada.
"Não poderia imaginar que, depois de nos despedirmos do último debate eleitoral, nos encontraríamos aqui hoje, no Senado Federal, nessa condição", disse Aécio a Dilma no início do discurso.
"Digo isso porque, acredite, não ajo hoje com nenhum sentimento de alegria ao questioná-la, mas ajo com o sentimento da mais absoluta responsabilidade que a minha função de senador me obriga."
O parlamentar, rebatendo o pronunciamento inicial de Dilma nesta segunda-feira, negou que sua atuação no corrente processo de impeachment tenha qualquer relação com um suposto "inconformismo" diante do resultado da última eleição presidencial, da qual saiu derrotado.
"Não é desonra alguma perder as eleições, sobretudo quando se defende ideias e se cumpre a lei. Eu não diria o mesmo de quando se vence as eleições faltando com a verdade e cometendo ilegalidades", afirmou Aécio, iniciando uma série de críticas contra a presidente afastada.
O senador mineiro ainda rechaçou o argumento usado pela defesa de que o processo de impeachment é um golpe, apoiando-se no fato de que ela foi eleita legitimamente com 54 milhões de votos.
"Vossa Excelência recorre aos votos que recebeu como justificativa para todas as atitudes que tomou. O voto não é um salvo-conduto. É uma delegação, que pressupõe deveres e diretos. E o maior dos deveres de quem recebe votos é exatamente o respeito às leis e à Constituição", destacou Aécio.
O tucano citou algumas afirmações de Dilma na época da campanha eleitoral de 2014 a respeito da situação econômica do Brasil. Aécio lembrou que, em setembro daquele ano, num debate televisivo, a petista afirmou que a inflação estava próximo de zero. "Não foi o que 2015 mostrou", rebateu ele.
Dilma responde
Em resposta às declarações do ex-rival na disputa presidencial, a presidente afastada admitiu que também "jamais imaginaria que, depois de todos os nossos debates durante a campanha eleitoral que envolveu o voto de 110 milhões de brasileiros e brasileiras, nós nos encontrássemos aqui hoje".
Dilma afirmou que, após a reeleição, uma série de medidas políticas foram tomadas para desestabilizar seu governo. "Primeiro, pediu-se a recontagem dos votos. Depois, pediu-se auditoria nas urnas. Nos dois casos, após um ano, verificou-se que isso não tinha nenhuma irregularidade", lembrou a petista.
"Na sequência, levantou-se a necessidade de auditar as minhas contas", continuou Dilma, acrescentando que Aécio tem acusado-a "sistematicamente" por supostas irregularidades, enquanto ele próprio tem suas contas de campanha sob investigação.
Respondendo às acusações do senador mineiro a respeito da crise econômica brasileira, a petista se defendeu afirmando que "tivemos um ano muito específico e diferente em 2014".
Dilma citou, por exemplo, a queda dos preços das commodities, como petróleo e minério de ferro, que impactou na arrecadação, e também a grave crise energética.
Ela ainda destacou a saída dos Estados Unidos da política de expansão fiscal logo após sua reeleição, o que elevou os juros americanos e gerou uma desvalorização generalizada das moedas. "Não foi só o real, foram todas as moedas, provocando um efeito na inflação", justificou a petista.
Além da crise econômica, o Brasil vive ainda uma forte crise política, afirmou Dilma, que teria se agravado com a eleição de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) como presidente da Câmara dos Deputados, em fevereiro de 2015. "Isso produziu uma situação complexa para o meu governo", disse ela.
A presidente afastada acusou Cunha, que renunciou ao cargo de líder da Casa em julho deste ano, de não ter aprovado os projetos que foram enviados pelo governo petista para solucionar a crise fiscal. "Ou eles eram aprovados parcialmente, ou eram rejeitados", afirmou Dilma. "Isso mostra uma artificial conduta no sentido de inviabilizar meu governo. É extremamente grave."
Próximos passos do julgamento
Além de Aécio, pelo menos outros 50 senadores se inscreveram para questionar Dilma na sessão desta segunda-feira, que marca os momentos finais do julgamento do processo de impeachment.
Em seguida, provavelmente nesta terça-feira, devem se pronunciar os 81 senadores. Cada um terá dez minutos, antes de todos proferirem seu voto. A votação será por painel eletrônico, aberta e nominal.
São necessários 54 votos de senadores para que seja decretado o impeachment. Havendo essa maioria, Michel Temer deixa de ser presidente interino e é empossado como presidente da República. Caso contrário, Dilma é absolvida da acusação de crime de responsabilidade e reassume o cargo.
EK/abr/ots/Agência Senado
A cronologia do processo de impeachment
Em dezembro de 2015, Eduardo Cunha dava início ao processo de impeachment da então presidente da República. De "carta-desabafo" à cassação de Dilma Rousseff, relembre os episódios que marcaram o julgamento.
Foto: Reuters/J. Marcelino
O aval
Em 2 de dezembro de 2015, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, autorizou a abertura do processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. A decisão foi tomada no mesmo dia em que a bancada do PT anunciou que votaria pela continuidade do processo de cassação de Cunha no Conselho de Ética, acirrando uma crise política já inflamada no Brasil.
Foto: Getty Images/AFP/Evaristo Sa
Motivo: "pedaladas fiscais"
No mesmo dia, em pronunciamento público, Dilma disse ter recebido "com indignação" a notícia. O pedido de impeachment – apresentado em outubro pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal – acusa a presidente de cometer crime de responsabilidade fiscal, com base na reprovação das contas de 2014 pelo Tribunal de Contas da União, incluindo as chamadas "pedaladas fiscais".
Foto: picture-alliance/dpa
O dia seguinte
Dilma foi notificada oficialmente da abertura do processo em 03/12, logo após Cunha (foto) ler a decisão em plenário. O presidente determinou ainda a criação de uma comissão especial na Câmara dos Deputados para analisar o pedido de impeachment. Na mesma data, o Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou duas ações – uma do PT e outra do PCdoB – que tentavam barrar o processo de afastamento de Dilma.
Foto: Gustavo Lima/Câmara dos Deputados
A carta de Temer
Em 07/12, o vice-presidente Michel Temer enviou uma "carta-desabafo" a Dilma, em que expressa mágoas por ter sido, desde o primeiro mandato, um mero "vice decorativo". Ele diz ainda ter "ciência da absoluta desconfiança" da presidente. Especialistas interpretaram o texto como um rompimento de Temer com Dilma – lembrando que é ele quem assume a presidência caso ela sofra o impeachment.
Foto: AFP/Getty Images/E. Sa
Próximo passo: a comissão
O trâmite do processo exige a formação de uma comissão especial, com 65 deputados titulares e igual número de suplentes, indicados por líderes partidários, em quantidade proporcional ao tamanho de cada bancada – é obrigatória a participação de todas as legendas da Casa. Essa comissão dará um parecer pela abertura ou não do processo, que depois irá a plenário.
Foto: Luis Macedo /ABr
Tumulto na Casa
Em 08/12, a Câmara dos Deputados se reuniu pela primeira vez para definir a comissão especial, em votação secreta marcada por tumulto e quebra-quebra. Concorriam duas chapas: uma formada por deputados simpáticos ao governo, e outra oposicionista, favorável à saída da presidente. Venceu a chapa da oposição, com 39 membros, e uma votação suplementar seria realizada para escolher os nomes restantes.
Foto: Antonio Augusto /ABr
Processo suspenso
Essa votação, porém, nunca foi realizada. Ainda na noite de 08/12, o STF suspendeu a tramitação do processo, impedindo temporariamente a instalação da comissão especial. O plenário da Corte decidiu julgar um pedido liminar do PCdoB sobre a constitucionalidade da lei que regulamenta as normas de julgamento de impeachment. O partido criticou, por exemplo, o voto secreto na escolha da comissão.
Foto: EVARISTO SA/AFP/Getty Images
Novo rito de impeachment
Quase dez dias depois, em 17/12, o plenário do STF determinou algumas mudanças no rito de impeachment, que em sua maioria favoreceram a presidente. Os ministros decidiram conceder maior poder ao Senado na análise do afastamento; determinaram que não cabe voto secreto, nem formação de uma chapa alternativa para compor a comissão; mas negaram o pedido do PCdoB de afastar Cunha do processo.
Foto: Roberto Stuckert Filho
Recesso parlamentar
Para angústia do governo – que chegou a sugerir o cancelamento da pausa parlamentar de janeiro –, a análise do processo de impeachment entrou em hiato no fim de dezembro e assim permaneceu até 2 de fevereiro, quando os parlamentares voltaram do recesso. Segundo Cunha, a expectativa era de votar a comissão especial e concluir o processo na Câmara até março, para seguir para julgamento no Senado.
Foto: picture-alliance/Lou Avers
STF analisa embargos
O teor do acórdão em que o STF considera inconstitucionais alguns aspectos do processo de eleição da comissão especial da Câmara foi publicado em 08/03. No mesmo dia, a Câmara reapresentou os questionamentos e pediu a revisão do rito de impeachment pelos ministros do Supremo. Em votação realizada em 16/03, porém, a Corte rejeitou os recursos de Cunha e decidiu manter o rito definido em dezembro.
Foto: Agência Brasil/J. Cruz
Comissão está formada
A comissão especial, responsável por analisar o pedido de impeachment na Câmara, foi finalmente formada em 17/03, com deputados indicados pelos próprios líderes partidários. O relator da comissão é Jovair Arantes, líder do PTB na Casa e um dos principais aliados de Eduardo Cunha; e o presidente é Rogério Rosso, líder do PSD na Câmara.
Foto: G.Lima/Câmara dos Deputados
Trabalhos da comissão
Em 30/3, os membros da comissão ouviram dois autores do pedido de impeachment: os juristas Miguel Reale Jr. e Janaína Paschoal. No dia seguinte, o ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, foi ouvido como testemunha de defesa. No dia 4/4, o ministro José Eduardo Cardozo, da Advocacia-Geral da União, entregou a defesa escrita da presidente e fez a sustentação oral.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Comissão instaura processo
Parlamentares da comissão especial do impeachment votaram no dia 11/04 pela abertura do processo de impedimento da presidente Dilma Rousseff, em sessão marcada por troca de insultos. O placar sobre o parecer do relator Jovair Arantes (PTB-GO) foi de 38 votos a favor e 27 contra.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
A votação na Câmara
Com o parecer admitido pela comissão especial, o processo seguiu para votação no plenário da Câmara dos Deputados. No dia 17/04, em sessão tumultuada e acalorada, os parlamentares decidiram pela continuidade do processo de impeachment, com 367 votos a favor e 137 contra – eram necessários 342 votos favoráveis para a aprovação. A questão segue agora para análise no Senado.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Comissão especial de senadores
Dois dias após a apresentação do parecer do relator Antonio Anastasia (PSDB-MG, foto), favorável ao afastamento de Dilma, a comissão especial do Senado aprovou, em 06/05, a continuidade do processo de impeachment. Dos 21 senadores, 15 votaram pela aprovação, e apenas cinco votaram contra – três do PT, um do PCdoB e outro do PDT. O presidente da comissão, Raimundo Lira (PMDB-PB), não votou.
Foto: Agência Brasil/F. Rodrigues Pozzebom
Anulação da votação
Em 09/05, o presidente interino da Câmara, deputado Waldir Maranhão (PP-MA) – que assumiu o comando da Casa após o afastamento de Eduardo Cunha –, anulou a votação do processo de impeachment realizada na Câmara semanas antes. Horas depois, no mesmo dia, Maranhão voltou atrás na decisão, provocando euforia entre os parlamentares governistas. Votação no Senado aconteceria em apenas dois dias.
Foto: Imago/Zumapress
Senado aprova afastamento da presidente
Em 12/05, após uma sessão de mais de 20 horas, o Senado aprovou por clara maioria a continuidade do processo de impeachment de Dilma. Foram 55 votos a favor do impedimento e 22 contrários. Após o aval dos senadores, a presidente fica afastada por 180 dias, enquanto é julgada, e o vice Michel Temer assume a presidência interinamente.
Foto: Getty Images/M.Tama
Relator defende julgamento final
Em seu relatório final sobre o processo de impeachment, apresentado em 02/08, o relator e senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) defendeu que Dilma vá a julgamento final pelo crime de responsabilidade fiscal. Anastasia argumentou que a presidente afastada abriu créditos suplementares sem autorização do Congresso Nacional e praticou as chamadas pedaladas fiscais.
Foto: Reuters/U.Marcelino
Comissão aprova relatório
Em 04/08, a Comissão Especial do Impeachment no Senado aprovou o relatório do senador Anastasia, favorável ao prosseguimento do processo de impeachment contra Dilma. Dos 21 senadores que compõem a comissão, 15 votaram a favor da continuação do processo, e cinco, contra. Com isso, a comissão encerrou os trabalhos. O relatório seguiu para votação por todos os 81 senadores.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Senado decide levar Dilma a julgamento
Em 10/08, os senadores decidiram, por 59 votos contra 21, levar Dilma a julgamento. A maioria dos senadores seguiu o parecer do relator Anastasia, cujo relatório havia sido aprovado pela comissão especial do impeachment. O resultado indica que Dilma terá dificuldade para reverter seu afastamento definitivo na votação final. Para a condenação são necessários 54 votos.
Foto: Reuters/A. Machado
Iniciada fase final do processo
O Senado deu início à fase final do processo de impeachment no dia 25/08, quase nove meses após sua abertura. O primeiro dia de audiência teve mais de 15 horas de duração e foi marcado por bate-boca entre petistas e senadores favoráveis à saída definitiva de Dilma. O julgamento, que começou com os depoimentos de testemunhas, é comandado pelo presidente do STF, Ricardo Lewandowski.
Foto: Reuters/U. Marcelino
Discurso de defesa de Dilma
Em 29 de agosto, a presidente afastada Dilma Rousseff apresentou sua defesa da acusação de crime de responsabilidade no Senado. Em sua fala, a petista garantiu que sempre seguiu a Constituição, lembrou os tempos da ditadura militar, usou repetidas vezes o termo golpe e reiterou sua luta pela democracia. "Jamais haverá justiça na minha condenação", afirmou.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Dilma é cassada pelo Senado
Na votação final do processo de impeachment, o Senado decidiu, em 31/08, afastar em definitivo Dilma da Presidência da República. Foram 61 votos favoráveis ao impeachment e 20 contrários – eram necessários 54 para a cassação. Todos os 81 senadores participaram da sessão. Em segunda votação, porém, os parlamentares decidiram por manter o direito de Dilma de exercer cargos públicos.