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Ajuda à África é só "retórica", diz especialista alemão

Ingo Uhlenbruch (as)10 de junho de 2005

Em entrevista à DW-WORLD, especialista alemão critica a intenção divulgada pelo governos Bush e Blair de perdoar dívidas de 18 países pobres, a maioria africanos.

Bush e Blair não estariam avançando no combate à pobrezaFoto: ap


Os Estados Unidos e o Reino Unido divulgaram esta semana que irão perdoar as dívidas de 18 países, a maioria da África. O projeto foi anunciado pelo ministro britânico das Finanças, Gordon Brown, e pelo secretário do Tesouro dos Estados Unidos, John Snow, durante o encontro do G-8 em Londres (10 e 11/06). O valor total das dívidas a serem perdoadas é de 16,7 bilhões de dólares. Segundo os dois governos, a intenção é facilitar o desenvolvimento desses países e a busca de novos créditos internacionais para programas sociais, de desenvolvimento e de saúde.

O encontro do G-8 reúne os sete países mais ricos do mundo e a Rússia. O principal assunto do encontro é o perdão das dívidas de países africanos com organismos internacionais, como o FMI, o Banco Mundial e o Banco Africano de Desenvolvimento.

Dirk Kohnert, do Instituto de Estudos Africanos de Hamburgo

Para o especialista do Instituto de Estudos Africanos de Hamburgo Dirk Kohnert, a intenção divulgada pelo presidente George W. Bush e pelo primeiro-ministro Tony Blair é apenas "retórica". Em entrevista à DW-WORLD, ele explicou por que é contra o simples perdão da dívida dos países africanos.

DW-WORLD: O presidente George W. Bush e o primeiro-ministro Tony Blair defendem o perdão da dívida dos mais pobres países da África. O novo presidente do Banco Mundial, Paul Wolfowitz, quer transformar o combate à pobreza na África em prioridade. A África pode finalmente respirar?

Dirk Kohnert: Seria bom se a África pudesse finalmente respirar, afinal a África está entre as regiões mais pobres do mundo. Aos meus olhos, porém, os discursos de Bush e Blair não são mais do que retórica. Se há um motivo respeitável para essa súbita iniciativa, é a redução da pobreza mundial à metade até o ano 2015, como consta nas Metas do Milênio da ONU, divulgadas em 2000. Mas interesses econômicos dos países credores devem ter um papel muito mais importante. Sejam quais forem os motivos: eu sou totalmente contra esse tipo de perdão incondicional, porque por meio dele regimes corruptos, como de Togo ou da Nigéria, são incentivados.

Condições para o perdão das dívidas são a implementação de reformas para introduzir o Estado de direito e de combate à corrupção. É essa uma oferta justa para a África?

Se a proposta fosse séria, poderíamos falar de ofertas justas. Mas a realidade é outra: a França, para citar apenas um exemplo, oficialmente apóia os esforços de reformas e os objetivos do Nepad (Nova Parceria para o Desenvolvimento da África), mas internamente o governo francês fecha os olhos para a realidade e não apenas tolera governos corruptos na África, como ainda os incentiva.

Quais regiões africanas poderiam ganhar mais com o perdão de dívidas?

Principalmente Benin, Togo ou Nigéria poderiam ganhar com essa iniciativa, ainda que a Nigéria, devido às suas grandes reservas de petróleo, de maneira alguma deve ser relacionada entre os países pobres. A Nigéria está muito mais próxima de ser um país emergente.

As ajudas financeiras à África trouxeram resultados positivos?

Apenas em nível local há resultados positivos visíveis, numa esfera mais ampla não há nada. Mas não se deve desconsiderar os pequenos sucessos – e exatamente por isso não se deve retirar a ajuda ao desenvolvimento, o que seria contraprodutivo.

O que o senhor diz sobre a acusação de que a África é culpada pela própria miséria econômica?

Sem dúvida a situação na África é, em muitos casos, a conseqüência de más administrações locais. Mas também devemos considerar que governos corruptos foram tolerados e apoiados durante anos. Os países credores não são exatamente sem culpa pela atual situação. Dos espíritos, que eles uma vez invocaram, eles não irão se livrar tão rápido.

Os países industrializados podem se permitir uma expansão da ajuda ao desenvolvimento se muitos deles se debatem com orçamentos reduzidos?

O aumento dos incentivos não é o único problema. O ponto fraco dos atuais incentivos é a correta divisão das ajudas financeiras. Grande parte da ajuda financeira simplesmente não chega aonde ela deveria chegar. Nesse aspecto ainda há muito por fazer.

Uma outra alternativa de apoio à África é um incentivo econômico selecionado. Há na África regiões especialmente atraentes para investidores?

A África é tudo menos uma região atraente para investidores privados, por isso que há anos os investimentos diminuem. Há muitos obstáculos formais e informais ao comércio. Essas barreiras devem primeiro ser desmontadas, para que se possa oferecer produtos.

Quais produtos africanos seriam promissores?

Há principalmente extensas reservas de petróleo, principalmente no Golfo de Guiné e na costa da África ocidental. Ouro, diamantes e algodão, entre outros, também poderiam ser comercializados com sucesso pela África. Mas riqueza raramente é uma questão de recursos. Há poucos países que são pobres por possuírem poucos recursos.

Qual o papel da iniciativa Nepad no desenvolvimento da África?

Os objetivos da Nepad são reconhecidos internacionalmente, ainda que as posições dos países credores às vezes se diferenciem. No meu ponto de vista, a Nepad é uma iniciativa louvável. Alguns dissidentes africanos, porém, criticam a Nepad por ela se orientar excessivamente em torno dos objetivos propostos pelas comunidades credoras.

Na sua opinião, quais os procedimentos necessários para estabilizar a África economicamente e politicamente?

Em primeiro lugar, muitas subvenções deveriam ser eliminadas em todo o mundo, porque elas agravam o comércio dos produtos africanos. Há, por exemplo, dificuldades para açúcar, bananas e algodão. Mas eu parto do pressuposto de que não há chances para a remoção das subvenções. Uma outra iniciativa seria o perdão de dívidas apenas para países que seguirem as recomendações da Nepad sem "se" e "mas".

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