Estudo do instituto alemão IfW mostra ainda que contribuições para a Ucrânia são bem inferiores às subvenções internas para compensar alta de preços no setor energético.
Anúncio
O presidente Joe Biden anunciou, durante sua curta visita a Kiev, nesta segunda-feira (20/02), que nos próximos dias vai liberar novos envios de armas à Ucrânia no valor de 500 milhões de dólares. Trata-se de munição para artilharia, de obuses e lançadores de mísseis antitanques e portáteis do tipo Javelin.
O anúncio foi feito durante uma visita de forte caráter simbólico, ocorrida pouco antes de a invasão russa completar um ano, e corrobora a percepção de liderança americana na ajuda ao país europeu. "Os americanos dão o tom no apoio à Ucrânia", comenta o economista Christoph Trebesch, que analisa a ajuda ocidental ao país para o Instituto de Economia Mundial (IfW), sediado em Kiel, na Alemanha.
"A hesitação dos europeus durante o primeiro ano da guerra é um fenômeno digno de nota, sobretudo porque recursos financeiros podem ser mobilizados rapidamente", diz Trebesch. Ele se refere sobretudo às contribuições dos países da União Europeia (UE) ao orçamento ucraniano, em especial diante da queda de 40% na economia da Ucrânia depois do início da guerra de agressão da Rússia.
Na sua análise sobre a ajuda financeira para a Ucrânia, os economistas do IfW incluem tanto as ajudas financeiras diretas e a ajuda humanitária quanto os custos das armas enviadas à Ucrânia. Armamentos dos estoques militares, como por exemplo da Bundeswehr, têm seu valor de mercado calculado e incluídos na conta.
Pelas contas do instituto, os Estados Unidos, com "novas promessas no valor de 37 bilhões de euros", voltaram a superar a UE e seus países-membros. A ajuda americana, tanto a já enviada como a ainda prometida, chega a 73,1 bilhões de euros, ante 54,9 bilhões de euros da UE. Os Estados Unidos são o primeiro país na lista da ajuda internacional, seguidos pelo Reino Unido e pela Alemanha.
Subvenções internas custam muito mais
Na sua análise mais recente, a equipe de Trebesch comparou a ajuda à Ucrânia com outras despesas nos mais de 50 países apoiadores que integram o Grupo de Contato da Ucrânia. Eles concluíram que, no todo, as ajudas enviadas à Ucrânia equivalem apenas a uma pequena parte do que os governos mobilizaram para amortecer os efeitos da guerra nos próprios países.
Por exemplo no caso da Alemanha, que, desde janeiro de 2022, já anunciou mais de 250 bilhões de euros em subvenções para amortecer a alta nos preços da energia para os consumidores e as empresas.
A ajuda bilateral da Alemanha à Ucrânia chega a 6,15 bilhões de euros. Só as subvenções que o governo alemão bancou para amortecer o preço dos combustíveis e para financiar o bilhete de 9 euros para uso ilimitado do transporte público somaram 5,65 bilhões de euros. Essas duas medidas foram adotadas pelo governo alemão para amortecer o choque de preços no setor energético para o consumidor final no início da guerra.
Nos seus cálculos, os economistas ainda não incluíram os tanques de guerra, como os Leopard 2, que foram prometidos para março por vários países ocidentais. Os economistas consideraram as promessas feitas por alguns desses países como ainda muito imprecisas.
Anúncio
Outras guerras custaram mais
Na sua análise mais recente, os economistas também incluíram pela primeira vez uma comparação com as ajudas para outras guerras recentes.
Na época, esse dinheiro foi enviado aos Estados Unidos, e a Alemanha não participou militarmente da Operação Tempestade no Deserto.
Também os Estados Unidos gastaram mais então: o equivalente a 1% do PIB, bem menos do que o 0,4% enviado até aqui para a Ucrânia.
Os gastos anuais dos Estados Unidos no Afeganistão entre 2001 e 2010 também eram bem maiores: três vezes mais do que o despendido no primeiro ano da guerra na Ucrânia, considerando o valor na relação com o PIB. Porém, ao contrário do que ocorre na Ucrânia, os Estados Unidos também enviaram soldados para o combate no Afeganistão, com os correspondentes custos de manutenção das tropas no exterior.
Variações ao longo de 2022
Os economistas também constataram que os valores enviados e prometidos à Ucrânia caíram em junho passado, passando de 20 bilhões de euros em maio para 5 bilhões de euros em junho.
O valor só voltou a subir em novembro, depois das bem-sucedidas recuperações de terreno dos militares ucranianos no leste e no sul do país: primeiramente com o anúncio da UE de que iria apoiar a Ucrânia financeiramente em 2023, depois com a aprovação do pacote militar dos EUA, com o qual o Congresso aprovou 37 bilhões de euros em ajuda em dezembro passado.
É desse pacote que saíram os 500 milhões de euros em envio de armamentos anunciados por Biden durante sua visita em Kiev, juntamente com a promessa do presidente de que o apoio dos EUA à Ucrânia é inabalável.
Um ano de guerra da Ucrânia: uma linha do tempo em imagens
Na manhã de 24 de fevereiro de 2022, a Rússia invadiu a Ucrânia. Em um ano de combates, milhares de soldados e civis perderam a vida. Relembre os fatos mais marcantes nesta linha do tempo.
Foto: Anatolii Stepanov/AFP/Getty Images
Um dia sombrio para milhões
Na manhã de 24 de fevereiro de 2022, os ucranianos foram acordados por explosões como esta na capital, Kiev. A Rússia havia iniciado uma invasão em grande escala, marcando o maior ataque de um país contra outro desde a Segunda Guerra Mundial. A Ucrânia imediatamente declarou a lei marcial. Estruturas civis passaram a ser atacadas e logo começaram a ser relatadas as primeiras mortes.
Foto: Ukrainian President s Office/Zuma/imago images
Bombardeios impiedosos
O presidente russo, Vladimir Putin, insiste ainda hoje tratar-se de uma "operação militar especial" e que o objetivo é tomar as regiões de Donetsk e Luhansk, no leste da Ucrânia. Moradores de Mariupol se abrigaram em porões por semanas. Muitos morreram sob os escombros. Um ataque aéreo russo em março a um teatro da cidade onde centenas se refugiavam foi condenado por grupos de direitos humanos.
Foto: Nikolai Trishin/TASS/dpa/picture alliance
Êxodo em massa
A guerra na Ucrânia forçou uma emigração nunca vista na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. De acordo com a Acnur, a agência de refugiados da ONU, mais de 8 milhões de pessoas fugiram do país. Só a Polônia acolheu 1,5 milhão de pessoas, mais do que qualquer outro Estado da UE. Milhões de pessoas, principalmente do leste e do sul da Ucrânia, foram forçadas a fugir.
Foto: Anatolii Stepanov/AFP
Cenas de horror em Bucha
Após algumas semanas, o exército ucraniano conseguiu expulsar as forças russas de áreas no norte e nordeste do país. O plano da Rússia de sitiar Kiev fracassou. Depois que as regiões foram libertadas, a extensão das atrocidades tornou-se aparente. Imagens de civis torturados e assassinados em Bucha, perto de Kiev, deram a volta ao mundo. As autoridades relataram 461 mortes.
Foto: Carol Guzy/ZUMA PRESS/dpa/picture alliance
Devastação e morte em Kramatorsk
O número de vítimas civis em Donbass aumentou rapidamente. As autoridades pediram à população civil para recuar para áreas mais seguras, mas os mísseis russos também atingiram as pessoas enquanto tentavam escapar, inclusive em Kramatorsk. Mais de 61 foram mortos e 120 ficaram feridos na estação ferroviária da cidade em abril, quando milhares esperavam para fugir para um local mais seguro.
Durante os ataques aéreos russos, milhões de ucranianos buscaram refúgio em algum tipo de abrigo. Para as pessoas próximas às linhas de frente dentro do alcance da artilharia, os porões se tornaram segundos lares. Moradores de grandes cidades também buscaram abrigo dos mísseis. Em Kiev (foto) e em Kharkiv, as estações de metrô funcionam como locais seguros.
Foto: Dimitar Dilkoff/AFP/Getty Images
Alto risco nuclear em Zaporíjia
Nas primeiras semanas após a invasão, a Rússia ocupou uma grande área das regiões sul e leste da Ucrânia, inclusive as proximidades de Kiev. Os combates se espalharam para as instalações do complexo nuclear de Zaporíjia, no sudeste, que está sob controle russo desde então. A Agência Internacional de Energia Atômica enviou especialistas para a usina e pediu uma zona segura ao redor da instalação.
Foto: Str./AFP/Getty Images
Resistência desesperada em Mariupol
O exército russo manteve Mariupol sob cerco por três meses, impedindo o envio de munição e outros suprimentos. O complexo siderúrgico Asovstal era o último reduto ucraniano na cidade, abrigando milhares de soldados e civis. Depois de um ataque prolongado, em maio de 2022 milhares de soldados russos assumiram o controle da usina, capturando mais de 2 mil pessoas.
Foto: Dmytro 'Orest' Kozatskyi/AFP
Um símbolo de resistência
A Rússia conquistou a Ilha das Cobras, no Mar Negro, no primeiro dia da guerra. Um diálogo entre militares ucranianos e russos, na qual os ucranianos se recusaram a se render, se tornou viral. Em abril, os ucranianos afirmaram ter afundado o navio de guerra russo Moskva, uma das duas embarcações envolvidas no ataque à ilha. Em junho, a Ucrânia disse ter expulsado os russos da ilha.
Foto: Ukraine's border guard service/AFP
Número de mortos incerto
O número exato de mortos na guerra permanece incerto. Segundo a ONU, pelo menos 7.200 civis foram mortos e outros 12 mil, feridos – mas os números reais podem ser muito maiores. A quantidade exata de soldados ucranianos tombados também é incerta. Em dezembro, o conselheiro presidencial da Ucrânia, Mykhailo Podolyak, estimou o número em até 13 mil. Estatísticas imparciais não estão disponíveis.
Foto: Raphael Lafargue/abaca/picture alliance
Divisor de águas para a Ucrânia
O envio de armas ocidentais à Ucrânia tem sido um assunto polêmico desde o começo da guerra, mas elas demoraram a chegar a Kiev. Os lançadores de foguetes Himars, fabricados nos EUA, foram uma ajuda decisiva. Eles permitiram que os militares ucranianos cortassem o abastecimento de munição para a artilharia russa e provavelmente também contribuíram para as contraofensivas bem-sucedidas da Ucrânia.
Foto: James Lefty Larimer/US Army/Zuma Wire/IMAGO
Alívio a cada libertação
No início de setembro, os militares ucranianos conduziram uma contraofensiva bem-sucedida em Kharkiv, no nordeste do país. Os russos, surpreendidos, recuaram rapidamente, deixando para trás equipamentos, munições e até evidências de supostos crimes de guerra. Os militares ucranianos também conseguiram libertar Kherson, no sul, e seus moradores comemoraram a chegada dos soldados ucranianos.
Foto: Bulent Kilic/AFP/Getty Images
Explosão na ponte da Crimeia
No início de outubro, ocorreu uma grande explosão na ponte que a Rússia construiu sobre o Estreito de Kerch, ligando à Crimeia, península ucraniana que Moscou ocupa desde 2014. A ponte foi parcialmente destruída. A Rússia afirma que um caminhão da Ucrânia carregado de explosivos causou os danos, mas as autoridades em Kiev não assumiram a responsabilidade pelo ataque.
Foto: AFP/Getty Images
Ataques maciços à infraestrutura de energia
Poucos dias após a explosão na ponte da Crimeia, a Rússia começou a atacar em grande escala a infraestrutura de energia da Ucrânia. Quedas de energia ocorreram de Lviv a Kharkiv. Desde então, esses ataques se tornaram rotina. Devido aos enormes danos às usinas de energia e outras infraestruturas civis, as pessoas na Ucrânia enfrentam quedas de energia e escassez de água quase diariamente.
Foto: Genya Savilov/AFP/Getty Images
Apoio do mundo ocidental
Mensagens diárias por vídeo do presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, em que ele relata a situação no país e sobre a guerra em andamento, são vistas por milhões de pessoas. Zelenski não só conseguiu unificar a população de seu país, mas também ganhou o apoio do Ocidente. A integração europeia progrediu muito sob a sua liderança, e a Ucrânia está a caminho da adesão à UE.
Foto: Kenzo Tribouillard/AFP
Esperando por tanques Leopard 2
A defesa da Ucrânia depende muito da ajuda externa. Um grupo de países liderado pelos EUA ofereceu um pacote de bilhões de dólares em ajuda humanitária, financeira e militar. O envio de artilharia pesada foi muito debatido no Ocidente, em grande parte devido a preocupações com a reação da Rússia. Mas a Ucrânia acabará recebendo tanques ocidentais, em sua maioria Leopard 2, de fabricação alemã.
Foto: Ina Fassbender/AFP/Getty Images
Uma cidade em ruínas
Há meses, batalhas sangrentas acontecem em Bakhmut, na região de Donetsk. Desde que as tropas ucranianas perderam o controle do vilarejo de Soledar no início de 2023, defender a cidade tornou-se ainda mais difícil. Em janeiro, o serviço secreto da Alemanha relatou perdas diárias de três dígitos do lado ucraniano. Mas acredita-se que o número de mortos na Rússia seja ainda maior.