Alejandro González Iñárritu, entre realismo e magia
Jochen Kürten (av)28 de agosto de 2014
Diretor mexicano, que marcou o cinema com dramas densos e complexos, arrisca primeira comédia, "Birdman", um amargo acerto de contas com o "showbiz", possivelmente a partir de experiências próprias.
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Há anos Alejandro González Iñárritu é um nome recorrente na cena cinematográfica internacional. Outros grandes festivais do mundo, de Cannes a Toronto, passando por Berlim, incluiriam com prazer uma nova obra dele em seus programas.
Assim, o Festival de Veneza pode se orgulhar de seu filme de abertura. Por outro lado, o quinto longa-metragem do cineasta mexicano parece não se encaixar, em absoluto, no restante de sua obra: Birdman (Homem-Pássaro) é a primeira comédia de Iñárritu.
Inspirado em Dom Quixote
Trata-se de um filme sobre o mundo do cinema. Em primeira linha – mas não exclusivamente – é o drama de um ator ultrapassado à procura da fama perdida. Contudo, é também um drama de humor negro, uma comédia com sabor amargo, talvez também uma expressão das experiências pessoais de Iñárritu no mundo do cinema.
Conta-se a história de um ator de Hollywood (Michael Keaton), que já teve grande projeção como super-herói nas telas. Mas isso foi anos atrás. Agora ele quer reeditar seu antigo sucesso no palco da Broadway e trabalha arduamente por um retorno – que não quer dar certo, de jeito nenhum. De um lado está sua vida privada, que é tudo, menos ordenada; do outro, seu parceiro no palco (Edward Norton) se revela um tipo asqueroso.
71º Festival de Veneza
Serão 11 dias de filmes na cidade italiana. O mais antigo evento do gênero convida o mundo do cinema para a disputa pelos Leões de Ouro e de Prata.
Foto: picture-alliance/Paul Mayall
O leão volta a rugir
Serão 11 dias de filmes, glamour e estrelas. O mais antigo festival de cinema do mundo convida para sua 71ª edição, realizada entre os dias 27 de agosto e 6 de setembro. O prêmio máximo é o Leão de Ouro, inspirado no animal estampado no brasão da cidade. Ao todo, 55 novas produções estão no programa oficial.
Foto: picture-alliance/Paul Mayall
Estreias que prometem
Os chefes do festival – o presidente Paolo Baratta e o diretor artístico Alberto Barbera – montaram um programa variado. Da competição participam 20 filmes. Além disso, produções de destaque de cineastas importantes do mundo todo estão incluídas nas mostras paralelas. A seção "Venice Classics" apresenta 21 obras-primas restauradas.
Foto: Getty Images
"The Cut" é o representante alemão
Depois de ficar de fora da competição na edição anterior, a Alemanha retorna à Veneza com "The Cut", do diretor Fatih Akin. A produção deverá dar o que falar. O filme aborda o controverso tema do genocídio dos armênios pelos turcos durante a Primeira Guerra Mundial e mostra um pai de família em busca de sua filha.
Foto: 71st Venice International Film Festival
Para começar, uma comédia
A disputa pelo Leão de Ouro vai ser aberta com a comédia "Birdman", do diretor mexicano Alejandro González Iñárritu. O filme conta a história de um ator em busca do sucesso. Michael Keaton (à esquerda) faz o papel de uma estrela de cinema que tem que contracenar com vaidosos atores de teatro em peças de segunda categoria.
Foto: 71st Venice International Film Festival
Compositor francês preside júri
Neste ano, quem vai decidir quem leva o Leão de Ouro é um júri chefiado pelo compositor francês Alexandre Desplat. Entre suas trilhas sonoras de maior sucesso estão as de "Moça com Brinco de Pérola", "Harry Potter" e "O Grande Hotel Budapeste". O diretor alemão Philip Gröning, que ganhou um prêmio em Veneza em 2013, também está no júri.
Foto: Taili Song-Roth
Cineasta veterano representa a Rússia
Nos últimos anos, a Rússia não tem se destacado nos grandes festivais de Cannes, Berlim e Veneza. Por isso, é uma alegria que a direção do evento italiano tenha convidado neste ano Andrei Konchalovski, um dos mais conhecidos cineastas do país. Sua produção, "The Postman's White Nights", conta a história de um punhado de gente que vive à margem da civilização.
Foto: 71st Venice International Film Festival
Filme político de Hollywood
"Good Kill", dirigido pelo neo-zelandês Andrew Niccol, é uma das cinco produções dos EUA na competição. Ele conta a história de um piloto americano (Ethan Hawke, na foto) especialista na operação de drones no Oriente Médio. Com o tempo, sua consciência começa a se perguntar sobre o valor e o sentido dessa forma moderna de guerra.
Foto: 71st Venice International Film Festival
O novo e o velho em Veneza
Os grandes festivais hoje apresentam mais do que uma competição por ursos, leões e palmas. Eles oferecem uma grande variedade de opções, com mostras paralelas com produções do mundo inteiro e retrospectivas históricas homenageando os grandes da sétima arte. Eles também têm uma feira na qual a indústria globalizada do cinema vende e compra seus produtos.
Foto: picture-alliance/dpa
História do cinema sob nova perspectiva
Não só o filme de abertura lida com o próprio mundo do cinema. A produção do americano Abel Ferrara trata da vida do diretor italiano Pier Paolo Pasolini, interpretado pelo também americano Willem Dafoe.
Foto: 71st Venice International Film Festival
Presença forte do cinema francês
A França manda quatro filmes para a competição deste ano. Um deles é "La Rançon de la Gloire", de Xavier Beauvois, baseado na história real de dois homens que planejam roubar o caixão de Charlie Chaplin na Suíça.
Foto: 71st Venice International Film Festival
Olhar do documentário
Em 2013, o documentário italiano "Sacro GRA" ganhou o prêmio principal. A competição deste ano também traz uma produção do gênero. Desta vez, "The Look of Silence", de Joshua Oppenheimer, disputa o Leão de Ouro. O diretor ganhou o Oscar de melhor documentário em 2014 por "The Act of Killing".
Foto: 71st Venice International Film Festival
Filmes, estrelas, estreias, galas
Na noite de 6 de setembro serão anunciados os grandes vencedores do festival italiano. Ano passado, a opção por premiar um documentário não colheu só elogios. Mas decisões do júri em grandes festivais dificilmente são unânimes. Muita é a variedade dos filmes competidores – e também das personalidades que compõem os júris.
Foto: la Biennale di Venezia
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Para o diretor, Birdman é, acima de tudo, um filme sobre a psique humana, "sobre a batalha em nós, as lutas pelo próprio ego". Iñárritu compara a personagem do ator antes famoso à de Dom Quixote. "Nós, seres humanos, somos parte de uma comédia absurda, marcada por erros e azares." Essa batalha do homem com seu ego é tão trágica que se torna cômica.
Cinema para o século 21
Muitos talvez se espantem pelo fatode Alejandro González Iñárritu se apresentar diante da comunidade cinematográfica em Veneza com uma comédia – ainda que do humor mais negro. Afinal, o diretor ficou conhecido por seus amplos e formalmente ousados panoramas sociais.
Em 2000, seu longa de estreia, Amores brutos, caiu como um raio sobre a paisagem cinematográfica internacional. Uma película sobre os aspectos mais negativos da moderna sociedade mexicana, apresentada em três grandes blocos, apenas tenuemente interligados. Um drama narrado com enorme densidade, visualmente arrebatador, uma produção de caráter quase experimental, que prende o espectador e não o solta até o fim.
Essa foi uma obra pioneira, não só para o cinema latino-americano. Quinze anos atrás, ela inaugurava um renascimento, era o anúncio de uma grande virada, que foi registrada também na Alemanha.
"Em retrospectiva, se reconhece que Amores brutos concentrou as diversas tendências estilísticas do filme de autor da década de 1990, numa sinergia poderosa: de um lado, o novo realismo e o estudo de meios sociais, do outro, a narrativa episódica de mundos existenciais paralelos", escreveu o especialista em cinema Roman Maurer, num ensaio sobre Iñárritu.
Hollywood e mais além
O diretor chamou a atenção também em Hollywood, onde, em 2003, rodou seu segundo longa. Em 21 gramas, ele conseguiu reunir astros como Sean Penn e Naomi Watts, porém manteve-se fiel a seu próprio estilo. Só ao fim a obra, fragmentada em numerosas sequências isoladas, compõe-se na cabeça do espectador, numa excitante experiência cinematográfica.
Com Babel, de 2006, Iñárritu ascendia de vez ao Olimpo do cinema. Narrada de forma intrincada, a história de um casal de americanos que, durante uma viagem ao norte da África, é envolvido num suposto atentado terrorista, convenceu público e crítica. O filme foi indicado para sete Oscars. Tendo recebido prêmios em todos os grandes festivais e em Hollywood, Iñárritu é possivelmente o diretor mais condecorado de seu país.
Também seu penúltimo filme, a melancólica paixão – no sentido religioso – Biutiful, sobre um pequeno criminoso (Javier Bardém) de bom coração, foi estreado na Festival de Cannes.
E nesta quarta-feira (27/08) Alejandro González Iñárritu voltou a abrir um dos grandes festivais do mundo, juntamente com seu time, na 71ª edição da Mostra Internacional de Arte Cinematográfica de Veneza. E talvez leve mais um prêmio, dependendo da recepção de sua primeira comédia pelo júri presidido pelo compositor francês Alexandre Desplat.