Alemã filmada enquanto corria tenta mudar lei sobre assédio
Stuart Braun
29 de agosto de 2025
Yanni Gentsch fazia jogging quando percebeu que um homem a filmava por trás. Ela o confrontou e tentou prestar queixa, e acabou descobrindo que conduta não é classificada como crime – mas iniciou um debate na Alemanha.
Yanni Gentsch filmou o homem que a gravava e compartilhou o vídeo, que viralizou e gerou onda de solidariedadeFoto: Federico Gambarini/dpa/picture alliance
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Em fevereiro deste ano, a redatora publicitária Yanni Gentsch, de 30 anos, estava correndo sozinha em um parque na cidade alemã de Colônia, no estado da Renânia do Norte-Vestfália.
Ao olhar para trás, ela percebeu que um ciclista a estava seguindo e filmando suas nádegas com seu celular. Gentsch confrontou o homem e o obrigou a apagar a filmagem. Enquanto isso, ela pegou seu próprio celular e filmou o agressor.
Sua filmagem mostra que o voyeur ficou perplexo com sua determinação em responsabilizá-lo. Ele gaguejou um pedido de desculpas, afirmando ainda que "nada aconteceu" e acaba por culpá-la.
"Por que você está usando esse tipo de calças?", disse ele, na tentativa de culpar a vítima. Gentsch respondeu com uma declaração simples que se tornou o slogan de seu movimento: "Minhas roupas não são um convite!"
Desde então, o vídeo dela viralizou, com mais de 16 milhões de visualizações no Instagram, e provocou uma onda de solidariedade.
"Estou impressionado com sua coragem", diz um comentário. "Quando uma mulher se defende, ela defende todas as mulheres", afirma outro.
"Tornar as gravações de voyeurs um crime"
Gentsch queria prestar queixa, mas descobriu que isso não era possível segundo a lei alemã.
Filmar alguém secretamente só é crime quando inclui suas partes íntimas. Ou seja, filmar por baixo da saia ou filmar pele nua é crime. Mas filmar partes do corpo vestidas, mesmo que deliberadamente filmadas para fins sexuais, não é proibido.
Gentsch não desistiu. Ela iniciou um abaixo-assinado intitulado "Tornar as gravações de voyeurs um crime", que nesta sexta-feira tinha mais de 125 mil apoiadores.
A principal exigência da petição é que o Código Penal alemão seja alterado para tornar qualquer gravação secreta com motivação sexual uma ofensa criminal, independentemente de envolver nudez.
"A estrutura legal atual protege os agressores, não as vítimas", escreve Gentsch na petição. "Filmagem de forma secreta é um abuso de poder: a vergonha pertence aos agressores."
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Assédio sexual contra mulheres é alto na Alemanha
Em 25 de agosto, Gentsch entregou pessoalmente sua petição, endereçada à ministra da Justiça, Stefanie Hubig, e ao secretário da Justiça de seu estado, Benjamin Limbach.
Em novembro, os secretários da Justiça de todos os estados alemães se reunirão em uma conferência anual e devem discutir uma alteração ao Código Penal.
Yanni Gentsch entrega seu abaixo-assinado ao secretário da Justiça da Renânia do Norte-Vestfália, Benjamin LimbachFoto: Federico Gambarini/dpa/picture alliance
Limbach é a favor da alteração: "Nossa lei deve traçar uma linha clara quando partes do corpo são filmadas ou fotografadas secretamente para fins sexuais ou contra a vontade da pessoa", disse ele.
A iniciativa de Gentsch gerou um debate nacional, não apenas nas redes sociais, mas também em jornais nacionais, estações de rádio e programas de notícias no horário nobre. Isso se deve, em parte, à capacidade de Gentsch de articular uma realidade cotidiana para quase todas as mulheres na Alemanha.
De acordo com um estudo de 2022 da Universidade de Ciências Aplicadas de Merseburg, nove em cada dez entrevistadas já sofreram algum tipo de assédio sexual em espaços públicos.
Ao entregar sua petição, Yanni Gentsch deixou claro: "O assédio sexual nunca é inofensivo, mas sim o primeiro passo em uma espiral de violência".
bl (DW)
As conquistas das mulheres alemãs
Do direito ao voto ao espaço na política: ao longo dos últimos cem anos as mulheres alemãs lutaram para derrubar leis e convenções que hoje soam impensáveis.
Foto: picture-alliance/akg-images
O direito ao voto
Em 1918, o Conselho dos Deputados da Alemanha proclamou: "Todas as eleições serão conduzidas sob o mesmo sufrágio secreto, direto e universal para todas as pessoas do sexo masculino e feminino com pelo menos 20 anos de idade". Logo depois, as mulheres puderam votar, pela primeira vez, nas eleições para a Assembleia Nacional alemã, em janeiro de 1919.
Foto: picture-alliance/akg-images
Lei de Proteção à Maternidade
A Lei entrou em vigor em 1952. Desde então, passou por várias alterações. O objetivo é assegurar a melhor proteção possível da saúde da mulher e do filho durante a gravidez, após o parto e durante a amamentação. Mulheres não podem sofrer desvantagens na vida profissional por causa da gravidez nem seu emprego pode ser ameaçado pela decisão de ser mãe.
Em 1971, Alice Schwarzer publicou na revista Stern um artigo no qual 374 mulheres confessaram ter interrompido a gravidez; entre elas, Romy Schneider. Após a publicação, dezenas de milhares de mulheres foram às ruas protestar a favor da maternidade autodeterminada. Em 1974, a coalizão social-liberal aprovou no Parlamento a descriminalização do aborto nos três primeiros meses da gestação.
Foto: Der Stern
Mais estudantes e professoras nas universidades
Em 1976, foi realizado em Berlim o evento "1° Universidade de Verão para as mulheres". Entre as exigências, as precursoras pediam o aumento da participação das mulheres entre estudantes e professoras, que era de 3 %. Em 1970, o percentual de estudantes passou para 9%. Hoje, ele chega a 48%. Em 1999, o número de professoras era de cerca de 4 mil. Hoje, elas são 11 mil em toda a Alemanha.
Foto: picture alliance/ZB/J. Kalaene
Livre da obrigação do serviço doméstico
Em 1977, entrou em vigor a nova lei de matrimônio. Até então, a esposa era "obrigada ao serviço doméstico". Ela só poderia trabalhar se não negligenciasse suas tarefas do lar e se o marido consentisse. Em 2014, 70% das mães trabalhavam fora; 30% em tempo integral e quase 40% em meio período. Entre os casais com crianças, a mulher alemã contribui com uma média de 22,6% da renda familiar.
Foto: picture-alliance/akg-images
Igualdade salarial
Em 1979, 29 funcionárias processaram o laboratório fotográfico Heinze, em Gelsenkirchen, pelo direito de ter a mesma remuneração por trabalhos iguais. Elas venceram: em 1980, o Parlamento alemão aprovou a lei sobre igualdade de tratamento de homens e mulheres no trabalho. Mas ainda há muito o que fazer: em , as mulheres ganharam 18% a menos por hora trabalhada do que os homens.
Foto: picture-alliance/chromorange
Pilotas da Lufthansa
Em 1986, a companhia aérea alemã Lufthansa permitiu, pela primeira vez, que duas mulheres completassem a formação de piloto. Elas são: Erika Lansmann e Nicola Lunemann (na foto). Hoje, nas diversas companhias aéreas do grupo, 417 mulheres trabalham como co-pilotas e 114 são comandantes.
Foto: Roland Fischer, Lufthansa
Trabalho noturno
Em 1992, o Tribunal Constitucional Federal revogou a proibição do trabalho noturno para mulheres. O Tribunal declarou que a alegada proteção estava associada com salários mais baixos e "desvantagens consideráveis". Na antiga Alemanha Oriental, as mulheres tinham sido autorizadas a praticar todas as profissões desde o início, a qualquer hora do dia ou da noite.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Gerten
Sexo sem consentimento
Em 1997, a violação sexual no casamento passou a ser considerada crime. O Bundestag decidiu por uma maioria esmagadora que os maridos estupradores já não tinham direitos especiais. A ideia de que seria uma "ofensa menor de coerção" foi abolida. Todos os "atos sexuais" forçados passaram a ser punidos como estupro.
Foto: picture-alliance/dpa/F. Kästle
Mulheres na política
Depois de conquistarem o direito ao voto na maior parte dos países, as mulheres tentam alcançar a mesma proporção de participação política que os homens. Em 1949, o percentual de alemãs no Bundestag era de 6,8%. Atualmente, elas são 35,3%. A primeira mulher a chefiar o governo foi Angela Merkel, em 2005. Em 2018, ela chegou ao quarto mandato como chanceler federal, cargo que exerceu até 2021.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Kappeler
Tarefas domésticas
Hoje as mulheres alemãs também lutam por direitos iguais em relação às tarefas domésticas e ao cuidado com familiares. Em 1965, elas exerciam esse trabalho durante, em média, quatro horas por dia; os homens, 17 minutos por dia. Atualmente as mulheres ainda gastam 43,8 pontos percentuais a mais de tempo com tarefas domésticas do que os homens: são quase 30 horas semanais, contra 20 dos homens.
Foto: Imago/O. Döring
O futuro
Para despertar o interesse das meninas em profissões antes consideradas masculinas, especialmente na indústria, desde 2001 empresas alemãs convidam meninas do 5º ano para o 'Girls day'. O dia das meninas é considerado o maior projeto de orientação profissional do mundo e, graças a ele, cada vez mais jovens mulheres decidem seguir carreira da área de ciências exatas na Alemanha.