Movimento extremista de direita estava no radar da polícia há anos. Seus membros veneram Hitler, defendem posições antissemitas e racistas e estariam planejando criar centros de treinamento paramilitar no país.
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O ministro do Interior da Alemanha, Horst Seehofer, baniu nesta terça-feira (23/06) o movimento alemão Nordadler (Águias do norte), um grupo de extrema direita e neonazista que venera Adolf Hitler e quer reerguer o nacional-socialismo.
Seus cerca de 30 membros defendem posições antissemitas e racistas, espalham teorias da conspiração e lutam pela independência de qualquer estrutura estatal.
O movimento estaria planejando comprar imóveis em estados da antiga Alemanha Oriental para criar centros de treinamento. Neles, a ideia seria promover exercícios paramilitares semelhantes ao serviço obrigatório de seis meses imposto pelo regime nazista aos jovens alemães a partir de 1935.
Ainda mais conhecido, o grupo Identitäre Bewegung (Movimento identitário), do militante de extrema direita Götz Kubitschek, também manteve até este ano prédios como esses, por exemplo, na cidade de Halle.
Em entrevista à televisão, um homem aparentemente próximo ao Nordadler já havia anunciado, em 2017, que imóveis haviam sido adquiridos na Turíngia, no vilarejo de Mackenrode, de 500 habitantes, no extremo sul da região montanhosa do Harz. Durante a era nazista, havia em Mackenrode um posto avançado do campo de concentração de Mittelbau-Dora.
De acordo com o Ministério Público da Alemanha, membros do Nordadler também planejaram ataques ‒ mesmo que se escute na cena de extrema direita que o grupo seja mais uma organização ideológica nacional-socialista do que terrorista.
Suspeita-se que o grupo neonazista tenha obtido armas e munições, ou pelo menos tentou obtê-las. Consta também que o grupo mantinha listas de nomes, por exemplo, de políticos que lhes eram desagradáveis.
Particularmente controverso é o fato de um homem apontado como responsável, numa postagem anterior no site do grupo, não ser um estranho para as autoridades. Há dois anos e meio, ele foi condenado pelo Tribunal Regional de Braunschweig a pagamento de multa e prestação de serviço comunitário por apoiar um simpatizante do "Estado Islâmico" (EI) na preparação de um ataque com explosivos a policiais ou soldados.
Antes de o simpatizante do EI se converter ao islã, os dois haviam se conhecido na cena neonazista. O ódio aos judeus pode ser visto como um elemento comum entre ideólogos islamistas e extremistas de direita
Durante muito tempo, os membros do Nordadler se mantiveram em segundo plano. Isso não é atípico para a cena de extrema direita, que consiste em muitos grupos atuando de forma independente, mas em contato.
Muitos desses grupos têm em comum o fato de terem surgido nos anos seguintes ao grande fluxo de refugiados para a Alemanha em 2015 e 2016.
Segundo as atuais investigações, os membros do Nordadler agiam principalmente online, através de canais fechados ou até mesmo abertos, como o Instagram. "As organizações extremistas de direita não precisam mais de uma mesa de bar, de um tesoureiro e de estatutos para perseguir seus objetivos", disse Seehofer nesta terça-feira.
O site do grupo, agora fora do ar, trazia imagens de paisagens bucólicas alemãs, como da região montanhosa do Harz, e alardeava slogans de referência nacional-socialista como a de que o "povo alemão" precisa se autopreservar. Apelava-se para "uma liderança alemã no próprio país, sem um espírito estrangeiro" – ou seja, sem pessoas de origem migratória e sem judeus.
Particularmente forte é o perfil extremamente antissemita do grupo. Também em seu site, eles teriam elogiado o ataque em Halle, no estado da Saxônia-Anhalt, em outubro passado.
Na ocasião, um alemão de 28 anos, fortemente armado, tentou praticar um massacre na sinagoga da cidade repleta de fiéis no principal feriado judaico. Após não conseguir entrar no prédio, ele atirou contra duas pessoas na rua. O agressor será julgado a partir de julho deste ano.
Capacetes de aço e escritos nazistas
A cena de extrema direita na Alemanha está se tornando mais violenta. No total, o Ministério do Interior em Berlim já proibiu mais de 20 grupos extremistas de direita desde a fundação da República Federal da Alemanha, três deles somente neste ano.
Por muito tempo, as autoridades relutaram em perceber a verdadeira extensão do perigo dos grupos de extrema direita. Isso mudou após o assassinato do político Walter Lübcke, do estado de Hessen, no início de junho de 2019.
Mas já em 2018, as residências de potenciais membros do Nordadler foram revistadas em vários estados alemães. Nenhuma arma foi encontrada na ocasião. Essa foi uma das razões pelas quais não houve prisões.
Desta vez, buscas realizadas em quatro estados do país na manhã desta terça-feira confiscaram capacetes de aço da antiga Wehrmacht e escritos nazistas.
Em resposta a uma solicitação parlamentar da bancada do partido A Esquerda no Bundestag (câmara baixa do Parlamento alemão), em maio do ano passado, sobre as propriedades de extremistas de direita, o Ministério do Interior informou que uma propriedade, a que já foi mencionada em Mackenrode, na Turíngia, está em posse do Nordadler. Na Turíngia, no entanto, não houve buscas nesta terça-feira.
Após mais de cinco anos de processo, saem as sentenças pelas mortes de nove imigrantes e uma policial na Alemanha, num caso envolvendo extremismo de direita e críticas a instâncias estatais.
Foto: dapd
Beate Zschäpe, o rosto da NSU
Entre 2000 e 2006, nove homens de origem estrangeira foram mortos com a mesma pistola na Alemanha. A polícia tateava no escuro, e a mídia falava de "assassinatos do kebab". Em 4 de novembro de 2011, uma casa explodiu em Zwickau, no leste do país. Entre os destroços foram encontrados a arma do crime e outros objetos incriminadores. Quatro dias mais tarde, Beate Zschäpe se entregou à polícia.
Foto: dapd
O (presumível) trio da NSU
Em 1998, Zschäpe se unira aos amigos ultradireitistas Uwe Böhnhardt e Uwe Mundlos na célula terrorista Clandestinidade Nacional-Socialista (NSU). O trio viveu incógnito em diversos locais por quase 14 anos, por último em Zwickau, no estado da Saxônia. Segundo os investigadores, eles teriam cruzado a Alemanha cometendo assassinatos e atentados a bomba, financiando-se através de assaltos a bancos.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Burgi
As vítimas
Ao que se sabe, a NSU matou ao menos nove homens e uma mulher. A primeira vítima, Enver Şimşek, sucumbiu em setembro de 2000 a ferimentos graves. As demais vítimas foram (a partir do alto, esq.) Abdurrahim Özudogru, Süleyman Taşköprü, Habil Kılıç, a policial Michèle Kiesewetter, Mehmet Turgut, Ismail Yasar, Theodorus Boulgarides, Mehmet Kubaşık e Halit Yozgat.
Foto: picture-alliance/dpa
Atentados a bomba em Colônia
Na rua Keupstrasse, em Colônia, habitada majoritariamente por turcos, uma bomba cheia de pregos explodiu em 9 de junho de 2004. Mais de 20 pessoas ficaram feridas, em parte gravemente. Antes, em 19 de janeiro de 2001, uma outra fora detonada na Probsteigasse. Uma jovem de 19 anos de origem iraniana sofreu queimaduras, cortes, fratura do crânio e perfuração do tímpano.
Foto: picture-alliance/dpa
Fim de uma fuga
Em 4 de novembro de 2011, um assalto a banco fracassou em Eisenach, na Turíngia. Os criminosos conseguiram inicialmente escapar, mas foram perseguidos pela polícia. Pouco mais tarde, os cadáveres de dois homens foram encontrados num trailer fumegante. Os indícios eram de suicídio. Ambos foram identificados como Uwe Böhnhardt e Uwe Mundlos, supostos integrantes da célula terrorista NSU.
Foto: picture-alliance/dpa
Último esconderijo
Poucas horas após a morte dos supostos assassinos da NSU, uma casa residencial foi pelos ares em Zwickau. Com a explosão, Beate Zschäpe aparentemente tentou eliminar as pistas na moradia que dividia com seus amigos Böhnhardt e Mundlos. Entre as ruínas, os policiais encontraram, entre outros, a arma do tipo Ceska utilizada na série de assassinatos da NSU e um vídeo de reivindicação.
Foto: picture-alliance/dpa
Reivindicação cruel
Num macabro vídeo, utilizando a apreciada figura de desenhos animados Pantera Cor-de-Rosa, a NSU reivindicou os assassinatos de nove turcos e uma policial. No entanto, uma das vítimas, Theodorus Boularides, tinha origem grega.
Foto: picture-alliance/dpa/Der Spiegel
O início do processo
Em 6 de maio de 2013, começou o processo da NSU no Tribunal Superior Regional de Munique. A única sobrevivente do trio terrorista, Beate Zschäpe, apresentou-se de terno escuro, aparentando autoconfiança. O procurador-geral da República a acusou, entre outros crimes, de "ter matado, em dez casos, um ser humano de forma traiçoeira e por motivação torpe".
Foto: Reuters/Michael Dalder
Cúmplices da NSU?
Além de Zschäpe, quatro homens foram acusados no processo da NSU como presumíveis acessórios dos crimes. Apenas Ralf Wohlleben (abaixo, dir.), ex-membro do partido de extrema direita NPD, pode ter seu nome completo citado na imprensa. Os demais, André E., Carsten S. e Holger G. estão protegidos pelo direito de personalidade.
Zschäpe quebra o silêncio
Em 9 de dezembro de 2015, após dois anos e meio de silêncio, Beate Zschäpe se pronunciou, fazendo ler uma declaração em que inculpa Böhnhardt e Mundlos pela série de assassinatos. Em meados do ano, ela se desentendera com seus três advogados indicados, passando a ser representada adicionalmente por Hermann Borchert e Mathias Grasel.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Kneffel
Escândalo do informante
Desde o início do processo, era ambíguo o papel do Departamento de Defesa da Constituição, responsável pela segurança interna da Alemanha, nas atividades da NSU. O extremista de direita Tino Brandt (foto), informante do órgão, relatou em juízo como, nos anos 90, criara o grupo Defesa da Pátria da Turíngia (THS). A partir dele, o trio liderado por Zschäpe se radicalizou, criando a NSU.
Foto: picture-alliance/dpa/Martin Schutt
Relações mal explicadas
Quando Halit Yozgat foi baleado num internet-café de Kassel, em 6 de abril de 2006, o informante Andreas T. estava no local. Apesar disso, o funcionário da Defesa da Constituição afirmou nada saber sobre o atentado. No processo da NSU, o pai da vítima, Ismael Yozgat, relatou de forma comovedora como segurara nos braços o filho agonizante. No tribunal, levou consigo uma foto de infância de Halit.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Gebert
Protestos contra falta de clareza
Já houve uma série de manifestações contra o envolvimento de órgãos estatais alemães no caso da NSU. A organização Keupstrasse Está Por Toda Parte é uma das participantes dos protestos. Ela leva o nome da cidade de Colônia, onde a célula terrorista explodiu uma bomba cheia de pregos.
Foto: DW/M. Fürstenau
Parlamento interfere
O Parlamento federal alemão tentou trazer luz às intrigas no caso da NSU. Em agosto de 2013, o presidente da primeira comissão de inquérito, Sebastian Edathy (dir.), entregou ao líder parlamentar Norbert Lammert seu relatório final de mais de mil páginas. A conclusão foi avassaladora: "fracasso estatal". Mais tarde haveria outras CPIs em nível federal e estadual.
Foto: picture-alliance/dpa
Promessas quebradas
Em 23 de novembro de 2012, foi realizado na Konzerthaus de Berlim um evento em memória das vítimas da NSU. A chefe de governo Angela Merkel (esq.) prometeu a Semiya Şimşek e outros familiares o esclarecimento total. Mas eles estavam decepcionados diante de dossiês da Defesa da Constituição eliminados ou mantidos em caráter confidencial. Sua suspeita era de que o Estado sabia mais do que admitia.
Foto: Bundesregierung/Kugler
Procuradoria Geral exige pena máxima
Em meados de 2017, o procurador-geral Herbert Diemer e colegas apresentaram suas considerações finais. Eles exigiram para Beate Zschäpe a pena máxima, de prisão perpétua, devido à gravidade extrema de seus crimes. Para Ralf Wohlleben e André E., a acusação pediu 12 anos de cárcere, assim como cinco para Holger G. e três para Carsten S..
Foto: picture-alliance/dpa/P. Kneffel
Exigência surpreendente
Em abril de 2018, os defensores se pronunciaram. Hermann Borchert e Mathias Grasel, representando Zschäpe apenas desde 2015, reivindicaram para ela um máximo de dez anos de prisão. Entretanto, seus antigos advogados, Wolfgang Stahl, Wolfgang Heer e Anja Sturm (da dir. para a esq.) surpreenderam ao pedir a libertação imediata de Zschäpe da prisão preventiva.
Foto: Reuters/M. Rehle
Juiz respeitado
Manfred Götzl, de 64 anos, é o juiz-presidente no processo da NSU, no Tribunal Superior Regional de Munique, encarregado de pronunciar as sentenças contra Beate Zschäpe e os demais réus. Os advogados de alguns coautores do processo criticaram Götzl, desejando que ele conduzisse a ação com maior rigor. No geral, contudo, ele goza de grande respeito.
Foto: picture-alliance/dpa/T. Hase
Prisão perpétua para a ré principal
Em 11 de junho de 2018, Beate Zschäpe (esq.), de 43 anos, foi condenada à prisão perpétua pelo Tribunal Superior Regional de Munique. Como os crimes são de extrema gravidade, ela não poderá deixar a prisão depois de cumprir 15 anos de pena. A defesa anunciou que vai recorrer da decisão à instância superior, a Corte Federal de Justiça. Os demais réus receberam penas entre dez e dois anos e meio.